O LAMENTO DO RIACHO RUBRO

(À árvore de casca vermelha:)

" -Tia, você viu a árvore de casca vermelha?"

Ela acabara de germinar.

Sua semente fora descuidadamente jogada pelo destino na massa lamacenta de barro lodoso, aonde as lágrimas dum riacho, solitário e calado, lhe banhavam sedutoramente na ânsia de vê-la crescer para lhe acarinhar com os seus primeiros frutos, ou quem sabe, lhe perfumar com suas flores.

Durante muito tempo ainda não tinha formas definidas mas a força daquele carinho leve e assíduo fomentou seu crescimento.

Todas as noites o riacho lhe mostrava seu canto fluindo pela brisa, a lhe ninar ao destino insone e desconhecido, do qual sua semente tentava desviar.

Através da mata esmorecida se foi percebendo que, aos poucos, o riacho recuperava seu canto.

Era voz corrente no pequeno habitat, entre os pássaros mudos e flores adormecidas, que algo de novo por lá acontecera, pois o riacho turvo, que há tanto tempo calara sua voz, passara novamente a alegrar todo o ecossistema com o som das suas águas.

E a cada dia um novo canto!

Nada mais se repetia naquele lugar estéril...aonde uma semente, enfim, germinara.

E a água do riacho seguia...a cada dia mais cristalina...

Aos poucos, o verde da mata novamente se iluminara com o sol das manhãs e a lua passara a aclarar os mistérios da noite.

Certo dia, ela finalmente se elevou da terra, firme e altaneira, sob a sinfonia mais linda da floresta.

Todos vieram dar-lhe as boas vindas.

Um belo passaredo revoava sobre seus frondosos galhos.

A luz do sol fundiu-se com a da lua e a luminosidade era indiscritível!

Ali, noite e dia de mãos dadas, presenteavam a mata com felicidade e com a eternidade do tempo que fora extinto.

O riacho imediatamente abraçou seu frondoso tronco que tinha uma peculiaridade: Era a única árvore de casca vermelha que germinara pela região.

A notícia logo se espalhou. A fauna de toda vizinhança se deslocava para vê-la e reverenciá-la.

E o riacho, feliz, seguia a lhe soar suas águas, no canto da vida, que só ele sabia cantar...Nunca mais escurecera por lá...

Mas um dia, a floresta foi tomada por um grande temporal.

Ventos sopravam por todas as direções e as águas do céu do mundo desaguaram todas no pequeno rio.

Um raio vindo de longe abalou sua estrutura no solo e a árvore de casca vermelha tombou a se perder na correnteza do seu riacho.

Conta-se que os dois seguiram abraçados pela floresta, unidos à eternidade...

Nunca mais se ouviu falar de chuva por ali.

A vida secou.

Desde aquele dia a noite tornou-se perene por toda a região...

Turistas de todo o mundo vêm de longe para ouvir a tal história e constatar o incrível fenômeno da natureza.

Vez ou outra, apenas se ouve um débil sons daquelas águas... um lamento emanado do que sobrou do riacho, entre resquícios do que, um dia, fora uma floresta.

Hoje, apenas um débil canto de dor... dum choroso riacho de águas vermelhas...