Kranagerie, o goblin
Essa história é sobre uma pequena criatura esverdeada chamada Kranagerie e seus pais. Kranagerie era um pequeno goblin de apenas 1 ano de vida.
Como todos sabem, os goblins são criaturas que vivem muito menos que os humanos, algo em torno de 30 anos apenas. Por conta disso, eles também se desenvolvem muito mais rápido que os humanos. Kranagerie não era propriamente um bebê, mas uma criança pequena. Comparando-a com uma criança uma humana, seria em torno de uns 7 à 10 anos de idade.
Também não é segredo que goblins não são das criaturas mais amáveis. Durante todos os meus anos de estudo, pude perceber que são criaturas extremamente irritáveis, egoítas e desapegadas aos mais próximos de sua espécie, como companheiros afetivos, pais e filhos. O lazer desses pequenos humanóides é sair com seus comparsas bebendo malte destilado e destruindo pedaços do patrimônio de seus reinos a chutes e pauladas. Demonstração de tristeza em goblins são raras, sendo muito mais comum ataques de raiva, fúria ou mesmo desespero. Se você não for um goblin, não experimente puxar assunto com eles, pode ser uma tarefa inglória.
No dia em que se relato se deu, os pais de Kranagerie o deixaram trancado em sua casa e saíram. Encarreguei Wigler, meu assistente de pesquisa, de seguir os pais da criatura e fiquei observando o pequeno Kranagerie, que desesperado em sua solidão tentava sair do pequeno cubículo que as criaturas verdes costumam chamar de casa.
Goblins não são conhecidos por sua inteligência. Jamais eu poderia imaginar o que se seguiu.
Após algumas horas, o pequeno Kranagerie arrastava com seus pequenos braços um pesado apoio de pedra, utilizado como uma cadeira. Eu podia observar do buraco utilizado como janela, a expressão angustiada em sua face.
Kranagerie apoiou a pedra próximo a janela, subiu nela alcançou seu objetivo. Ao tentar sair, ocorre o inevitável, e ele cai. Aparentemente com alguma dor, ela gira no chão aos gritos, mas em pouco tempo se levanta e sai a caminhar pela floresta. Pude identificar ele pronunciando duas palavras, num ritmo cadenciado. Com meu binóculo focado em seus olhos, percebo uma lágrima escorrer sobre suas faces.
Do ponto onde eu estava, percebo um grupo de alces correndo na mesma direção de Kranagerie, que nesse momento acabara de sentar, enxugando as lágimas, e temo pelo pior. Em menos de 15 segundos os alces passariam pelo ponto onde ele estava e apenas um milagre poderia tê-lo salvado das fortes patas dos alces.
Nenhum milagre aconteceu, e Kranagerie foi pisoteado por pelo menos uma dúzia de alces.
Ficou imóvel no chão. Apesar de se tratar de um goblin, a cena foi demasiadamente chocante pra mim.
Não chegou a se passar uma hora e Wigler volta, juntamente com os progenitores do pequeno goblin. Ele ia começar seu relatório, mas eu pedi que fizesse silêncio para que eu acompanhasse a reação dos pais ao não encontrarem Kranagerie em casa.
O desespero toma conta deles que se separam para tentar encontrar o pequeno. A mãe foi na direção contrária, mas o pai ia crucialmente na mesma direção que Kranagerie havia ido. Não tardou, e o pai goblin encontrou seu filho, deitado no chão com várias feridas sobre o corpo. Sem vida.
Gritos, muitos gritos. Quase urros. E o mais improvável acontece. Percebo que uma lágrima sai dos olhos do goblin pai. Provavelmente eu estava diante da maior quebra de tabus que a história já viu. Sabendo disso, abandonei a cena, quando a mãe, seguindo os urros do pai, também encontrou o corpo do pequeno Kranagerie.
Quando íamos em direção ao laboratório, conversava com Wigler sobre como eram diferentes aquele casal de goblins, que pareciam se importar realmente com o falecimento do filho. Perguntei então a Wigler por que os pais de Kranagerie saíram, pois se realmente se importavam, deveriam ter saído por algum motivo muito importante.
Wigler me respondeu que eles foram até o deserto, próximo à floresta, com um outro casal de goblins, correram pela areia, beberam alguns copos de malte destilado e voltaram pra casa. Resumidamente, foram fazer nada. Passear
Perderam o filho porque foram passear e o abandonaram trancado em casa.
Quem vai entender esses goblins?
Doutor Giulio Minerva
Biólogo com PhD em Goblinologia