Mundo Novo

Havia uma colônia de bichinhos que viviam grudados nas pedras no fundo de um rio. Ali eles conversavam, se alimentavam de micro organismos, dormiam e levavam a vida sem grandes preocupações, mas, não se soltavam das pedras de modo algum, pois a correnteza era muito forte e eles tinham medo de serem mortos por ela. Porém, existia um desses bichinhos que não parava de perguntar: -- Será que a vida é só isso, comer, beber, dormir e procriar? O que será que existe lá em cima? E apontava para a superfície turva do rio. Seus companheiros o achavam meio esquisito. Afinal porque questionar essas coisas, retrucavam eles, a vida não é boa? Tudo que queremos não está ao alcance de nossas mãos? – Levamos uma vida tranqüila aqui, deixa como está.

Mas não adiantava. A mente de nosso amiguinho não parava jamais. Um belo dia ele resolveu comunicar a todos que ia se soltar para procurar as respostas que tanto lhe deixavam inquieto. Foi um alvoroço geral. – Você ficou louco, gritavam os mais exaltados, vai morrer arrebentado pela correnteza! Nós não fomos feitos para nadar, outros questionavam, se fossemos teríamos nadadeiras, o que você quer fazer é contra a natureza. Mas de nada adiantou, nosso herói se soltou e foi imediatamente colhido pela poderosa correnteza que o levou em grande velocidade para se chocar em uma gigantesca pedra que ficava logo abaixo. Ele morreu instantaneamente.

Algum tempo depois, nosso amiguinho nasceu de novo. Cresceu entre os amigos que não o deixavam esquecer sua “loucura” do passado. – Vê se dessa vez você toma jeito rapaz. A vida é boa e deve ser vivida com tranqüilidade.

Mas seu espírito aventureiro e inquieto não o deixava em paz. Vivia olhando para cima, procurando enxergar alguma coisa por entre as águas que o separavam de uma outra realidade, uma realidade que ele tinha certeza de existir, mesmo sem nunca tê-la visto ou sentido.

(Não se conteve) Contrariando a todos se soltou novamente, a correnteza o pegou, o jogou pra lá e pra cá, conseguiu se desviar da grande pedra, mas acabou se chocando a outra tão grande quanto aquela e mais uma vez seu corpo pereceu.

Quando nasceu novamente todos já sabiam qual seria o destino daquela pequena criatura. Sua teimosia já ganhara fama, era chamado de louco, aventureiro, lunático... (A mente é capaz de criar mundos. Lhe disseram uma vez) Ele só queria ampliar os limites do seu.

-- Não faça isso! Ainda não aprendeu a lição? Você vai morrer de novo.

-- Posso morrer mil vezes, mas não vou parar jamais. E dizendo isso se lançou mais uma vez no desconhecido.

Dessa vez parecia que havia algo diferente... Ele sentia como se seu corpo e a correnteza fossem apenas um. Desviou da primeira pedra, desviou da segunda, a velocidade ainda era grande naquele trecho do rio, seu corpo passou muito perto de uma terceira pedra e continuou rio a baixo, a velocidade foi diminuindo e pouco a pouco foi subindo em direção à superfície. Quando finalmente colocou a cabeça fora dágua pela primeira vez, ficou estupefado e embriagado com tamanha beleza e imensidão. Era noite. Milhões de estrelas cintilavam no céu azul escuro. Nuvens brancas passeavam livres, parecendo dar boas vindas a um novo e pequenino ser. Ele ria de alegria e contentamento. – Eu sabia! Eu sabia que tinha mais. E se deixou levar, devagar, apreciando e saboreando o novo mundo.