O Retorno do Dragão de Trevaterra. Parte I
Chovia torrencialmente. e dentro dela, havia chovido também. Podia sentir. Sentia o ressonar dos sonhos dele em sua nuca. Se era um Rei, por que ressonava assim como um menininho aconchegado ao seio da mãe?
Levantou cuidadosamente. Estava despida por completo. De qualquer coisa. Não havia nem medo, nem rancor, pois o Rei de Lugar nenhum estava alí apenas de corpo. Não poderia lhe causar mal algum. Despida estava também das anáguas e até do corpinho. Foi até a janela. Sentia sobre os seios o vento fresco e os respingos que batiam no parapeito de ébano. Ficava arrepiada, e aquilo lhe causava certo prazer. Olhou-se. Não no espelho, pois não havia um na torre. Apenas olhou para baixo. Aqueles seios agora arrepiados não eram mais os da Princesa que recém havia aprendido o que era um homem. Eram os da Rainha que havia alimentado com o colostro deles um casal de principizinhos. Seu ventre não era meia ovalado e liso, e podia sentir com as mãos: sua face não era tão firme quanto queria. Mas aquele arrepio também lembrava outra coisa. Que um dragão a havia tocado. ao mesmo tempo que as mãos geladas e escamosas causavam-lhe a mesma sensação da chuva e do vento, o hálito febril passeava livremente pelos seus lábios. Mas nada daquilo era como o que os outros camponeses e até mesmo seu nobre esposo haviam feito. O Dragão de Trevaterra era todo espera. Quando acariciava, esperava até o momento em que ela se rendesse aos prazeres daquele momento. Nunca afrouxara seu cinturão, sem antes sentir em seu olhar a certeza de que assim ela queria. E assim era a comunicação entre os dois: Ele sabia o que significava cada olhar, cada gesto dela.
Parte dos contos "A grande história do grande amor que não aconteceu entre a Princesa de Lugarnenhum e o Dragão de Trevaterra" e "Lugarnenhum", que se, lidos nesta ordem, farão sentido...