Anjos - EPISÓDIO I: Uma conversa com o Filho
Tantas vezes sentimos o desejo de sermos anjos, e até podemos ser sem nem mesmo sabermos. Se também você já se sentiu assim eu lhe ofereço esta história que já teve um começo e um fim e agora surge mais amadurecida, mais questionadora, ou talvez suas personagens mais questionadas.
Poucos souberam da primeira e talvez ninguém saiba da segunda, mas ela será escrita. Eis a história:
Certo dia à sombra de uma bela árvore sentou-se o Filho do Criador e logo, ao seu redor, amontoaram-se dezenas de pequenos anjos alegres e entusiasmados para contarem suas pequenas aventuras.
Tais anjos ainda não podiam estar tão próximos à terra e esperavam crescer mais um pouco para serem anjos da guarda.
O cenário era alegre e festivo, todos queiram falar, apesar de tanta alegria um pequeno anjo parecia distante, distraído e se podemos dizer um pouco triste, este anjo não participava da conversa e não percebeu o momento em que todos partiram restando apenas ele e o Filho do Criador.
- Parece-me que você hoje está mais sonhadora que o normal - disse uma voz suave.
Constelação virou-se e encontrou um olhar tão suave que lhe penetrou e vasculhou todo o seu coração.
- Não estou sonhando, só relembrando o que eu vi.
- Então me conte o que é.
Ao dizer isso o Filho do Criador abrir seus braços e acolheu a pequena em um abraço forte.
- Para que eu lhe conte preciso ter certeza de que não me castigará.
- Eu já devia saber que você fez alguma arte, pois este seu silêncio não era gratuito, porém você sabe que eu não sou castigador, me conte sem medo.
- Está bem eu vou contar – respirando fundo Constelação se aconchegou mais nos braços de seu Senhor e disse - a minha história começa assim:
- Ontem sai com Menusses e Terezinha, como sempre fomos visitar o Carmelo e algumas almas angustiadas, porém Terezinha não nos deixou chegar muito perto, pois ainda não temos idade suficiente. Mas na volta percebi que Menusses estava entretida conversando sobre a misericórdia e o amor do Pai e que ouvia Terezinha com prazer e entusiasmo. Não que estas conversas me deixem entediadas, mas eu acabei me afastando delas e quando percebi estava muito perto da terra, não fiz de propósito, porém não pude resistir e percebendo que Terezinha e Menusses não haviam notado minha falta aproximei ainda mais. Só que me arrependi, e sabe porque? Vi coisas horríveis, como o homem pode ser tão mal?
- E o que você viu de tão horrível?
- Eu vi muita tristeza, muita dor, muita guerra, crianças sofrendo, mulheres se prostituindo, vi todo tipo de maldade que ainda não havia visto, pois Gabriel não nos deixa passear muito longe dele e sempre nos levou para ver criancinhas com problemas, mas que encontravam amor. Mas ali eu vi os anjos grandes sem fazer nada, eles estavam ao lado do pai que matou o filho ou daquele homem que foi morto sem motivo, ou daquele político corrupto e não faziam nada. Eu me revoltei e fiquei muito brava, comecei a gritar e dizer para eles fazerem alguma coisa, pois tanto ódio e guerra deviam acabar, mas eles permaneciam imóveis sem fazer nada, e o pior é que me mandavam voltar para o céu que ali não era meu lugar. Pois se na terra que sofre não é lugar dos anjos, onde vai ser?
- Tudo tem seu tempo Constelação e você não estava preparada para ver o que viu.
- Foi isso que Terezinha me disse. Mas eu não entendo por que não posso fazer nada, pois os anjos grandes viam e nada faziam.
- O que Menusses diz sobre isso?
- Ela pensa como Terezinha, acredita que fiz errado e que devo acreditar mais no amor, pois tudo tem seu tempo e eu sozinha não posso mudar o mundo, mas se semear o amor terei feito uma grande coisa.
- Menusses também está certa e você precisa entender o que está sentindo. Precisa entender que o que Menusses diz é que sem o amor nada pode ser feito e você sabe disso só precisa colocar dentro de você a certeza de que o amor existe e pode mudar o mundo. Aliás, quem lhe pede de mudar o mundo? Eu nunca exigi isto de você eu só quero que me deixe te amar e que ame com todas as suas forças, sem nenhuma reserva.
- Mas só amar para mim parece pouco, eu me sinto incapaz, pequena, impotente diante de tanta maldade, desejaria mudar tudo. O homem não pode morrer sem motivo, é preciso que a vida seja respeitada. Eu sinto que devo fazer alguma coisa, você me entende?
- Claro que sim Constelação, mas você precisa encontrar a paz, não pode continuar nesta angústia, nesta preocupação. Esteja atenta sim, mas não queira salvar o mundo, deixa que eu salvo, afinal foi para isso que me encarnei.
- Você tem razão eu devo estar mais tranqüila. Prometo ser mais paciente.
O Filho deixou a pequena Constelação sozinha e voltou para junto do Pai. A anjinha dirigiu seu olhar para a terra e tentou ver o amor, mas não conseguia tirar de sua cabeça as coisas tristes que havia visto. Então fez uma oração e sentiu a tranqüilidade encher seu coração.