Guerra Junqueiro (1850-1923)
Um verdadeiro episódio de censura e patrulhamento ocorreu, quando eu era bem criança. Minha mãe esbravejou e destruiu um livro, que meu pai guardava com todo cuidado; A Velhice do Padre Eterno, de Guerra Junqueiro; julgava-o um livro amaldiçoado pela igreja; imaginem o absurdo! O livro que tinha capa marrom foi destruído e só passei a ter notícias de seu texto, por algumas poesias, que eu mal lembrava o tema, como O Melro; lembrava das ilustrações fantasmagóricas; o Joca recitava de memória alguns versos. Convivi durante anos com a imagem da destruição do livro...Voltávamos à Santa Inquisição! Imaginem que, poeta e filósofo, Guerra Junqueiro era considerado um dos maiores poetas portugueses. Nascido em 1850 tinha grande conceito nos meios literários portugueses; sua poesia, que ora releio, é precisa e inspirada, embora na Velhice do padre Eterno ele chega a ser de uma irreverência brutal, usando as palavras como azorrague contra a hipocrisia e o fausto da igreja católica, segundo suas concepções.Tinha a curiosidade aguçada pelas recomendações de minha mãe - não abram esse livro! A idéia que eu tinha, é de que deveria conter incríveis cenas de luxúria, tais como, pessoas sendo beatificadas na cama! Achei muito pior, pois, era um assíduo freqüentador de igreja, e não admitia que sacerdotes fossem desonrados. Recentemente, consegui uma edição de Lélo & Irmão do Porto publicada depois de 1912, dedicada a Eça de Queiroz. Depois de matar as saudades, dei o livro de presente para meu irmão; eu o considerava mais merecedor, pois, guardou muitos dos poemas na memória! Fernando Pessoa teve muita admiração por Junqueiro e leu com grande entusiasmo a Velhice do Padre Eterno; tempos depois, passou a considerá-lo ultrapassado, “dando-o como morto”. Segundo Robert Bresson, bibliógrafo, que deu um mergulho profundo na vida e obra de Pessoa, o poeta aos 5 anos, com o heterônimo Chevalier de Pás, escrevia cartas para si mesmo...Daí, não nos admirarmos com a mudança de opinião de Fernando Pessoa declarando...Guerra a Junqueiro!