A LENDA DE KÓRA & ALSVID - parte 6: A chegada a Ofidis

Victor estava sentado em seu trono, ocioso naquele dia nublado e sem graça, quando um soldado que fora levar comida a Kóra trouxe a notícia de que ela não estava mais no quarto.

Imediatamente ele se dirigiu ao quarto, e constatou que de fato, não havia sinal algum de Kóra.

— Eu não mandei que a vigiassem? — esbravejou Victor. — Vocês são na verdade um bando de incopetentes! Será que não conseguem conter nem mesmo uma frágil mulher?

— Mas senhor — disse o capitão —, em nenhum momento meus soldados abandonaram seus postos. Ficaram cada instante guardando a entrada deste quarto, e garanto que pela porta ela não fugiu. Pela janela certamente não fugiria, devido a altura e as grades que foram instaladas na janela; vejo que as barras de ferro estão intactas!

— Então me digam, por onde ela fugiu! — de repente Victor notou entre os lençois da cama da rainha, um pequeno pedaço de papel. Ele leu o bilhete e descobriu como ela fugira. — Descubram quem é esse tal de Alsvid, vão à procura dele!

— Sim senhor — disse o capitão se retirando.

Mais tarde naquele mesmo dia, os soldados da polícia especial voltaram com más notícias. Haviam avistado a princesa junto daquele que provávelmente seria Alsvid, mas não conseguiram capturá-los. Kóra acabara fugindo das terras de Elgartem junto do rapaz, montados nas costas de um enorme dragão.

Victor sabia que em breve, a notícia de que Kóra não estava mais no reino chegaria aos ouvidos dos membros do Conselho Escarlate, e eles lhe tomariam a coroa. Muito sagaz, ele decidiu se antecipar, e distorcer a verdade sobre o que ocorrera.

O prédio que sediava o conselho, ficava do outro lado do rio Tríade. Victor adentrou as gigantescas portas de ferro e entrou numa espécie de saguão, com o piso de azuleijos pretos e brancos intercalados e paredes repletas de inscrições que ele não entendia. Enquanto Victor adimirava a arquitetura do local, nem notou a chegada do lider do conselho.

— O que deseja rei Victor? — perguntou um velho senhor, num tom de certo desgosto em tê-lo ali.

Rapidamente Victor se virou e se reverênciou para o velho.

— Desculpe minha visita inesperada, sr. Norwell, mas é que devo lhe comunicar um acontecimento terrível!

— E o quê seria tão terrível para trazê-lo sem prévio aviso?

— A rainha Kóra foi sequestrada! — disse Victor.

— Sequestrada? — Norwell mostrou-se espantado.

— Sim, um indivíduo entrou no castelo utilizando uma Halfa, e a levou para algum lugar que não sabemos ainda! O nome do sequestrador é Alsvid: ele deixou um bilhete me afrontando!

— Alsvid? — indagou o velho. — Esse rapaz é um membro das tropas de Ofidis, filho de uma antiga sacerdotiza que mora no vilarejo próximo daqui.

Victor não pôde esconder a surpresa, mas logo tratou de dar continuidade a sua mentira.

— Ofidis? — disse Victor. — Ah, agora está claro! Eles decidiram sequestrar a princesa, pois ficaram descontentes com a retirada que eu promovi!

— Mas sabemos todos, que sua medida deixou não só os Ofidianos descontentes... Muitos Elgartenianos também desaprovaram sua medida.

Victor pensou por um instante em brigar com o conselheiro, mas se conteve.

— Veja Norwell, foi apenas uma medida para manter em sigilo os nossos mais profundos segredos militares! E também creio que isso não justificaria que eles sequestrassem Kóra. Afinal, não se dizem nossos fiéis amigos?

— Devemos ter cautela neste momento Victor — disse o velho. — Não sabemos se foi de fato Alsvid quem a levou, e para onde a levou.

— Sim, concordo. Mas acho que preparar nossas tropas, não seria insensato.

— Não, de forma alguma — disse Norwell. — Agora gostaria de dizer que sua coroa será mantida por enquanto. As leis de Elgartem, dizem que o conselho deve tomar conta do reino no caso de evasão de um dos reis; entretanto, se essa saída for involuntária, não podemos retirar a coroa daquele que ficou até que o outro volte, ou até que seja comprovada a morte do rei que evadiu. Se o que diz for verdade, nosso conselho lhe dará todo o apoio e se preciso, mobilizaremos nossas tropas em missão de resgate.

Norwell tinha inúmeras desconfianças em relação a Victor, e a forma com que ele estava governando Elgartem não lhe agradava nem um pouco. Se pudesse, ele com certeza não hesitaria em retirar a coroa de Victor, e em expulsá-lo do reino; no entanto, Norwell tinha que cumprir um bando de regras que eram impostas há muito tempo, pois quando um conselheiro assumia, devia jurar que jamais descumpriria as leis de Elgartem, caso contrário ele próprio teria que ser morto.

O conselheiro desejava do fundo de seu coração, que tudo isso fosse um grande engano. As coisas porém caminharam de uma forma bastante diferente.

Depois de um dia inteiro viajando nas costas daquele dragão, Kóra e Alsvid finalmente adentraram as terras de Ofidis. Lá do alto ela pôde apreciar todas as belezas daquela terra famosa por seus fantásticos guereiros.

Havia dunas de areia que se moviam como se tivessem vida; havia planicíes cobertas pela grama mais verde que Kóra já vira, e campos repletos de grandes árvores milenares. Eles cruzaram por rios e enormes lagos, e um vale onde pequenas poças de água no chão borbulhavam.

— Dali os moradores daquela cidadela retiram a água quente para tomarem banho — disse Alsvid, apontando para uma cidade grande e alegre.

— Isso é fantástico! Não entendo como até hoje eu não havia cogitado em visitar essa nação.

— Pois vou te mostrar então, tudo que há de mais belo em Ofidis! — disse Alsvid sorrindo.

Eles voaram por mais alguns instantes, e então pousaram em uma planície repleta de trevos de quatro folhas. Alsvid apanhou um e prendeu junto ao cabelo de Kóra.

— Isso te trará sorte — disse ele. — Mas agora venha comigo, de pressa.

Rapidamente eles atravessaram uma parte da planicíe e subiram uma leve inclinação; ao chegar ao topo dessa elevação, avistaram a sede do reino de Ofidis.

Kóra ficou de queixo caído com o tamanho do castelo. Ele era construido de pedras de mármore que de tão polidas, refletiam a enorme cidade que se estendia num raio de quilometros ao redor do castelo. As ruas do reino eram cheias de vida, e pavimentadas com pequenos cristais azuis. Acompanhando o trajeto da alameda principal que levava ao castelo, havia vários postes entalhados com figuras que Kóra desconhecia, e no topo de cada um desses postes existia uma grande pedra que parecia ser quartzo bruto.

— No alto desses postes, o quê é Alsvid? — perguntou Kóra.

— São Nubyas — disse ele. — É um tipo de mineral que durante o dia absorve a luz solar, e que durante a noite brilha de forma esplendorosa.

De repente Alsvid parou. Eles estavam diante do palácio do rei Hector e um grupo de guardas os fitavam com cara de poucos amigos.

— Sou Sargento Alsvid da oitava divisão de infantaria do lado sul — disse Alsvid em voz alta, imperioso. — Peço que nos deixem entrar, ou que tragam Sua majestade até aqui.

— O rei está ocupado — disse um dos guardas.

— É urgente — disse Alsvid. — Diga que...

Kóra então o interrompeu e se colocou com imponência diante do guarda.

— Diga que a afilhada dele, a rainha Kóra de Elgartem está aqui — disse ela.

Ao ouvir issu, o guarda a olhou com certo espanto, e então correu para dentro do castelo.

Kóra era de fato, afilhada do rei de Ofidis. Hector e Ottavius eram grandes amigos, e quando Kóra nasceu, Hector foi convidado para ser padrinho da moça. Poucas vezes eles se viram, mas todas elas foram fantásticas, pois Hector era um homem extremamente gentil e educado.

Depois de alguns minutos de espera, o guarda voltou com uma expressão de vergonha.

— Sinto muito rainha, sinto muito sargento — disse ele. — O rei disse para levá-los imediatamente até ele. Me acompanhem.

Acompanhados do guarda, Kóra e Alsvid atravessaram os corredores luxuosos do castelo e chegaram diante de uma grande porta coberta de pedras preciosas. O guarda a abriu e eles entraram em uma sala monumental, com um teto muito alto. Ali estava sentado em seu trono, o rei de Ofidis.

— Estou surpreso com sua visita! — disse o rei se levantando e caminhando até eles. Ele abraçou Kóra.

— Eu preferiria que fosse uma visita — disse Kóra —, mas infelizmente não é.

— O que houve? — indagou o rei.

— Bem, acho que uma conversa particular seria bem vinda.

— Ah, claro — disse o rei olhando para o guarda e Alsvid. — Será que os dois poderiam se retirar?

O guarda se afastou, mas Alsvid permaneceu ali. O rei o encarou:

— Vamos, saia — disse o rei.

— Não padrinho! — exclamou Kóra, percebendo o equívoco. — O sargento Alsvid está comigo, foi ele quem me ajudou, e quero que ele esteja presente durante nossa conversa.

— Ah, me desculpe Kóra, é que pelo uniforme...

Eles se sentaram numa mesa redonda próxima ao trono, e Kóra contou ao rei tudo o que havia acontecido. Hector ficou perplexo.

— Mas isso é um insulto a memória do meu velho amigo! — disse ele com os olhos enrubrecidos. — Por que não retorna a Elgartem e lhe retira o trono?

— Não posso, você sabe padrinho. Só o conselho tem a autonomia de fazer isso, mas somente no caso do abandono do trono ou se eu morresse...

— Não diga isso! — o rei disse.

— Pois então senhor — disse Alsvid —, peço que abrigue Kóra aqui em Ofidis, até que Victor seja deposto pelo conselho.

O rei não hesitou em aceitar:

— Se esse é o único jeito, que assim seja. Pode ficar até que aquele imundo seja retirado de Elgartem. Ficara hospedada aqui no castelo mesmo.

— Eu queria que Alsvid ficasse comigo — pediu Kóra. — Ele tem sido um grande apoio a mim.

O rei pensou por um instante mas permitiu que Alsvid ficasse no castelo.

— Saiba Kóra — disse o rei —, que poderá ficar aqui o tempo que for necessário. Daqui só sairá por vontade própria. Avisarei meus guardas de que temos uma ilustre visita, que ficará por tempo indeterminado. Se precisar de auxílio, é só chamá-los.

Cada um ficou em um quarto, e Kora e Alsvid tiveram uma tranquila noite de sono.

Jean Carlos Bris
Enviado por Jean Carlos Bris em 18/07/2009
Código do texto: T1707040
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