Memórias Póstumas de Uma Rosa

A juventude, doce juventude, que saudades, sem dores no corpo inteiro, fôlego para festas, dormir tarde e acordar cedo com disposição, tempos que não voltam, mas todos nós crescemos, e agora estou tão velha que passo a mão em meu rosto e só sinto a minha flacidez, quando era jovem desejava ser jovem para sempre, mas o tempo que passa nos faz querer envelhecer e apenas sentar na frente da lareira, ler um bom livro e ter a felicidade de um abraço dos netos.

Eu já fui jovem, odiava idosos, achava horrível olhar para aqueles rostos, como eu era boba... Esse pensamento sobre idosos se reforçou mais quando vi a minha avó no cemitério, a sua foto era linda e jovem, mas no caixão era um corpo enrugado, lindo para sua idade, será que eu ficaria uma idosa linda? Eu não pensava assim, eu só queria nunca ver meu rosto velho, queria a juventude para sempre, sempre poder me olhar no espelho e nunca ver a face enrugada, então com esse pensamento jogo uma rosa branca em seu caixão fechado, a rosa era tão linda, não era comprada, era do meu jardim, minha avó costumava me falar que eu tinha o jardim mais lindo do mundo e que aquela era a sua flor preferida.

Passa o tempo todos superamos a perda, eu cultivava o jardim e cuidava dele todo dia, ele estava lindo, as flores não mais envelheciam, elas nasciam e caiam com toda a sua beleza, os anos foram se passando, eu me olhava todas as manhãs no espelho, nossa que rosto macio e lindo, e as rosas continuavam a nascer e nunca murchar, me caso, e então meu buque de flores foram delas as rosas mais lindas desse mundo, a lua de mel é perfeita, passam 10 anos, o tempo começa a me assustar, eu olho o espelho e ainda me vejo jovem, muito jovem, eu parecia uma adolescente, o que é isso? Pergunto para as pessoas se estou muito jovem para minha idade, todas respondem que estou de acordo, que estou madura, como elas não vêem? Seria inveja? Eu estava linda como desde minha adolescência...

Mais anos se passam, e então percebo a primeira ruga no meu rosto ao acordar, levanto da cama e corro pro espelho ver, mas espera, cadê? Eu a sinto com meus dedos, mas ela não esta ali, continuo jovem e com a pele macia e lisa no espelho, estou ficando louca? E mais tempo passa, e isso começa a me irritar, quero ver minha velhice quero ver meu rosto quero me reconhecer, nem em foto, nem no vidro de um carro, em nenhum lugar meu reflexo não revela a minha face, eu não consigo ver, todos vêem todos comentam, era a minha angustia, sofria, procurava um médico, como isso era possível? Então me lembro do pedido que fiz ao jogar a rosa na despedida de minha avó e me arrependo, eu não acreditava no poder de pensar, de pedir, de desejar muito algo, parecia uma maldição, já tenho filhos, netos, moro na mesma casa com o mesmo roseiral que ainda cuido que me liga muito a minha grande amiga falecida, e até agora vejo aquele rosto jovem que já não sou mais eu.

Passado um tempo eu adoeço, não quero ir a hospital nenhum quero todo dia cuidar da minha planta, ela também adoecia, suas folhas caiam, estava velha ficando seca, era o fim da vida dela, e eu via que o da minha estaria próximo, chega o dia que cai a ultima rosa linda, a qual no chão começa a envelhecer e enrugar rapidamente. Corto os galhos mortos e guardo as ultimas pétalas de recordação em minha caixinha de jóias em frente ao meu espelho, levantava os olhos, e então fitava alguém que eu não conhecia, era velha, espera, era eu mesma, toco o espelho, me emociono, choro e fico muito tempo ali parada apenas admirando a minha velhice, eu era linda como minha avó, toda época da vida é linda e deve ser vivida em seu tempo certo, era a única coisa que eu pensava naquele momento, o momento mais feliz da minha vida, minhas pernas doem, e então puxo uma cadeira não queria sair da frente do espelho, sentia muitas sensações, a visão fica turva, fica escura, e meus olhos pesam, quando vou piscar eles já não abrem mais, não abririam para sempre.

Douglas Vieira
Enviado por Douglas Vieira em 11/02/2011
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