O acorrentado
I
- Que estado melancólico é esse em que te encontro?
- Ai de mim amigo! Como você pode ver, estou aqui preso, com essas grossas, frias e pesadas correntes.
- Bem as vejo amigo.
- Não consigo me soltar e mal posso me mexer.
- Hum! É mesmo.
- Sinto-me o grande Prometeu acorrentado.
- Ó! Grande poeta, você exagera.
- Como assim? Estás a rir de mim, pobre desgraçado que estou com essas mortíferas amarras. Você não imagina como é imensa a minha Dor, Gilfred.
- Não creio! Não vejo peso nenhum sobre seus ombros, ou por acaso carregas o mundo nas costas?
- Não sei! O que você sabe de mim, afinal? Por favor, me diga.
- Sim, direi. Mas serei breve, pois não temos tempo a perder.
- Por favor, então me diga.
- Serei franco. Você é um pássaro livre, cujo pensamento pode atingir o infinito do céu.
- Não sei, acho que não sou tudo isso, ainda mais assim neste estado em que me encontro.
- Quer uma prova concreta disto que acabei de dizer sobre você?
- Sim, mostre-me, por favor.
- Está na sua frente, ao seu lado, dentro e fora de ti.
- Ih! Complicou, falas por meio de enigmas, como posso entender?
- Você não é néscio.
- Mas é óbvio que não sou.
- Certo, então me diga, o que é que te move?
- Pergunta difícil.
- Não! Não é, é mais fácil do que você imagina. Pense um pouco mais. O que te move?
- Certo, deixe-me pensar...Hum, mas é claro, o que me move é a imaginação.
- Isso mesmo, achou a resposta.
- Sim Gilfred, eu tenho Imaginação, o maior presente dos deuses.
- Concordo.
- E graças a Imaginação, faço poesias e crio aventuras. Com ela, sou Deus, sou tudo, tudo. Alcanço o infinito, nada me atinge nesse estado divino e, sim, a Imaginação é a arma que os deuses me deram para sobreviver nesse mundo.
- Agora você enxerga?
- O quê?
- As correntes não te prendem mais.
- Como não? Ainda estão aqui a me prender.
- Então, olhe atentamente a sua volta.
- Nossa! Você tem mesmo razão.
- Sei que tenho, sempre tenho.
- Livrei-me mesmo das correntes indestrutíveis de Vulcano.
- Essa corrente não é tão poderosa quanto você pensa, pegue-a.
- Nossa! Mais leve que papel.
- Você viu como o seu mundo engana?
- Verdade, amigo, eu pensava que essas correntes eram indestrutíveis, e o cruel Algoz ria de mim dizendo que eu jamais voltaria a ser livre. Mas agora dou risada dele, pois ele é quem está preso nessa corrente.
- Vamos sair desta prisão de uma vez por todas.
II
- O que você vê agora, poeta livre?
- Vejo um Mundo sem forma.
- Achei sua resposta muito simples. Tem mesmo certeza disso?
- Não! Porque olhando com mais atenção, posso ver também fogo, ou melhor, espirais flamejantes que começam a derreter uma imensa camada de gelo.
- E o que mais?
- O líquido derretido começa a tomar forma lentamente, aparecendo dele o céu azul, as árvores, os animais, fadas. E, agora, diante de mim, vejo um cavalo alado.
- Monte nele e voe.
-Sim, é isso mesmo o que farei...........................................................................................
- E, o que você vê daí de cima?
- Vejo uma planície, montanhas, florestas, cachoeiras, rios, mares, o sol, a lua, as estrelas. Posso ver todo o universo daqui de cima, tudo mesmo, e mais adiante vejo castelos, milhares deles, clareiras e fadas que dançam com maestria e leveza.
- É, meu mundo é infinito mesmo.
- Sem dúvida, ele é ao mesmo tempo pequeno e imenso. Não há fronteiras. O vôo é suave, não há pressão e tudo aqui cheira a liberdade.
- Vem, desça agora amigo e vamos à minha casa, tomar um chá, o mais delicioso chá da Terra das Fadas...