JESUS VEIO AO RIO DE JANEIRO- Parte I

JESUS ESTEVE NO RIO

Thereza Poesia

Um belo dia de domingo, que é dia de descanso (pra Ele, não pra mim), Jesus resolveu passear na terra e ver com os próprios olhos o que estava acontecendo com a humanidade, que cada vez menos pedia guarida no céu e engrossava cada vez mais o exército de satanás.Escolheu o Brasil, por ser considerado a Pátria do Evangelho, quem sabe assim teria menos trabalho. Vestiu-se como um pobre para não chamar atenção e escolheu dez lugares para visitar, quem sabe, indo a esses lugares, poderia ajudar ao homem a encontrar Nele a redenção. Resolveu que em primeiro lugar visitaria uma igreja católica, em seguida um templo protestante, uma praia, um hospital do SUS, uma casa de família rica, uma casa de família pobre, um presídio ,um prostíbulo, uma boate,e finalmente um orfanato. Ali, certamente encontraria seguidores da sua lei, ou corações preparados para ouvir sua palavra e relembrar seus ensinamentos. Desceu como um homem qualquer, na calçada da igreja da Penha, no Rio de Janeiro, cidade maravilhosa, aonde lhe tinham feito uma enorme homenagem, colocando aquela estátua gigantesca.

Os sinos da igreja anunciavam a missa das sete, portas abertas, fieis chegando cansados de subirem tantos degraus e Ele parou um pouco na porta e ficou a observar quem chegava.

-Bom dia! Dizia o Senhor.Em cada dez pessoas, uma respondia, mas sem olhar nos olhos do mestre. Ao aproximar-se um jovem casal com uma criança pequena pela mão, o Senhor fez menção de afagar o cabelo da menininha, o que foi prontamente repudiado pelos pais:

-Saia daí. Quem é você? Não queremos vagabundo perto de nossa filha não. Nem se aproxime ou eu chamo a polícia, esbravejou o pai.

-Só quis fazer um carinho na criança. Tentou explicar Jesus, estupefato com a desconfiança do casal.

-Pois vá fazer carinho no raio que o parta, na minha filha pedófilo nenhum encosta a mão.

E puxando a menina e a esposa, adentrou a igreja para assistir a Santa missa e certamente comungar o corpo daquele a quem havia acabado de rotular, mesmo sem nunca o ter visto.Pensou com seus sagrados neurônios o Redentor:-Deve ser isso que chamam de PRECONCEITO.Me julgou antes que eu pudesse explicar ou falar qualquer coisa.Tirou o meu direito sagrado de me relacionar em comunidade.Tanto que eu avisei que todos eram iguais, independente do que vestem, do que ganham, da cor que nascem, da orientação que seguem, do sexo que possuem ou da linguagem com que se expressam.Será que são esses, os que me seguem?

Adentrou a igreja, foi para o primeiro banco da primeira fila, afinal, queria ouvir bem as palavras do padre, quando uma senhorinha já bastante idosa Dele se aproxima e delicadamente lhe diz:- Meu filho, esses bancos estão reservados para as autoridades que vão assistir a missa agora de manhã.Vá se sentar lá atrás, que aqui na frente não pode não, viu?

-Mas...eu também vim assistir a missa. Tentou explicar o Salvador.

-Eu sei, eu sei, mas vá lá pra trás, aqui não pode ficar não. Os bancos da frente são reservados para as pessoas de bem.O snhor tá mal vestido, barbado, não pega bem. Não insista não.

Cabisbaixo, o Mestre levantou-se e foi saindo daquela igreja devagar, sem olhar para trás, disfarçadamente enxugando uma lágrima de cristal que insistia em correr pela sua face. Pela segunda vez, em menos de vinte minutos, viu-se de frente, dentro daquela que chamam sua casa, vitima do tal do PRECONCEITO.

-Deve ser melhor numa igreja protestante. Afinal eles andam com o livro sagrado, pregam nas calçadas, falam em mim o tempo inteiro.

E foi conferir. No mesmo bairro encontrou uma igreja diferente, grande, moderna, com ar refrigerando, cadeiras confortáveis e um palco que se comparava ao dos melhores teatros do país. Na porta lhe lançaram um olhar de desaprovação pela indumentária exibida, mas o convidaram a entrar.Já meio desconfiado, o Senhor sentou-se em uma das ultimas fileiras, afinal a acústica daquela igreja era fantástica. No palco um pastor de paletó negro falava sem parar em uma linguagem que ele nunca ouvira nem no céu, nem na terra, enquanto seu vizinho de cadeira lhe cochichava: -Ele está falando na língua dos anjos.Daqui a pouco vai expulsar tudo que é demônio. É a primeira vez que você vem?

Jesus assentiu com a cabeça. Nisso entram no palco dois homens de branco arrastando uma jovem de mais ou menos vinte anos. Estava endemoniada, diziam.E num ritual macabro, aonde o nome do satanás era muito mais pronunciado do que o Seu, Jesus viu, depois de alguns empurrões e quedas da jovem ,o pastor dizer que tinha acabado de expulsar quinze demônios do corpo da moça.

Em seu lugar, o Mestre sabia que não havia demônio nenhum naquela jovem assustada, mas um problema de saúde grave chamado depressão pós parto. Mais alguns foram introduzidos ao exorcismo e o pastor tirava tudo, até que chegou a hora de pedir o dízimo. Começando por dizer que todos sem exceção deviam a Deus e deviam dinheiro, o reverendo pedia a quem pudesse colocar R$ 1.000,00 no envelope e depositar num cestinho que se encontrava junto ao púlpito, aos seus pés. Poucos o fizeram e o pastor foi baixando, para 500, 400, 300, 200, 100, 50, 20,10 e cinco, porque abaixo disso, era até uma ofensa a Deus, ele dizia. Completamente decepcionado, Jesus descobriu a MENTIRA e EXPLORAÇÃO DO HOMEM PELO HOMEM. Como é fácil enganar as criaturas de boa índole usando seu Santo Nome. Tristíssimo, saiu dali a enxugar mais uma pérola de cristal que teimava em queimar-lhe a santa face.-Vou para a praia. Deve estar cheia de gente boa e bonita apreciando seu lazer dominical. Lá deve reinar a paz e a harmonia em clima de muita festividade e união, argumentou consigo mesmo.

Chegou em Copacabana. fixou o lindo mar à sua frente e agradeceu ao Seu Pai por ter criado tanta beleza e presenteado aos homens. Caminhou no calçadão. Cumprimentou pessoas que se esquivavam dele.-Estão com pressa, pensou. Parou num quiosque e pediu uma água de coco.

-São dois reais.

-Não tenho dinheiro, meu filho, vim de muito longe.

-Então não bebe, tio.Não sou pai de vagabundo não.Vai saindo da minha barraca.

Alguns rapazes tomavam cerveja numa algazarra medonha sentados em uma mesa. O mestre se aproximou e perguntou:

-Meus filhos, algum de vocês pode me pagar uma água de coco?Estou com muita fome e sede.

Um dos rapazes levantou-se, o mais forte deles, colocou o dedo no peito do Salvador e rispidamente falou:

-Aqui, ó, vai dando o fora se não quiser levar cacete!Não tenho culpa se vocês saem no nordeste para vir passar fome aqui não, ó.

Vai procurar comida na casa do caralho, sacou? Fora!

Todos os outros já o cercavam e lhe davam pequenos empurrões, debochando da sua aparência. E num empurrão mais forte, o colocaram para fora do calçadão, caído na areia branca de Copacabana. Dessa vez, duas lágrimas de luz desceram pelo rosto do Cristo. Vinte e um séculos se passaram, mas ele estava ali, novamente de frente com a VIOLÊNCIA e num nível bastante piorado, era a violência gratuita. A maldade pelo prazer de ser mau.

Continua na parte 2