Santa Bárbara

Num lugarejo esquecido no vale dos sonhos, a tableta demarcava a pacata aldeola de “Pimentões”.

Lucrécia cozia a janta no fogão a lenha e o fumo da chaminé exalava o tempero do pobre, um caldo de couves, engrossado a feijões. A água fora-a, Lucrécia, buscar ao poço, a força de braços, tarefa que não lhe competia, mas que também lhe calhava.

Pondo os caqueiros que lhe serviam de loiça na mesa, lá foi gritando pelo seu homem para que se vestisse de compostura e se aprochegasse para jantar:

- Domingos, levanta-te daí homem, que a hora da refeição é sagrada!

- O raio da mulher não me dá descanso ao esqueleto!

Lucrécia apressava-se a tirar as mantas de cima do marido, prolixo por natureza e calão de profissão, por força da bebida ou para honrar o nome que o seu padrinho lhe dera, homem este, também não muito devotado ao trabalho.

O “moço” ainda era pequeno, mas já carregava o burro de lenha e ordenhava as vacas. Enquanto isso, Domingos, aproveitava o tempo para roncar desde a sesta até à hora da ceia e a noite tinha-a por companheira, já que de insónias era mal de que não se queixava.

Os trovões começaram a fazer-se sentir e já os relâmpagos alumiavam a casa melhor do que o candeeiro a petróleo e as velas que ardiam junto ao nicho da Santa, quando o moço se escondeu debaixo da cama.

Lucrécia queria chamar pelo filho e tão pouco se lembrava do nome que lhe havia dado, há 11 anos atrás, quando o parira em cima de uma enxerga e a desilusão de não ser uma menina fora tão grande que, apenas lhe tratava por moço.

Pimentões estava, agora, sob castigo divino, a trovoada tomara conta do lugarejo e, ainda assim, se ouvia o roncar de Domingos.

Lucrécia ajoelhou-se frente à Santa e orou apoquentada:

- Santa Bárbara! Santa Bárbara! Alivia-me o burro e a albarda!

A trovoada amainou, o moço saiu de baixo da cama, já Domingos, esse…ainda roncava.

Fana
Enviado por Fana em 02/04/2010
Código do texto: T2173513
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