Sono profundo
... E ela adormeceu,
doce encanto no último suspiro, um sorriso de criança
ainda por vir, a vida lhe saia pelas mãos que frias repousavam sobre o peito.
Tão bela, tão serena em seu sono de paz... O mundo lhe saudava pelas folhas que a brisa tocava,
assim como sua pele, já fria pela ausência da vida,
ainda mantinha o frescor da juventude que lhe corria pelo sangue no róseo tom que mesclava a tarde.
Nos braços que tanto desejou, repousava sob as lágrimas do amor que não vê agora mais motivo para viver.
E o que é a vida senão amar, entregar-se inteiro à paixão que desenha estradas a percorrer?
Ardente, em chamas, abraçando a dor que novamente cantava em seu corpo os acordes mórbidos do fim, soltou seu grito, um apenas, e o mundo pôde ouvi-lo.
O horror estampava-se sob as colinas secando as flores que rasteiras coloriam a paisagem.
Era noite no coração do homem que um dia amou. Era noite no céu onde a lua se apagou. Era noite apenas, noite e nada mais.
Sumiu o sentido, apagou-se no gemido rouco a paixão que avermelhava o horizonte.
Calou-se a natureza nas vozes dos pássaros que não mais cantavam sua toada anunciando a manhã que também se negava a chegar.
Tudo virou silêncio. As ondas se voltaram para o interior do mar negando-se a quebrar nas praias beijando as areias que também se negaram a ser beijadas. Fecharam-se as almas no soluçar do vento que negava força à tempestade que não queria mais chegar.
... E tremeu a terra. Dos quatro cantos do mundo, surgiu o tremor avassalador encontrando os elementos no centro do corpo que não sabia ainda se caminhava na morte ou na vida que restava. Os pés que marcaram chão, criaram raízes depositando os sonhos em sepulcros soterrados por avalanches já desprovidas de quaisquer emoções.
Viu-se então um semblante a refletir-se na única gota não engolida pelo rio e nele, o adeus gravado no olhar que já ia distante do único corpo que um dia,
pela alma da vida, conheceu o amor...
01/07/2006