O Ladrão de Eurico
A Cidade de Eurico
Estava tudo calmo naquela noite. Estranhamente calmo. A pedido de Dom Alonzo de Guzmán el Bueno, duque de Medina Sidônia e Capitão Geral da Andaluzia, os guardas da cidade vieram protegê-lo. Ao que parecia, sua visita não era bem-vinda, ele havia recebido uma das cartas ameaçadoras do Capuz, o misterioso ladrão que vinha aplicando os seus golpes na cidade de Eurico nos últimos tempos. O rei Filipe não estava nem um pouco satisfeito com o desenrolar dos acontecimentos, ninguém era capaz de capturar este malfeitor e, por conseqüência, este ladrão tornava-se cada vez mais ousado, chegando a interferir em assuntos que seriam da competência exclusiva da guarda desta cidade, atuando como um protetor, frustrando assaltos, fosse no interior dos muros antigos da cidade, fosse dentro das imediações dos muros novos em construção, fosse nos seus arredores, ao mesmo tempo em que continuava a fazer os seus furtos. Isto despertou inclusive o interesse da inquisição, o povo começava a acreditar em se tratar de um anjo ou espírito benevolente. Seu nome era famoso mesmo nas cidades mais afastadas da Península, afastando assaltantes e malfeitores, e provocando medo nos nobres e nos burgueses mais bem sucedidos do reino.
Mas não desta vez. Os guardas vigiavam a porta de entrada e faziam ronda em volta do castelo revezando a toda hora. Jaime Ráfare, o comandante da guarda, cuidava pessoalmente do aposento onde se encontravam as riquezas de Dom Alonzo, vigiando a porta sem nem ao menos piscar. Não havia como o ladrão passar por eles.
De súbito, houve um barulho em uma das janelas do outro lado da sala, Jaime se alertou e levantou para investigar, olhou, observou, mas não era nada, retornou ao seu posto. Novamente, dessa vez mais alto, só que fora do aposento onde ele se encontrava, era preciso checar. O comandante da guarda teve de sair. E, no seu lugar, através de uma janela que foi aberta com extrema perícia, sem um único ruído, entrou uma misteriosa figura com roupas negras que seguiu para onde jóias se encontravam.
Para o ladrão conhecido como o Capuz, aquele era um momento bastante empolgante.
– Parece que hábitos antigos são difíceis de abandonar. – disse ele em voz baixa. – Principalmente quando envolve as riquezas dos amigos de meu inimigo.
O comandante ainda não havia retornado do outro aposento e o caro ladrão já tinha pegado tudo o que queria, mas, como sempre aconteceu com o Capuz, ele nunca queria passar despercebido. De repente, Jaime Ráfare e seus subordinados ouviram um grande estardalhaço na sala que era para ser protegida. Quando entraram, enxergaram apenas uma misteriosa figura negra que dizia:
– Boa noite, cavalheiros. Tenho apenas um aviso a lhes dar: Parem de perseguir os seus verdadeiros aliados.
– Quem é você, Capuz? – perguntou o comandante da guarda o mais espantado possível. – Como conseguiu passar por nós?
A figura negra olhou para o comandante da guarda com um olhar de pena e dor.
– Vocês estão cometendo um grave engano, – disse o ladrão puxando da capa um gancho amarrado a uma corda sem que percebessem. – mas eu vou abrir os olhos de vocês antes que eu seja tarde demais. – e, correndo em direção da janela por onde havia entrado, saltou deixando os guardas surpresos.
– O Capuz voa. – disse um dos guardas.
– Peguem o maldito! – disse Jaime, mas já era tarde, o Capuz já havia escapado. Os guardas aproximaram-se lentamente da janela.
– Era o famigerado Capuz. – disse um dos guardas com um tom de tristeza. – Apesar de todos os nossos esforços, ele conseguiu de novo...
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