Los Tropicanos
Los Tropicanos era o nome do conjunto musical do bairro; tocava músicas latino-americanas da moda - boleros, mambos, rumbas e outras tantas cantadas em espanhol; diga-se de passagem, em péssimo espanhol. O solista era um cantor da pior qualidade; embora tivesse volume de voz, não tinha afinação e nem sabia dividir as frases, mas tinha uma boa figura.Para melhorar as apresentações contrataram Nilma, jovem magra e belíssima, que não cantava, mas se contorcia durante as apresentações parecendo uma cobra pronta para o bote; Nilma tinha a beleza muito apreciada por todos, inclusive por mim, mas aquela opção pela "carreira artística" colocou-a no rol das descartáveis; numa época em que ser artista era prenúncio de má conduta. O conjunto com roupas típicas dos cubancheros estourava nossos ouvidos, com o som estridente dos bongôs, e Nilma se desconjuntando de tanto rebolar. Eu mesmo contratei o conjunto, representando o grêmio do colégio no Méier, pela módica quantia de cento e vinte mil réis, para o baile mensal; foi um grande sucesso. Naquela época, ainda adolescentes, todos nos orgulhávamos de ter um conjunto de tal envergadura em nosso bairro; sempre justificávamos as péssimas apresentações, achando que em determinado dia viria o reconhecimento, depois de muito treino. Foi um acontecimento, quando na década Xavier Cugat e sua orquestra vieram tocar no Rio, o que criou um interesse muito grande nos conjuntos latinos. Los Tropicanos foram convidados para uma apresentação numa das rádios de boa audiência, mas o resultado foi catastrófico e Sebastian o crooner e chefe da orquestra passou a ser olhado como malandro ocioso, e a rumbeira Nilma achou melhor casar-se com um professor de escola primária, para melhor garantir seu futuro. O conjunto implodiu! Às vezes, quando ouço uma boa música latina, lembro-me daquela fase em que apesar da pouca idade, procurava estimular o conjunto. Garanto, que piores do que Xavier Cugat e sua mal comportada rumbeira - Abbe Lane, Los Tropicanos não deveriam ser. Curiosamente, Sebastian tinha um irmão que cantava tangos muito bem, com voz bonita e bem colocada, mas que nunca foi chamado para abrilhantar o conjunto, pois, não era bem visto seu relacionamento com Zé Caneca, apelido de um seu apaixonado. Nas comunidades mais pobres, àquela época, esse tipo de relacionamento causava escândalo. Gostava de dar recitais de tango para os amigos. Durante os recitais, sem Zé Caneca e com a caneca na mão, tomando um vinho barato, sem perder a afinação, repetia: "Acaso te llamaras solamente Maria...” “Margo he vuelto a la ciudad con el tango más amargo...” jamais cantava boleros para não competir com o irmão, que já estava profissionalizado. Voltei a encontrar o nosso milongueiro, por acaso, na Santa Casa, pois, tinha feito uma cirurgia.. Ficou bem, e soltava a voz pelos corredores da vetusta instituição, alegrando os pacientes internados. Cantava com a impostação do Gardel. A dançarina Nilma morava numa casa afastada da rua, chegando-se à entrada por um corredor, com um caramanchão de videiras, com uvas deliciosas com sabor do pecado; como havia mulheres bonitas naquela casa! Mais parecia um entreposto de beleza; ali também residia minha companheira de praia - Mary Lincoln; nome estranho para uma jovem, que também olhava de maneira estranha, permanente apelo lascivo, mas extremamente reconfortante.