CONTO PARA MINHA LOUCURA
 
     Imaginei escrever um conto que falasse da vida, de todas as pessoas, de seus anseios, de seus desejos, de seus sonhos e de seus problemas, mas não consigo imaginar esse conto. Acho que ele não existe que ele não passa de uma utopia de minha parte. Eu poderia falar de animais, objetos, da natureza tão ameaçada hoje, mas somente sobre as pessoas é que me faz pensar. Poderia também falar sobre música, sobre a força que remove montanhas, o amor, mas não consigo! Falar sobre o ser que habita o meu eu, o eu tão desconhecido por mim, que o conheço tão pouco, não o bastante para falar d’ele.

     Falar sobre o perigo, sobre a mentira e a verdade, sobre o doce e o amargo, sobre o mel e o fel que temos que engolir garganta abaixo todos os dias, mas meu apetite é pouco ou quase nenhum. Remexo as gavetas do passado e encontro apenas retratos amarelados pelo tempo, já não guardam nem contam histórias, ficaram esquecidos por uma memória absoleta. O antagonismo do meu pensamento é carrasco a executar minha razão de ser, estúpido verso impresso em livros vazios, que enchem meus olhos de nada. Mas onde estarão as pessoas, quero-as comigo, em meus contos, em meus versos, em meus acordes da melodia suave de teus beijos que nunca bastam.

     Acho que meu conto sobre as pessoas me disse adeus mesmo antes de chegar. Partiu de algum lugar e chegou a lugar nenhum. Nós humanos temos muita dificuldade em delinear nossos projetos de vida. Nós humanos não suportamos a carga de nossos problemas, mas gostamos imensamente das soluções. Nossos anseios são sempre maiores que nossas necessidades, por isso não nos conformamos com o que temos, desejamos sempre mais, e continuamos sempre a desejar mesmo que venhamos a ter tudo que exista. Essa é a nossa sina. Choramos porque sorrimos também, somos o que somos porque merecemos ser o que temos e nada na vida nos fará tão feliz quanto a paz que reina em nosso mais íntimo sentimento, o amor.

     Acho que não conseguirei escrever meu conto, mas acho também que não conseguiria lê-lo se o tivesse feito.
Ricardo Mascarenhas
Enviado por Ricardo Mascarenhas em 03/10/2009
Reeditado em 15/12/2013
Código do texto: T1846499
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