O Discípulo do Silêncio
O jovem chega em silêncio de cabeça baixa para o Mago, demonstrando angústia.
- O que aconteceu ? Pergunta o Mestre.
- Sinto-me frustrado. Por mais que me esforce, não consigo ter uma visão maior do que me cerca. Não consigo conclusões próprias, tudo que sei veio das experiências dos outros. Serei sempre um discípulo, um aprendiz. Não tenho valor. Responde o pupilo.
- E o que pretende fazer ? Pergunta o Mestre.
- Não sei, mas seria capaz de fazer qualquer coisa para mudar isto, quero ser admirado pela minha Sabedoria, dominar o Conhecimento. Responde.
A tarde era fria e o anoitecer se aproximava. O silêncio no antigo Mosteiro chegava a doer nos ouvidos. Mais um pouco seria o horário do jantar, se é que se podia chamar assim uma pequena tigela com uma pobre porção de um mingau ralo de cevada. Estavam numa montanha muito alta, talvez a maior da região, o vento gelado era normal e somente aqueles que ali habitavam há mais tempo conseguiam suporta-lo. Depois da Ceia que nunca resolvia a fome daqueles jovens, eles lavavam e guardavam suas tigelas junto com os outros poucos pertences e dirigiam-se ao salão das orações. Faziam parte da rotina diária e especialmente antes do recolhimento do dia, estas também aconteciam. Era muito duro para aquele jovem, se adaptar aquela vida de disciplina rígida, onde o único lazer era os jogos com os companheiros, nos poucos intervalos de recreação. No mais, eram horas intermináveis de estudos difíceis, trabalho braçal, orações, jejum, peregrinação pelas montanhas ou por dentro de cavernas intermináveis durante dias e dias. Nesta noite, terminadas as orações, o Mestre reconduziu o discípulo até o Refeitório onde lhe apontou uma caneca.
- Beba, vai lhe acalmar. Falou serenamente como já era de costume.
Depois de beber tudo, um chá sem gosto algum, dirigiu-se em silêncio para seus aposentos. Depois das orações não era recomendável muita conversa, de preferência nenhuma. E assim recolheu-se, logo adormecendo. De repente estava num longo corredor cheio de portas dos dois lados, uma ao lado da outra. Deduziu que para saber o que acontecia teria de escolher uma daquelas portas e assim o fez. Para seu espanto saiu num corredor parecido ao anterior, mas muito maior. Ninguém, só portas. Novamente escolheu outra porta e outro corredor ainda maior apareceu. Sentiu medo e quis voltar, mas não sabia como. No Estágio em que estava, como saber qual a porta inicial ? O jeito era avançar. E assim fez repetidas vezes, sem se preocupar com as inúmeras portas e sim com o extenso corredor. Apressou o passo e o corredor acompanhou suas passadas como uma esteira rolante. Diminuiu o ritmo, o corredor também. Começou então a caminhar lentamente e aos poucos foi se acalmando. Aquelas portas agora já não importavam, o corredor era bom e tranqüilo. Se achasse uma porta interessante tudo bem, mas fora isso elas agora ficariam intactas, já não preocupavam. E uma sensação de paz foi lhe invadindo a mente. O ar ficara leve e já começava a gostar daquela caminhada, quando de repente acordou.
Depois das primeiras tarefas matinais, foi ter com o Mestre que o recebeu em silêncio. Não conseguindo se conter e esperar alguma pergunta foi logo falando:
-Tive uma ótima noite, descansei bem. Tive um sonho estranho, mas gostei.
- E sua aflição ? Perguntou o Mestre.
- Passou. Estive pensando e acho que a vida tem que seguir um curso. A velocidade não importa, já que o Tempo é indefinido e incontrolável. E no tempo certo se eu tiver talento descobrirei o que preciso. A pressa pode trabalhar contra meus propósitos. É necessário mais atenção do que velocidade, para que nada passe despercebido. E assim concluindo ficou em silêncio. O Mestre permanecia calado. Até que depois de um breve silêncio, falou baixinho:
-Vá, suas tarefas lhe esperam.
E o jovem saiu devagar, pensando consigo mesmo se aqueles pequenos serviços, dos quais estaria incumbido o dia inteiro, não o estariam preparando para revelações maiores que dependeriam de um raciocínio mais apurado, quando tivesse. -