QUIMERA
Mesmo com pés fixos no chão ela conseguiu voar. Desta vez percebeu não estar só, viu uma variedade de pássaros sobrevoarem o mesmo local onde se encontrava. Cada um tinha uma diferença, poderia ser a mínima possível: Asas azuis, olhos verdes, bico preto, e assim por diante. Ficou intrigada com isso, mas não parou de voar.
O pôr-do-sol estava tão lindo quanto a algumas horas atrás, agora uma mistura de verde com laranja dominava a paisagem. Ali o mundo poderia ser quadrado, e o universo guardado em uma gaveta de cabeceira.
Estranhamente todos estavam seguindo mesmo caminho, em direção a um lugar não tão distante que parecia ser uma caverna. Ceres planejava ir ao bosque das aves que ficava na contramão daquele percurso, mas só havia percebido isso agora após o sol ter se escondido atrás das nuvens no horizonte. Quando tentou retornar não conseguiu, era como se existisse um fluxo lhe impelindo para aquele lugar. Os pássaros ao seu lado também tentavam voltar, mas falhavam do mesmo modo. O fluxo tornou-se mais forte, e rapidamente entraram a força na caverna. Tudo ficou escuro de repente, continuava a voar. Lá no final conseguiu ver um pontinho de luz que foi crescendo conforme prosseguia.
O fluxo parou, todos desabaram no chão. Havia uma águia pousada sobre o que parecia um trono. O lugar era gigantesco, talvez existisse espaço suficiente para os pássaros do mundo todo. Ceres não sabia o que estava prestes a acontecer ali, mas sentia que seu corpo continuava preso, isso soava negativo.
A águia soltou um piado muito forte e todos, inclusive Ceres, ficaram no que diríamos posição de sentido.
- Hoje vocês puderam ver e sentir que posso controlá-los como quiser – riu-se a águia sorrateiramente – tão ingênuos, nem se deram conta que as coisas que vêem mundo a fora sou eu quem controla. Já chega de ser um controlador de fantoches às escondidas, revelo-me rei e vocês meus escravos.
De um pulo na cadeira despertou do sonho, viu todas aquelas pessoas ao seu redor no ônibus. A moça que estava sentada ao seu lado olhava-a com rabo de olho e uma expressão de indiferença. Aquilo foi apenas um sonho, que pode ser até classificado como um pesadelo por estar presa em determinado momento dentro de um fluxo. Sem querer retomar aquela agonia de ser controlada por uma águia ou qualquer outra coisa, tentou esquecer daquilo guardando em seus arquivos de quimera.
Depois de algum tempo, ou até mesmo instantaneamente, não se lembraria daquele sonho, mas mal sabia ela que isto está ligado com sua realidade. Ser controlada sem ao menos perceber.