A pequena mãezinha
A pequena mãezinha
Josileide veio da cozinha com um grande bule na mão, sorrindo para os inumeráveis filhos e filhas que se espalhavam por toda sua sala. Tinha meninos e meninas de todos os tamanhos de todas as cores de cabelo em todos os cantos da sala. Ouviu um coro de vozes:
- Mamãe, que bom, café! E a criançada se reuniu em torno da mãezinha querida, alguns esticando seus copinhos e canequinhas, parecia uma festa. Depois de algum tempo, ela viu, o seu queridinho, encolhidinho, no sofá com cara de zangado, punhos cerrados e pronto a soltar um monte de gritos, e pontapés quem ousasse chegar perto. Com geio, a mãe, perguntou-lhe: - O que aconteceu com meu menino fofinho, não quer café. Ele gritou: - Quero pão, pãaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaao!
A mãe colocou a mão nos ouvidos, fingindo-se desesperada, enquanto os outros irmãozinhos arregalavam os olhos, as bocas, outros torciam os dedos, e outros ficavam simplesmente mudos, muito surpresos com a resposta de Joãozinho. Josileide muito tranqüila estendeu a canequinha de café para Joãozinho, era uma canequinha em feitio de urso, e tocava uma musiquinha longe, conforme o líquido ia esfriando a melodia ia desaparecendo.
Após o café, ela foi lavar as roupinhas da criançada, quando acabou estava perto da hora do almoço, meninos entravam e saíam da pequena casa. Algumas meninas preparavam o almoço com folhinhas retiradas dos matinhos no quintal, outras faziam cerâmica com a lama ao redor da casa, e os meninos, jogavam bola. Improvisaram uma trave, uma rede, traçaram com os calçados os limites do campo, enquanto alguns jogavam outros simplesmente torciam, assoviando. Joãozinho estava sentado em um canto do lado, muito gordinho, bochechas redondas, às vezes esquecia-se que estava aborrecido por causa da falta de pão, e batia palmas, gritava; GOOOL.
Josileide em suas intermináveis tarefas de mãe de inúmeros filhos corria de lá para cá em sua pequena casa de papelão.
Ouviu um grito de repente: - Leide, Leide, Leide! Onde será que está essa menina que tanto chamo e não me ouve. Josileide saiu correndo ainda com algumas peçinhas de roupa de seus filhos para lavar e pendurar na corda. Olhou sem graça para sua mãe e respondeu, medrosa, de apanhar novamente. – Estou aqui! Então corre logo, sua imprestável, menina do capeta, vive resmungando sozinha pelos cantos como maluca. Se ajeita logo que não demora a dona do menino ta aí. Vê se dá um jeito nesta sala imunda, entrou jogando os filhinhos de Josileide pelo ar, e a pobre mãezinha em seu coração enorme, chorava, de seus olhos já não desciam mais lágrimas, pois a rotina violenta e miserável, com suas cenas repetidas, estavam gravadas fundo em sua alma de inúmeros filhos e tão jovem.
Bateram palmas e Josileide foi atender,coçando a cabeça, pensativa, apanhou a pequena mochila do menino franzino e maltratado que ela iria “olhar” por dois ou três dias, enquanto a dona sumia por uns tempos com qualquer gringo que lle enchesse as mãos de verdinhas. Neco era o nome do menino que veio andando pelo beco, ao lado de Josileide. Chegando na cozinha gritou: Juau, ondi tu ta? E Joãozinho forte e rechonchudo, respondeu com um sorriso melado de balas de morango (a vizinha de dois becos lá longe tinha distribuído doces de São Cosme e São Damião, os que restaram ela trouxe para Josileide e seus filhinhos). E assim Josileide começou sua rotina mais atarefada do que antes, agora tinha além de todos os seus filhinhos, o queridinho e Neco. Desanimada olhou a mochila e viu um pacote de biscoitos de maisena, outro pacote de biscoito recheado de morango (os favoritos do Joãozinho), sabonete usado, mamadeira suja, leite em pó um saco plástico, em uma cambuquinha de plástico achocolatado, (a dona sempre mandava, mesmo sabendo que Neco não gostava), bananas, duas laranjas, bolinho (tipo Ana Maria) três pacotinhos de Miojo, e raridade duas bandejas de iogurte tipo queijinho suíço, Josileide logo se desiludiu e afastou as bandejas de iogurte, espiou pelo rótulo e percebeu que a validade já passara alguns dias.
Joãozinho quando viu a bandeja de iogurte em cima do sofá veio correndo e gritou: Oba. Mãezinha. Que bom. Neco nem percebeu, pois estava alheio brincando com todos os outros filhinhos de Josileide. Apareceu na sala a mãe de Josileide com aquela cara triste, chupada, pele encarquilhada no corpo, parecia um presunto seco, donde tinha sido retirado toda a gordura. – Leide, ce num vai brinca agora não, vai limpá essa casa, tomá conta do Neco e do seu filhinho Joãozinho, que eu vou escrever o bicho. Se eu demorá perco a coleta de apostas e amanhã to fora.
Colocou uma espécie de bolsa nos ombros e sumiu pela porta do barraco pobre e sujo. Andou a pé pela linha do trem, atravessou por um buraco no muro e foi agenciar o bicho.
Leide estava faminta e com duas crianças para tomar conta, além de todos os seus filhos. Olhou para o quadro a sua frente:
Um homem de cabelos louros e olhos azul muito lindo sorrindo, tinha no meio do peito um coração aberto, todo rosado e coberto de luz. Na magia inocente de seus nove anos, olhou para Jesus e ergueu uma prece, do fundo do coração: Senhor, me ajude, faz com que aquele gigante bêbado ali ao lado, me esqueça só por essa tarde, enquanto meus filhinhos estiverem dormindo. Não agüento mais essa ardência na minha xaninha, outro dia até saiu sangue. Minha mãe, ela gosta tanto de bebe como ele, que nem ouve o que eu falo, só levanta a mão para me bater. Outro dia ele queria tirar as cuequinhas do Joãozinho, mas ele correu. Ele é esperto, e forte. Não sei como engorda tanto se pouco come. Também com a fome que ele tem revira o lixo dos vizinhos igual cachorro, rato, sabe lá.
Já sei to pedindo muito. Então, Senhor Jesus, é o seu nome, escutei outro dia, quando passei naquela casa cheia de pessoas cheirosas de banho tomado, bem vestidas, que se reúnem aos sábados e domingos e cantam bem alto e gritam teu nome. Eu sei, que sou pobre e não vens me visitar, mas faz de conta que você está aqui ao meu lado e me ouve, pelo menos só desta vez.
Ao cair da noite o beco ficou tomado, a polícia invadiu todas as casas, Josileide, se escondeu como pode, com Joãozinho e Neco e todos os seus inumeráveis filhinhos. Depois de passado o susto, deu umas passadas pelo beco e ficou apavorada simplesmente, cortinas e rolos de fumaça, cobriam os barracos era um incêndio e tanto. Deu tempo de levar alguns filhos, Joãozinho que tinhas as pernas fortes e corria muito. Neco ficou perdido no meio da fumaça, Josileide, não o abandonou, mas eram tantas responsabilidades que quando acordou estava em um hospital. Não reconheceu ninguém, só via enfermeiras, enfermeiras, enfermeiras, e ouvia gemidos e tosses. Sentiu que não comia pela boca e não ia ao banheiro. O corpo ardia. Depois de muitos meses de internada ela soube o que se passara.
O Senhor Jesus, com sua força mandou um raio do céu e a justiça foi feita. Apesar dela ter perdido todos os seus filhos de pano e plástico, restou, Joãozinho seu irmãozinho, que ela tratava como filho, pois sua mãe a bicheira, não tendo com quem deixar o menino deu-lhe esta tarefa. Um grande incêndio na favela na beira da linha do trem nos subúrbios da zona Norte do RJ, destruiu muitos barracos um deles, foi o do homem bêbado que incomodava tanto Leide, quando estava sozinha com os filhos. E a boa notícia era que sua mãe não poderia mais ficar com ela nem Joãozinho, eles foram “adotados” por uma tal de tia “social” e iriam morar em outro bairro em uma casa pequena, mas confortável e no próximo ano Josileide voltaria para a escola e oJoãozinho ia para o Jardim. Ia ter bastante pão para seu estômago faminto. Lá perto da enfermaria do hospital, ouvia-se uma pequena multidão erguer as vozes: - Glória a Jesus, Aleluia, Aleluia, Aleluia!
A pequena mãezinha
Josileide veio da cozinha com um grande bule na mão, sorrindo para os inumeráveis filhos e filhas que se espalhavam por toda sua sala. Tinha meninos e meninas de todos os tamanhos de todas as cores de cabelo em todos os cantos da sala. Ouviu um coro de vozes:
- Mamãe, que bom, café! E a criançada se reuniu em torno da mãezinha querida, alguns esticando seus copinhos e canequinhas, parecia uma festa. Depois de algum tempo, ela viu, o seu queridinho, encolhidinho, no sofá com cara de zangado, punhos cerrados e pronto a soltar um monte de gritos, e pontapés quem ousasse chegar perto. Com geio, a mãe, perguntou-lhe: - O que aconteceu com meu menino fofinho, não quer café. Ele gritou: - Quero pão, pãaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaao!
A mãe colocou a mão nos ouvidos, fingindo-se desesperada, enquanto os outros irmãozinhos arregalavam os olhos, as bocas, outros torciam os dedos, e outros ficavam simplesmente mudos, muito surpresos com a resposta de Joãozinho. Josileide muito tranqüila estendeu a canequinha de café para Joãozinho, era uma canequinha em feitio de urso, e tocava uma musiquinha longe, conforme o líquido ia esfriando a melodia ia desaparecendo.
Após o café, ela foi lavar as roupinhas da criançada, quando acabou estava perto da hora do almoço, meninos entravam e saíam da pequena casa. Algumas meninas preparavam o almoço com folhinhas retiradas dos matinhos no quintal, outras faziam cerâmica com a lama ao redor da casa, e os meninos, jogavam bola. Improvisaram uma trave, uma rede, traçaram com os calçados os limites do campo, enquanto alguns jogavam outros simplesmente torciam, assoviando. Joãozinho estava sentado em um canto do lado, muito gordinho, bochechas redondas, às vezes esquecia-se que estava aborrecido por causa da falta de pão, e batia palmas, gritava; GOOOL.
Josileide em suas intermináveis tarefas de mãe de inúmeros filhos corria de lá para cá em sua pequena casa de papelão.
Ouviu um grito de repente: - Leide, Leide, Leide! Onde será que está essa menina que tanto chamo e não me ouve. Josileide saiu correndo ainda com algumas peçinhas de roupa de seus filhos para lavar e pendurar na corda. Olhou sem graça para sua mãe e respondeu, medrosa, de apanhar novamente. – Estou aqui! Então corre logo, sua imprestável, menina do capeta, vive resmungando sozinha pelos cantos como maluca. Se ajeita logo que não demora a dona do menino ta aí. Vê se dá um jeito nesta sala imunda, entrou jogando os filhinhos de Josileide pelo ar, e a pobre mãezinha em seu coração enorme, chorava, de seus olhos já não desciam mais lágrimas, pois a rotina violenta e miserável, com suas cenas repetidas, estavam gravadas fundo em sua alma de inúmeros filhos e tão jovem.
Bateram palmas e Josileide foi atender,coçando a cabeça, pensativa, apanhou a pequena mochila do menino franzino e maltratado que ela iria “olhar” por dois ou três dias, enquanto a dona sumia por uns tempos com qualquer gringo que lle enchesse as mãos de verdinhas. Neco era o nome do menino que veio andando pelo beco, ao lado de Josileide. Chegando na cozinha gritou: Juau, ondi tu ta? E Joãozinho forte e rechonchudo, respondeu com um sorriso melado de balas de morango (a vizinha de dois becos lá longe tinha distribuído doces de São Cosme e São Damião, os que restaram ela trouxe para Josileide e seus filhinhos). E assim Josileide começou sua rotina mais atarefada do que antes, agora tinha além de todos os seus filhinhos, o queridinho e Neco. Desanimada olhou a mochila e viu um pacote de biscoitos de maisena, outro pacote de biscoito recheado de morango (os favoritos do Joãozinho), sabonete usado, mamadeira suja, leite em pó um saco plástico, em uma cambuquinha de plástico achocolatado, (a dona sempre mandava, mesmo sabendo que Neco não gostava), bananas, duas laranjas, bolinho (tipo Ana Maria) três pacotinhos de Miojo, e raridade duas bandejas de iogurte tipo queijinho suíço, Josileide logo se desiludiu e afastou as bandejas de iogurte, espiou pelo rótulo e percebeu que a validade já passara alguns dias.
Joãozinho quando viu a bandeja de iogurte em cima do sofá veio correndo e gritou: Oba. Mãezinha. Que bom. Neco nem percebeu, pois estava alheio brincando com todos os outros filhinhos de Josileide. Apareceu na sala a mãe de Josileide com aquela cara triste, chupada, pele encarquilhada no corpo, parecia um presunto seco, donde tinha sido retirado toda a gordura. – Leide, ce num vai brinca agora não, vai limpá essa casa, tomá conta do Neco e do seu filhinho Joãozinho, que eu vou escrever o bicho. Se eu demorá perco a coleta de apostas e amanhã to fora.
Colocou uma espécie de bolsa nos ombros e sumiu pela porta do barraco pobre e sujo. Andou a pé pela linha do trem, atravessou por um buraco no muro e foi agenciar o bicho.
Leide estava faminta e com duas crianças para tomar conta, além de todos os seus filhos. Olhou para o quadro a sua frente:
Um homem de cabelos louros e olhos azul muito lindo sorrindo, tinha no meio do peito um coração aberto, todo rosado e coberto de luz. Na magia inocente de seus nove anos, olhou para Jesus e ergueu uma prece, do fundo do coração: Senhor, me ajude, faz com que aquele gigante bêbado ali ao lado, me esqueça só por essa tarde, enquanto meus filhinhos estiverem dormindo. Não agüento mais essa ardência na minha xaninha, outro dia até saiu sangue. Minha mãe, ela gosta tanto de bebe como ele, que nem ouve o que eu falo, só levanta a mão para me bater. Outro dia ele queria tirar as cuequinhas do Joãozinho, mas ele correu. Ele é esperto, e forte. Não sei como engorda tanto se pouco come. Também com a fome que ele tem revira o lixo dos vizinhos igual cachorro, rato, sabe lá.
Já sei to pedindo muito. Então, Senhor Jesus, é o seu nome, escutei outro dia, quando passei naquela casa cheia de pessoas cheirosas de banho tomado, bem vestidas, que se reúnem aos sábados e domingos e cantam bem alto e gritam teu nome. Eu sei, que sou pobre e não vens me visitar, mas faz de conta que você está aqui ao meu lado e me ouve, pelo menos só desta vez.
Ao cair da noite o beco ficou tomado, a polícia invadiu todas as casas, Josileide, se escondeu como pode, com Joãozinho e Neco e todos os seus inumeráveis filhinhos. Depois de passado o susto, deu umas passadas pelo beco e ficou apavorada simplesmente, cortinas e rolos de fumaça, cobriam os barracos era um incêndio e tanto. Deu tempo de levar alguns filhos, Joãozinho que tinhas as pernas fortes e corria muito. Neco ficou perdido no meio da fumaça, Josileide, não o abandonou, mas eram tantas responsabilidades que quando acordou estava em um hospital. Não reconheceu ninguém, só via enfermeiras, enfermeiras, enfermeiras, e ouvia gemidos e tosses. Sentiu que não comia pela boca e não ia ao banheiro. O corpo ardia. Depois de muitos meses de internada ela soube o que se passara.
O Senhor Jesus, com sua força mandou um raio do céu e a justiça foi feita. Apesar dela ter perdido todos os seus filhos de pano e plástico, restou, Joãozinho seu irmãozinho, que ela tratava como filho, pois sua mãe a bicheira, não tendo com quem deixar o menino deu-lhe esta tarefa. Um grande incêndio na favela na beira da linha do trem nos subúrbios da zona Norte do RJ, destruiu muitos barracos um deles, foi o do homem bêbado que incomodava tanto Leide, quando estava sozinha com os filhos. E a boa notícia era que sua mãe não poderia mais ficar com ela nem Joãozinho, eles foram “adotados” por uma tal de tia “social” e iriam morar em outro bairro em uma casa pequena, mas confortável e no próximo ano Josileide voltaria para a escola e oJoãozinho ia para o Jardim. Ia ter bastante pão para seu estômago faminto. Lá perto da enfermaria do hospital, ouvia-se uma pequena multidão erguer as vozes: - Glória a Jesus, Aleluia, Aleluia, Aleluia!