Funério e a Morte
Funério era um sujeito estranho, era o tipo do cara que só falava em morte... Dizia que não tinha medo da morte, que se morresse amanhã estava bom porque já tinha vivido muitos anos e o sujeito não perdia um funeral. As pessoas costumavam dizer que ele morava no cemitério e não se aproximavam muito dele. Funério não tinha muitos amigos, ninguém gostava dessa excentricidade soturna dele.
Certo dia Funério não se sentia muito bem, estava com uma tremenda falta de ar e com taquicardia, avisou aos parentes, mas ninguém acreditou, todos acharam que era só uma cena, que era só um mal-estar e que ele estava exagerando para realizar seu grande “desejo”. Funério resolve se deitar e tirar uma soneca para ver se aquele mal-estar passava. Então ele fechou os olhos...
_ “Acorda rapaz! Você esperou muito por esse dia e não vai querer se atrasar!”
_ “Hã? Quem é você e por qual motivo me acorda desse jeito”.
_ “Ora, ora. Sou quem você mais chamou por toda vida, sou a Morte! E vou avisando, vim te buscar!”.
_ “Como assim?! A Morte?! Devo estar sonhando, que coisa mais absurda.”
_ “Confesso que estou frustrada, pensei que você me receberia com uma grande alegria, pensei que iria ver um clima festivo. Sabe me canso de ver gente triste implorando pra não ir, pensei que iria ver alguém feliz hoje, você sempre pediu pra morrer!”
_ “Então é sério, você é a Morte? Não se parece nada com o que dizem por aí, é até uma mulher bem formosa.”
_ “Na verdade sou como dizem, mas vim bem formosa porque pensei que seria recebida com muita euforia. Mas chega de papo Funério, venha comigo.”
_ “Espera! Eu ainda não quero ir, pensando bem tem tanta coisa que eu gostaria de fazer...”
_ “Ah, não! Não acredito! Pensei que hoje não ia ver pranto, mas me enganei, quanta decepção Funério! Não tem jeito, quando chega à hora ninguém pode escapar.”
_ “Poxa, da um desconto. Deve haver algum modo...”
_ “Não estou te entendendo, pediu a vida inteira pra morrer e agora, agora fica voltando atrás? Não tem jeito, vai vir por bem ou por mal?”
_ “Que tal um desafio? Se eu ganhar você me deixa aqui por uns dez anos e eu nunca mais direi seu nome em vão.”
_ “Olha eu não tenho tempo Funério, a lista de pessoas pra buscar hoje ta grande! Além do mais seria em vão, como você poderia me ganhar?”
_ “Bem se está tão segura, o que tem a perder? Acho que nada, está convicta de que vai ganhar.”
_ “Pois aceito humano medíocre! Quem eu achei que não me daria trabalho algum, está sendo o mais inconveniente! Oras, que desaforo! Anda, diga no que acha que pode me ganhar!”
_ “Sou capaz de te provar que você não me mata”
_ “Hahaha essa é muito boa e como acha que pode me provar isso?”
_ “Se eu provar, você me deixa vivo. Ok?”
_ “Que absurdo, você só pode estar louco... O que aconteceu? Foi à emoção de me ver? Tudo bem, isso não tem como acontecer, está apostado, se me provar eu te deixo vivinho da silva.”
_ “Vamos ao que interessa, mas antes, quero pedir algo: Estou vendo que você é muito inteligente, vou te fazer uma pergunta que eu sempre tive dúvida. Não quero morrer sem saber disso, depois eu te provo o que falei. Melhor garantir não é? Vai que eu morro, aí já era, nunca mais vou descobrir a resposta!”
_ “Parece que está recuperando o juízo, já está até me temendo, mas tudo bem eu respondo, pode perguntar.”
_ “Muito obrigado! Pois então vou perguntar, é uma dúvida que tenho em língua portuguesa. Nunca consegui aprender a conjugar verbos e quero saber isso antes de morrer.”
_ “Aff! Pergunte, não tenho o dia todo!”
_ “Supomos que nós dois estamos no deserto: Então eu acho uma garrafa de água e bebo toda sozinha, a minha sede a água vai matar, já a morte não irá matará.”
_ “Nossa você é péssimo nisso! Se quer colocar no futuro, basta uma vez só! O certo é: “A morte não irá matar” ou “A morte não matará”, entendeu?”
_ “Como? Não entendi muito bem... As duas opções que você falou estão corretas? Então repita uma só para que eu decore. Somente uma, não quero me confundir.”
_ “É com essa inteligência que vai me provar que não vou te matar? Você é desprezível mesmo... Tudo bem, eu repito uma, deixe-me escolher: “A Morte não irá matar.”
_ “Pronto ganhei o desafio.”
_ “Como assim seu louco?”
_ “Você acabou de dizer: “A Morte não irá matar”. Foi você mesmo quem disse, não posso ser contra.”
_ “Isso é trapaça, não vale! Vou te levar!”
_ “Admiro você que está faz esse serviço desde o início dos tempos, voltar atrás com sua palavra, eu te provei, cumpra seu trato!”
A Morte deixou de ser a moça formosa e voltou para sua forma original. Ela bufava enxofre pelas narinas e de baixo do capuz preto só era possível ver seus olhos vermelhos. Ela levanta a foice e vai à direção de Funério como se fosse decapitá-lo, quando a foice ia encostar no seu pescoço, a Morte vira fumaça e some. Funério acorda gritando e se pergunta até hoje se aquilo foi um sonho ou não. Para garantir ele nunca mais chamou a Morte e quando perguntam sobre ela, ele diz que a enganou e não quer vê-la nem tão cedo. Ninguém entende, mas não perguntam, acham que é mais uma loucura do senhor Funério...