Raiava o dia na vila de Opreh quando a carroça atravessou a poeirenta trilha entre os casebres. Poucos aldeões viram a carroça colorida, ornada com fitas, bandeiras e pequenas estátuas de madeira pintada, sacolejar até a pequena praça. Quando enfim parou, com um chiado áspero de madeira ressequida, o seu condutor, um homem jovem, vestido em uma túnica vermelha, com bordas azuis salpicadas de pequenas estrelas brancas, saltou ágil da boléia, sacudiu a poeira das vestes, olhando para os rostos curiosos que o fitavam.
 
Com um riso alegre, dirigiu-se até um idoso sentado em uma cadeira de braços e perguntou:
 
‘Meu bom senhor! Aqui é a vila de Opreh?’.
 
O homem mediu-o com olhos remelentos e cansados. Assentiu, estendendo, como confirmação uma mão magra e trêmula, abarcando toda a extensão à volta. O jovem bateu as mãos, feliz, como se aplaudindo e disse:
 
‘Sim! Enfim cheguei! Minha caravana traz boas novas’ – o velho não se mexeu, olhando atento para as estrelas na túnica do viajante – ‘Diga-me, bom senhor, aqui vive uma moça chamada Carliah?’.
 
O velho não disse nada. Mas uma mulher se aproximou com um cesto com pães frescos, dizendo:
 
‘Sim. Como a conhece?’
 
O homem notou o tom de desconfiança e hostilidade na voz firme da mulher. Voltou-se para ela e de dentro de uma das largas mangas da túnica, retirou um pergaminho enrolado em uma fita cor de rosa.
 
‘Trago para a jovem Carliah um mapa. Enviou-lhe tal presente um homem sábio, Morthikar.’
 
A mulher empalideceu e por pouco não deixou cair sob o chão empoeirado a cesta de pães. Piscando os olhos pequenos, ela exclamou surpresa e indignada:
 
‘Morthikar é o pai de Carliah. Muitos anos se passaram desde que ele se foi de Opreh. Ele a abandonou quando ela era ainda uma criança!’.
 
O homem negou com a cabeça, agitando o pergaminho como se conduzindo uma banda de músicos.
 
‘Não, minha boa mulher. Ele só cumpriu uma missão. Assim como todos nós. Veja a senhora. Agora mesmo traz nesta cesta belos e apetitosos pães. Está por certo os levando para alguém... ’.
 
‘Para minha neta. ’ – confirmou a mulher, olhando rapidamente para os pães, como se temesse tivessem eles sumido.
 
‘Eis a sua missão. Daqui a pouco, outra missão a aguarda. E a mim também. Por enquanto, devo entregar este mapa a jovem Carliah.’.
 
O velho olhou-os com apreciação no olhar cansado e acenou com a cabeça de cabelos encanecidos, um sorriso doce nos lábios finos e crestados.
 
A mulher conduziu o jovem até Carliah. Ela já estava trabalhando, lavando roupas para as poucas famílias abastadas de Opreh. O jovem, ao vê-la, abraçou-a afetuoso, descerrou a fita cor de rosa, entregando-a a Carliah e explicou:
 
‘Minha jovem, seu pai, o respeitável senhor Morthikhar pediu-me para achá-la e entregar-lhe este mapa, que durante anos ele confeccionou. Você deve seguir todas as instruções e registros nele contidos. Se assim o fizer, sua vida seguirá em uma rota de felicidade e êxito. Ah! E ele também lhe envia suas benções e seu amor. ’.
 
A moça recolheu o mapa, espantada. Olhou-o com olhos azuis muito abertos, de uma beleza doce e tranqüila. O homem fez uma mesura e sem dizer mais nada voltou até sua carroça.
 
Ao chegar á carroça, o velho que continuava sentado no mesmo lugar, indagou:
 
‘Entregou a ela o mapa?’.
 
O homem assentiu. O velho ergueu-se da cadeira, subiu ágil na boleia, tomou nas mãos as rédeas dos cavalos e disse antes de seguir:
 
‘Esta cadeira é sua. Cuide bem de Carliah. E não se esqueça: Você é o primeiro registro naquele mapa. ’.
 
A carroça partiu sacolejante e levantando uma poeira fina e amarela. O jovem sentou-se na cadeira, estendendo languidamente as pernas. Agora era só esperar que ela começasse a entender o mapa. Ele não tinha pressa. Sorriu embevecido pela rara beleza daqueles doces olhos azuis.