A Mais Pura Forma de Amor - I

Atenção:

Esse conto retrata o romance entre um vampiro e um lobisomem, sendo ambientado no Mundo das Trevas. Tem como objetivo explorar a rivalidade natural das duas 'espécies', e permitir que os leitores os compreendam à medida que eles próprios começam a entender um ao outro, e ao sentimento que desenvolvem.

É um romande entre duas 'criaturas' do sexo masculino, estás avisado.

Eu gostaria muito de receber comentários, pois estou muito empolgada com esse romance novo, e a opinião dos leitores é muito importante para mim.

Muito obrigada pela atenção e beijos.

A mais pura forma de amor

Provavelmente havia sido o forte cheiro de sangue que o atraíra, muito obstante não pudesse descartar que talvez a culpa fosse daquela forte sensação de perigo que tinha o poder de despertar sua quase que infantil curiosidade.

Ele era uma criança, afinal. Pelo menos quando comprado com os demais.

Vinte e um anos definitivamente era muito pouco para alguém que poderia viver uma eternidade, e menos ainda para quem sabia que poderia morrer pela segunda vez a qualquer instante.

Pois comparado com seus nada fraternos irmãos, ele era tão fraco quanto acusavam seu sangue de ser.

E como o novo Príncipe que resolvera proclamar “eu sou o dono de Atlanta” era um sangue azul, fresco, elitista e com uma forte inclinação neo-nazista, caittifs como ele haviam perdido o direito de caçar até pelos fétidos becos do subúrbio.

Não que ele fosse sentir muita falta dos pescoços imundos daqueles mendigos bêbados... Mas era fato que agora até o mais sujo deles poderia parecer uma deliciosa refeição...

“Fuja, minha criança! Fuja!”

A voz desesperada ainda ecoava por sua mente, e juntamente aos gritos de dor que se fizeram logo após, formavam lembranças que o deixavam tonto e desorientado.

Ele balançou negativamente a cabeça, como se tentasse sacudir os pensamentos desagradáveis. Olhou para o céu, mas não viu nada. A copa das árvores era tão densa que nem o mais singelo raio de luz prateada podia tocar o chão repleto de folhas mortas.

Continuou então a seguir seus aguçados sentidos, sem, todavia, dar atenção aos seus instintos de auto-preservação; Sabia que um grande perigo o aguardava no local de onde emanava o forte cheiro de sangue... Mas bem, os perigos estavam em todos os lugares, não?

Aproximou-se com alguma cautela. A vida nas ruas o havia deixado desconfiado e esperto. Seus pés conseguiam ser silenciosos, ajudando seus olhos privilegiados e descobrir coisas que não deviam.

Entre um riacho e uma poça de sangue, um lobo de lustroso pêlo cinzento jazia.

Ele se aproximou um pouco mais, e pelo jeito fora notado. O lobo se virara a cabeça em sua direção e rosnara ameaçador, fazendo os pelos da nuca do jovem caittf se eriçarem em um sentimento desagradável. Era algo que misturava medo e ódio, algo irracional e totalmente bestial, que o fazia se sentir ainda menos humano do que de costume.

Quando deu por si, estava com seus pontudos caninos expostos de maneira ameaçadora, como se fosse um animal.

Procurou se acalmar, voltar a si. Não podia deixar um mero instinto primitivo dominar-lhe, e por isso se aproximou mais. O lobo fez menção de levantar-se para atacar, mas a pata traseira, presa dolorosamente a uma armadilha de urso o impedira, então o animal apenas ignorou a dor e rosnou mais uma vez.

O vampiro chegou ainda mais perto e se colocou a examinar a situação, sem temer o fato daquele bicho demonstrar grande interesse em morder-lhe. Até porque ele se encontrava em situação ainda mais decadente que a sua própria. Parecia muito magro e abatido, o que fez o vampiro imaginar há quanto tempo que ele estava por lá.

A pata parecia fraturada, dada a ação da enorme armadilha, a qual, diga-se de passagem, era muito brilhante. Prata, provavelmente, reforçando a absurda idéia de que aquilo a sua frente era um mesmo lobisomem.

Ouvira falar um pouco deles, que eram perigosos, e que detestavam os vampiros acima de tudo. E pela reação dele, parecia ser verdade. Estendeu sua mão para ver uma maneira de tirar a armadilha, e como recompensa, quase ganhou uma mordida.

-Desgraçado! –Sussurrou sério e raivoso, tirando sua mão de perto. –Não vê que eu quero te ajudar, bicho burro?

Aproximou mais uma vez sua mão, e dessa vez os afiados dentes do animal conseguiram resvalar por sua pele no momento que ele puxou apressado seu braço, querendo se esquivar de mais uma mordida.

Suspirou.

-Escuta aqui, você não gosta de mim, e eu não gosto de você, mas que saber? Que se dane! Eu vou tentar te ajudar só mais uma vez, e se você tentar me morder de novo, eu mesmo te mato, viu?

O lobo apenas exibiu os dentes, ainda ameaçador, mas dessa vez não tentou morder o vampiro.

-Você deve ser muito burro para não ter visto uma armadilha desse tamanho... –O vampiro comentou zombeteiro. Não tinha folhagem no local, pois no leito do rio havia uma clareira, o que permitia a lua iluminar nitidamente o local.

O animal apenas rosnou nada satisfeito com aquele comentário, e depois ganiu um pouco em dor. Aquele vampiro estava tentando tirar a armadilha, mas o movimento apenas fazia com que ela adentrasse mais sua carne, fazendo com que a prata machucasse até o osso.

Pensou se agüentaria aquela dor sem desmaiar, mas definitivamente não se permitiria demonstrar fraqueza na frente de uma criatura imunda como um vampiro.

Ele podia ser tudo, mas ainda tinha sua honra para preservar.

E foi lutando para manter a consciência que ele pôde finalmente sentir, repleto de alívio, sua pata ser liberta da cruel ação purificadora daquele metal. Uma pena que mal conseguia se mover, quando até respirar se mostrava um grande desafio.

Tentando se recuperar um pouco mais rápido, seu corpo mudou de forma. Ele agora era algo mais humanóide, embora ainda indubitavelmente animalesco, coberto de pêlos e com garras no lugar de unhas. Devia ter mais de dois metros de altura, e a presença de dentes ainda maiores e mais perigosos fizera com que o vampiro se assustasse e se arrependesse de ter libertado aquele monstro. Era como se já pudesse sentir aquelas garras rasgando sua pele, marcando dessa maneira sua ultima noite.

Mas nada acontecera.

O lobisomem ficou apenas deitado no chão, tentando se recuperar dos malditos poderes sobrenaturais da prata.

Passado o susto, o vampiro se levantou.

-Um ‘obrigado’ cairia bem, sabia... –Comentou cínico, tentando manter a pose. Aquele era um dos seus maiores defeitos: falava demais.

Mas provavelmente um dos maiores defeitos daquele lobisomem era falar de menos, e por isso ele apenas grunhiu em resposta, prosseguindo na sua respiração profunda e angustiante, enquanto pensava no quanto doía aquela porcaria de machucado.

O vampiro suspirou, revoltado consigo mesmo. Só podia ser um idiota, se estava esperando a gratidão de um ‘animal’.

Resolveu que estava mais do que na hora de parar de bancar o bom samaritano e voltar a se preocupar com os seus próprios problemas: Estava faminto, e pelo jeito não tardaria a amanhecer.

Como estava bem distante da civilização, e como durante todo seu percurso não conseguiu achar sequer um rato para aplacar a fome, pelo jeito teria que se conformar por hora e se focar em achar um abrigo contra a luz do sol.

Deu uma olhada para o bicho que continuava deitado no chão. Pensou em algo para falar, mas incrivelmente nada de interessante lhe viera à mente. Estava prestes a dizer um simples ‘Tchau’, mas assim que abriu a boca, um trovão o fez se calar, fazendo sua ‘querida’ Atlanta dar jus à classificação climática de subtropical úmida.

É, talvez não posse sentir tanta falta assim do seu ‘lar’. Aquelas chuvas eram um pé no saco, mesmo. Talvez fosse melhor viver num lugar mais seco, tipo Nevada. Las Vegas parecia ser um lugar legal... Poderia viver como apostador profissional, quem sabe...

-É, vou para o Oeste. –Comentou, já começando a andar, mas parou ao ouvir a voz cavernosa finalmente dizer-lhe algo.

-O Oeste fica na outra direção.

-Oh, quer dizer que você sabe falar? –O vampiro tentou mesclar cinismo e diversão em sua voz. –E ainda funciona como bússola? Seria minha noite de sorte, se não estivesse chovendo, sendo caçado, faminto e com o sol prestes a surgir, doido para me queimar. –Completou sarcástico, ouvindo um rosnado nada satisfeito em resposta. –Fio mal, campeão... Mas sabe como é, né? Acho que não vai dar tempo de eu chegar em Las Vegas antes do sol nascer... Acho que vou ter que procurar um abrigo até lá, mas valeu pela direção, viu? –Comentou, mais uma vez se afastando.

-Uma pena... Tinha uma caverna a oeste... –O lobisomem comentou jocoso, em um tom que em nada combinava com sua aparência ou com seu timbre naturalmente grave.

-Como você sabe?

-Eu moro aqui. –Respondeu sem olhar para o vampiro.

-E conhece tão bem essas matas que caiu numa armadilha... –Zombou, mas se arrependeu ao notar que não receberia sequer um rosnado como resposta. Olhou mais atentamente para aquela criatura e viu que a expressão dele era muito dolorida. –Okay, volta à forma de lobo.

-Para quê? –Perguntou indiferente.

-Para eu te carregar, oras.

-Como se eu fosse deixar você me carregar... –Respondeu sério, fazendo questão de frisar a palavra ‘você’.

-Como se você tivesse muita escolha... –Comentou, imitando a entonação do outro. –Parece que não tem muita gente aqui para te ajudar.

-Eu não preciso de ajuda.

-Ah, claro que não... -Doce... Doce sarcasmo... –Um cara deitado na lama, debaixo de um temporal e com a perna estraçalhada... Alguém assim definitivamente não precisa de ajuda...

O lobisomem, teimoso como pouco conseguiriam ser num estado tão decadente, tomou uma forma que se encontrava entre a atual e anterior. Algo que tendia para o lado lupino, mas ainda assim bestial demais para ser chamado de lobo. Provavelmente buscava o apoio das outras patas para se locomover.

Levantou e pôs-se a andar manco, quase rastejar na verdade. Aquela pata devia estar doendo horrores, mas diferente do que seu ‘irmãos’ pensavam, um Impuro como ele tinha sim honra. E como nada, nem o ostracismo, nem o abandono de sua matilha ou a rejeição de sua tribo, nada poderia ferir mais a honra de um Garou do que ser carregado, especialmente por uma criatura tão detestável quanto um vampiro, ele tinha que agüentar firme a dor e caminhar com suas próprias forças.

Com um grunhido e um meneio de cabeça, chamou o vampiro para que o seguisse.

Vendo-se sem muitas alternativas, a criatura noturna sentiu-se obrigada a seguir os lentos passos do animal ferido, chegando até a caverna, que na verdade mais parecia um buraco cavado em um barranco.

E de fato era.

-Belo buraco... –Comentou, adentrando o local estreito e desprovido de qualquer coisa.

-Se não lhe agrada, pode ir embora... –Uma voz mais suave que anterior respondera-lhe raivosa. –Eu já te apresentei um abrigo, não tenho mais dívida alguma contido. Se quiser torra lá fora, sinta-se livre para tal. –O hominídeo dizia com indiferença, sem olhar para o seu ‘hospede’. Estava exausto, famintos e machucado demais para se dar ao luxo de ficar ouvindo reclamação.

O vampiro nada disse, ficou apenas observando cuidadosamente o homem que agora era a forma daquela criatura. Apesar do escuro, seus olhos, tão acostumados à noite conseguiam decifrar sem maiores dificuldades cada traço dele.

Parecia ser bem jovem, pela casa dos 20 anos. Mesmo sujo de lama e com algumas cicatrizes pelo rosto e pelos braços, ainda era muito bonito. A pele era bem alva, contrastando com os cabelos castanhos escuros. Os traços fortes e sofridos, unidos ao corpo de músculos bem desenvolvidos garantiam-lhe uma aparência bem máscula e grave, refletindo o que seria também sua personalidade.

Perguntou-se de onde teriam surgido as roupas simples que ele usava agora. Uma camiseta velha e uma calça jeans rasgada, ambas molhadas, sendo que a calça estava também manchada de sangue, o que lembrava o vampiro da sua fome.

E pela cara do lobisomem, aquilo estava doendo mesmo...

-Ei, cara... Levanta aí a calça, deixa eu ver como ta essa perna. –Falou, se aproximando dele.

-Não me toque. –Repreendeu aquele vampiro, segurando com violência a mão que se aproximara.

-Hei cara, deixa de frescura. Pelo que eu vi o negócio ta feio, melhor deixar eu dar uma ajeitada.

-Eu já disse que não preciso da sua ajuda... –Silabou por entre os dentes, raivoso.

-Olha, se você quer morrer com uma infecção, eu aceito... A escolha é toda sua... Mas o fato é que estão me incomodando esse cheiro de sangue e essa sua cara de coitadinho aí, então deixa por favor eu colocar esse osso no lugar e fazer um curativo para ver se estanca a hemorragia?

O lobisomem não respondeu nada, mas também não impediu mais a mão do vampiro, o qual levantou a barra da calça e olhou atentamente para o ferimento.

-Ih cara, isso ta feio mesmo... Mas não te preocupa, que eu ganhei mais de 30 medalhas quando era escoteiro... –Comentou bem humorado, tentando achar algum jeito menos doloroso reencaixar o osso fraturado. –Olha isso vai doer pra caramba, mas como você é um cara muito macho, não vai nem gritar... –Riu um pouco antes de fazer os movimentos firmes e fortes, os quais doeram tanto que o lobisomem quase se sentiu desfalecer, mas ainda assim sequer abriu a boca para reclamar. Apenas seu ofegar desesperado se fazia audível. –Nem doeu, né? –Perguntou cínico, lambendo os dedos sujos de sangue. Aquele sangue era diferente dos que já tinha tomado. Bem mais forte e encorpado, e mais delicioso, talvez.

Viu a cara de desgosto do lobisomem, e deu-se então conta do que fazia.

-Desculpa, cara, força do hábito... É que eu to morrendo de fome... Mas deixa, amanhã eu resolvo isso... Pena que não tem nenhuma atadura para cobrir, minha camisa ta molhada, pode ajudar a infeccionar... Se bem que o que ta precisando é suturar mesmo, só cobrir não ia adiantar muita coisa...

-Tanto faz, amanhã já vai estar melhor... –Falou com dificuldade. A dor fora tanta que ele tinha ficado sem ar.

-Suspeitei mesmo, pelo menos o osso não vai mais calcificar torto… -Comentou já bocejando. O sol devia ter nascido já, e por isso um sono sobrenatural começava a tomar conta do seu corpo. –Sabe, xará? Você é brabo, mas parece ser um cara legal... –O vampiro comentou antes de se ajeitar melhor e cair no sono.

O lobisomem apenas bufou e se ajeitou para dormir também.

Ryoko
Enviado por Ryoko em 09/10/2009
Código do texto: T1857861
Copyright © 2009. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.