A menina celeste - Parte 1

Perto da meia noite, Jonas caminhava por uma rua escura e deserta. Mas, primeiramente, quem era ele e o que fazia nessa rua escura? Jonas tinha 17 anos, quase 18, tinha um cabelo preto liso e bem curto, olhos azuis, pele clara, mas não pálida, era alto e magro, e bem bonito. As meninas suspiravam sempre que ele passava, mas ele não dava muita bola, pois tinha vergonha de falar com elas. Ele caminhava pela rua, com sua camisa verde com mangas compridas azuis, sua calça preta, segura por um cinto também preto, de couro, e seus tênis pretos e cinza, pois havia perdido a carona que o trazia de volta da escola a noite e, como esta não era muito longe de sua casa, resolveu voltar andando. A rua era sombria, os postes iluminavam mal, e havia várias casas velhas, algumas até abandonadas, essa atmosfera sombria e fúnebre da rua a fazia parecer mais comprida e estreita à noite, como se as casas se projetassem sobre a rua, e desejassem devorar os infelizes transeuntes que passassem por ela.

Um grito ecoou pela rua, fazendo Jonas pular de susto e quase cair no chão. Vinha de uma daquelas casas abandonadas. Ele olhou a sua volta, tentando descobrir de qual casa viera o grito, mas não conseguiu ver nada além do normal nas casas à sua volta, se é que o estado que ela se encontravam podia ser considerado normal, com trepadeiras subindo pelas paredes, telhados esburacados, vidraças quebradas, asoalhos velhos que ragiam com os passos de alguém insano que ali pisasse, escadas sem alguns degraus e jardins com a grama alta e mal-cuidada. O grito soou outra vez, Jonas conseguiu rapidamente identificar de onde ele veio, e decidiu, contra o bom senso, entrar na casa. A casa estava mais escura que a rua, pois a luz só conseguia entrar pelos buracos nas janelas opacas pela sujeira. O piso gemia a cada passo, assim como as portas, ao serem empurradas. A sala tinha um tapete mofado no meio, com uma mesa velha em cima e, posicionado sobre a mesa, havia um vaso com flores que provavelmente estavam mortas há muito tempo. Em volta do tapete estavam duas poltronas empoeiradas, e um sofá encardido, no canto havia uma estante, na qual provavelmente ficava uma televisão que, se não foi levada pelo dono, tinha sido levada por alguém que a viu ali. Jonas avançou pela casa e entrou na cozinha, com seus móveis caindo aos pedaços, sua pia suja com louça quebrada dentro, e suas vassouras velhas e quebradas jogadas em um canto. Um fogão velho que provavelmente nem acendia mais jazia ao lado do balcão em que estava a pia. A cozinha estava silenciosa e deserta, logo Jonas concluiu que o grito não teria vindo dali e continuou sua busca pela casa. Entrou no primeiro quarto e nada viu, além de uma casa desarrumada, uma cortina comida por traças, que era usada para impedir que a luz entrasse pela janela que agora se encontrava aberta, permitindo que o vento entrasse assobiando de um modo belo e assustador. Uma estante cheia de livros velhos ficava ao lado do guarda-roupa, que, se não estavesse vazio, já estaria sem roupas, por causa da ação da traças. Jonas foi para o quarto seguinte, e encontrou uma bela jovem com os pulsos e as pernas amarradas ao lado de uma cama. A jovem era muito bela, seus cabelos castanho-avermelhados caíam-lhe desarrumadamente por sobre o rosto delicado. Estava metida num vestido branco, que descia até os tornozelos e deixava os pés cobertos apenas pela mordaça que outrora estivera em sua boca, impedindo-lhe de gritar. Jonas ficou paralisado na porta, se não fosse pela beleza da jovem, seria pelo fato de ela estar presa a cordas naquela casa abandonada e sombria. Ao se recuperar do choque, correu e libertou a moça, que agradeceu-lhe e sugeriu que saíssem daquela casa. Do lado de fora, ela perguntou:

-Posso saber o nome do cavalheiro que me libertou?

-Com todo o prazer. Meu nome é Jonas. E o seu, bela dama?

-Me chamo Celina. Mais uma vez, obrigada por me salvar.

-Não há de quê. Mas quem foi o covarde que te prendeu?

-Foram os monstros.

Jonas não entendeu direito o que a menina quis dizer com isso, mas falou:

-Certamente, quem fez isso com você só pode ser um monstro.

-Não! Foram realmente monstros, daqueles grandes e feios, com garras e dentes afiados.

-Sei... você está delirando. Foi difícil pra você ter sido sequestrada e mantida em cativeiro.

-Estou falando a verdade.

-Está bem, então. Onde você mora?

-No céu, foi de lá que eu vim.

-Pare de falar asneiras, estou tentando te ajudar, e você não está colaborando.

-De novo, estou falando a verdade.

-Vamos para minha casa, vou cuidar de você até a gente achar sua família.

-É melhor não, para o seu bem. Eles podem vir atrás de mim.

-Eles quem?

-Os monstros.

-Pare com essa brincadeira, já está ficando sem graça. Você estava cativa em uma casa abandonada, eu te salvo e você, além de recusar meus cuidados, fica falando bobagens.

-Não é verdade isso que você falou! Os monstros estão atrás de mim, e se eu ficar com você, te colocarei em perigo.

Celina se virou, e tentou correr para longe de Jonas, mas torceu o tornozelo e caiu no chão.

-Está vendo? Você precisa de ajuda. Vou te levar para casa e cuidar de você até acharmos seus pais.

Jonas foi para casa, carregando a menina nas costas.

-Você tem quantos anos?

-Eu existo há muito tempo, desde antes dos humanos. Não me lembro há quanto tempo nasci.

-Desisto de conversar com você. Me avise quando deixar de falar bobagens.