Bárbaros (parte 2)
A grama roçava nas pernas do comandante guiado por um vento forte, enquanto ele observava os mensageiros se afastarem para o interior do continente provavelmente em direção a algum lugar seguro, para voltarem apenas quando o reforço comparecesse.
Sua mente dizia para fazer os homens fugirem rapidamente dali, mas isso feriria completamente seu orgulho. Levara três dias para conseguir encurralar os bárbaros dentro de suas muralhas, era só uma questão de tempo para o aríete derrubar o portão de madeira e deixar seus soldados realizarem o massacre sangrento que tanto desejavam.
Três navios, ele imaginou as velas escuras encanando o forte vento e ganhando impulso e velocidade, logo estariam na baia e ele estaria perdido.
Os três homens que ele capturara nada revelaram sobre a origem daquele povo sem escrúpulos, mesmo sob tortura - que fora a diversão dos soldados durante a noite anterior - assim, eles continuavam sem saber o que esperar dos que viriam a seguir.
Dois generais se aproximaram, um de cada lado dele, o movimento dos passos denunciou que não vinham de longe, eles haviam escutado a conversa toda.
- O que faremos? Qual será sua ordem? - perguntou temeroso o homem, seus cabelos louros desciam trançados por baixo do elmo de ferro, enquanto a barba espessa suja ocultava a maior parte de suas feições.
Luck limitou-se a contemplar o horizonte. Não longe dali, as águas enfurecidas pelo vento batiam contra a rocha, o mar estava agitado, mas isso não trazia nada a seu favor, muito pelo contrário, ele precisava decidir o que fazer depressa.
Os homens esperaram uma resposta, porém ela não veio, lançaram olhares duvidosos um ao outro. O louro fez um sinal encorajando o outro a falar.
- Não sei o que você pensa que está fazendo Luck! Nos conhecemos a anos, e eu nunca pensaria que você seria capaz de sacrificar a vida de dezenas de soldados, amigos seus, até familiares, pra quê? Por nada! Não derrotaremos três navios cheios de corsários e piratas e guerreiros que ninguém sabe de onde vêm, nem com que objetivo! - ele acabou esbravejando, as palavras sairam lentas, arrastadas pelo sotaque carregado, mas também altas para que os soldados ao redor ouvissem, o que era seu objetivo desde o início.
O tumulto foi instaurado, as faces pálidas e assombradas dos soldados que sem notar começavam a recuar lentamente demonstrava o quanto a situação era inesperada.
- Ninguém se mexe! - ordenou ferozmente Luck - e vocês terminem logo essa droga de trabalho! - ele gritou com os homens que manuseavam o aríete.
As botas de ferro desenharam um círculo perfeito no solo quando Luck girou o corpo pesado encarando primeiramente um e depois o outro general. Haviam sido colegas por anos, companheiros em incontáveis batalhas, mas ele nunca pensara que o desrespeitariam assim na frente de todo seu exército, era ultrajante!
Tudo que ele prezava, o motivo que o levava a ficar ali e não declarar a fuga rapidamente era seu orgulho, e agora ele fora ferido da pior maneira possível, por quem ele menos esperava.
Os soldados estavam pálidos, a demanda que os levara a sair de casa era fácil, assim que derrubassem o portão a vitória estaria garantida, e eles se deleitariam com as mulheres, a carne e o vinho que os bárbaros saquearam das vilas próximas.
Mas agora, tudo havia mudado. A reviravolta nos acontecimentos era uma sentença de morte certa mas, sair correndo dali também o seria. Desertar de um exército em campo de batalha era a pior ofensa que alguém poderia fazer ao rei, e seu castigo era a decapitação em praça pública.
Os segundos passavam, o vento soprava mais forte, uma bandeira voou do interior das muralhas caindo aos pés do comandante. Ele abaixou os olhos para o símbolo gravado na bandeira negra. Uma caveira preenchida por jóias colocada dentro de uma taça de sangue.
- Repugnante - ele disse enquanto pegava a bandeira e jogava-a numa fogueira próxima. O tecido ardeu em chamas e se queimou rapidamente.
O barulho do aríete batendo inutilmente contra o portão e o som do mar revoltado eram os únicos sons audíveis. A respiração pesada de Luck foi cortada quando ele cuspiu ao chão, jogando junto com a saliva toda a dignidade que lhe restava.
- Juntem tudo! Rápido! Temos que estar longe daqui antes que aqueles patifes apareçam! Mas, que fique bem claro, assim que chegarem reforços, voltaremos para arrancar pescoços e banhar esse lugar imundo com o sangue quente deles!