A menina encantada
Nos tempos de Maria Castanha, quando os animais sei que falavam, contam crónicas antigas que ninguém leu nunca porque não existem, que num castelo de terras longínquas moravam um conde, que era viúvo, mais sua filha Folerpinha, que na língua do país era o mesmo que dizer "Pequeno Floco de Neve", assim chamada em honra das filhas órfãs doutros contos O pai, como já terão adivinhado os leitores, casou de novo, mas, isto estou certo que não o sabiam, foi com uma formosa mulher de cabelos roxos, natural duma fonte do lugar.
Uma noite, enquanto a criança dormia, a madrasta pegou nela e levou-a junto duns mouros (nome duma das raças mágicas cá da terra), eu suponho que nalgum momento a menina terá acordado, porque não estava encantada, que nada sabemos ainda de maçãs com veneno. A beleza da criança, feia é que não podia ser, ou quê, engaiolou os mouros, e a Folerpinha converteu-se em sua Senhora.
A madrasta, todavia, tomou conhecimento dos factos, devia haver algum traidor entre os mouros. Foi para o local subterrâneo deles, o caminho já o sabia, e ali se topou com Folerpinha, a quem enfeitiçou deste jeito:
- Folerpinha, Folerpa, converto-te numa serpa- porque as bruxarias ou levam rima ou são inúteis. A criança tornou-se numa serpe.
Quando os sete mouros, pois que eram sete, se não vo-lo havia dito já, voltaram para a casa, e viram a serpe, hesitaram se matá-la ou aguardar pela explicação da madrasta, que lhes falou assim:
- Quem a quiser desencantar, três beijos terá que lhe dar- mais uma rima.
E os sete mouros levaram a serpe e soltaram-na num rio, a repetirem as palavras da madrasta, não fossem perder a rima:
- Quem te quiser desencantar, três beijos terá que te dar.
Porém, logo os viu um moço da terra, quem, vendo mouros, pensou nos tesouros. Sem medo da serpe, três vezes a beijou, e, de súbito, lá apareceu a formosa Folerpinha, a qual, sem querer saber nada do moço, iniciou a sua vingança. Bom, o moço, lá na sua aldeia, contou o que se passara à sua maneira, e há lendas que se contam, mas não acrediteis, acreditai em mim.
Como disse, a Folerpinha iniciou a sua vingança, com a ajuda dos mouros, nada sabemos do traidor. Os mouros presentearam a madrasta com uma maçã, e tornou-se, a madrasta, não a maçã, num seixo branco, seixo que ainda ontem era dia que se podia ver.
Então Folerpinha voltou ao seu castelo. O pai quis casá-la com um aristocrata estrangeiro, mas ela escapou e agora vive cabo dos seus amigos os mouros, a lutarem contra a tirania.