JESUS VEIO AO RIO DE JANEIRO -Parte II
Resolveu caminhar pela areia. A praia estava repleta de pessoas de todas as cores e idades, todas muito juntas, mas era como se não se conhecessem. Muitos bebiam, alguns comiam, muitos exibiam seus corpos sarados, outros nem tanto mas igualmente exibidos. Caminhou por entre as pessoas e notou que por onde passava, as pessoas protegiam seus pertences, como se Ele os fosse roubar. Foi até a água, molhou os pés, aqueles mesmos pés que podem caminhar sobre elas, não estavam conseguindo caminhar até o coração das pessoas. De repente avistou um bando de adolescentes que rapidamente corriam entre as pessoas e tomavam delas tudo o que tinham. As pessoas corriam e gritavam: arrastão, arrastão.Jesus tentou parar os jovens, argumentar com eles..
-Sai pra lá, ô tio. Tu vai querer morrer?
-Meus filhos, não façam isso, por tudo que lhes for mais sagrado.
-Aí, ó, queima o cara!
E num estampido, viu-se o Salvador ferido de morte, mais uma vez estendido na areia branca de Copacabana, agora com um pequeno riacho de sangue colorindo-lhe as faces. O Sangue de Cristo.
As horas passaram, ninguém o socorria. Ainda bem que o Senhor podia se auto curar, levantou-se e sozinho, resolveu procurar um hospital.Tinha um muito bom no bairro. Chegando lá, o Mestre avisou na portaria que estava com um ferimento a bala-O senhor tem plano de saúde?
-Não senhorita.
-Pode pagar particular?
-Não tenho dinheiro nenhum.
-Então moço, vá para o hospital do SUS. Vá pra emergência do Miguel Couto, antes do senhor morrer aqui, viu? Vá logo.
-Não sei aonde é.Estou ferido.
-Meu senhor, esse hospital não atende indigente não. Aqui é tudo pago. Lugar de pobre é no SUS.
Nesse momento, Jesus percebeu o DESCASO COM A VIDA HUMANA, mas não chorou. Se existia um hospital para os pobres, então certamente ele sairia dali com um boa experiência.Foi para o Miguel Couto. Na portaria o mandaram para uma triagem:
-Nome?
-Jesus
-de que?
-de Nazaré.
O rapaz levantou os olhos pela primeira vez para o paciente e balançou negativamente a cabeça.
-Esse povo tem cada uma, botar um nome tão santo num vagabundo, pensou em voz alta.
-Documentos.
-Não tenho nenhum.
-Pois vai esperar aí,ó. Se desocupar uma cadeira o senhor se senta aí, tio.
-Estou baleado.
-Dá pra esperar, foi fatal não.
Quatro horas depois o chamaram. O colocaram numa maca, extraíram a bala e sem nenhuma explicação , o liberaram.
-Não vou ficar um pouco em observação?
-Tem vaga não. O corredor já está cheio. Se infeccionar volte aqui. E Assim, despacharam o nosso Redentor com um buraco no ombro costurado com três pontos, para melhorar na rua.
Já era quase noite e o Salvador sentiu fome. Enquanto caminhava pela calçada, parou na frente de uma casa grande , com um lindo jardim e uma guarita aonde ficava um jovem fardado e armado.
-Moço, estou sem comer desde manhã. Fui ferido, saí do hospital, será que alguém poderia me dar um pouco de comida?
-Sai fora malandro. Isso aqui não é restaurante não.
-Eu tenho tanta fome, meu bom rapaz!
-E eu com isso? Vai trabalhar, vagabundo.
-Você não pode nem perguntar aos donos da casa se podem me dar um pouco de comida?
-Tá me tirando, meu irmão? Eu incomodar meus patrão cum vagaba que nem tu?Vai vazando logo daqui. Pra não levar bala, vai, vai...
E o Senhor Jesus, conheceu de perto a INDIFERENÇA .O ser humano escorraçado como um animal. Certamente naquela residência viviam cachorros que comiam muito melhor do que a grande maioria das pessoas. Não que os animais não mereçam comer, mas aonde estava o Seu ensinamento: Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus? Aonde estavam os princípios da hospitalidade humana? E a caridade? Em que estrela se escondeu?
Caminhou sem rumo, subiu o morro, bateu na porta do primeiro barraco iluminado que encontrou. Uma senhora idosa abriu uma brechinha da porta e perguntou?
-Quem é?
-Um pobre pedinte.
-Tem nada pra você aqui não.
-Tenho fome, senhora, tenha piedade. Fui ferido e saí do hospital.
-Pois vá dar parte a polícia, aqui num tem nada pra você não, eu mal tenho pra mim não dá pra dividir não.Vá atrás dos seus amigos traficantes, porque pra ser ferido de bala você deve ser de alguma gangue.
-Não senhora, argumentou Jesus, eu sou inocente.
-Todos são. Aqui só tem santo. Ninguém é pecador nessa favela e vá simbora que eu tou perdendo tempo com essa conversa fiada.
Então Jesus se afastou chorando copiosamente. Ele morrera pelos pobres, pelos pequenos e nem por isso os pobres o acolhiam?Nessa hora sentiu saudades de Zaqueu, de Maria Madalena que tão gentilmente lhes tinham oferecido suas casas.Indignou-se uma vez mais o Senhor. Não esperava encontrar na pobreza tanta MESQUINHEZ .
Continua a parte III