Lix-Lux
LIX-LUX
A cidade das flores de papel
10 de abril de 1991 8:30 da manhã
Roulfgänger Silva passeia sempre por determinada rua de uma certa cidadezinha. A cidadezinha chama-se Do Lixo e do Luxo, ou LIX-LUX. Vamos também abreviar o nome de nosso herói e chame-mo-lo de ROSI.
ROSI está na tal rua e, olhando para o lixo no chão entende que deva ser esta a razão de a cidade ter esse nome.
- Sim, diz ele baixinho, olha só essa rua: cheia de árvores pequenas e floridas. Que tanta beleza, hein? Mas, ao mesmo tempo, veja só no chão das pedras: carteiras de cigarro amassadas, tocos de cigarro, papeis de chocolate, tampinhas de garrafas, canudinhos de plástico, copos de plástico, sacos de tudo que é coisa, folhas de jornais, latas de cerveja, papeis, papeis, papeis......que é isso? Lixo, não? E que há ao lado disso? Luxo, não? Claro, não são um luxo as flores? Claro! Há algo mais luxuoso do que flores? Pode, digam pode haver algo mais luxuoso? Não respondam! Não quero ouvir negativas! Isso é assunto encerrado! Flores são o verdadeiro luxo! Flores são a elegância! A grande elegância...
Bem, bem, e que temos aqui no chão? O lixo. É, acertou quem deu o nome pra esse vilarejo: lixo e luxo. Sim, ta certo.
Agora podemos analisar esse desesperado amor de Roullfgänger Silva pelas flores. Não será por acaso por ele ter um nome que lembra uma flor? Bem, deixemos ROSI andar pela rua em meio as suas flores e lixos.
-Pois então, se esse lixo todo ta aqui no chão, deve ter um sentido, hummmm...bom, talvez todo esse lixo perto das flores...talvez dê uma visão melhor de como as flores são bonitas, luxuosas. È , talvez na comparação, as flores tenham mais valorização ainda do que já tem.
- Então para de pisar em mim, grilo, senão como posso ser comparado à essas tais?
- Que?!
- É isso, tire esse sapatão de cima de mim!
Rosi olha pro chão, levanta o pé e vê uma carteira de cigarro sujinha.
- Você!? Foi você quem falou?!
- Sim, diz displicente, fui eu, por que?
- Bom, por nada...
ROSI observa a talzinha, Recupera-se do susto e pergunta:
- E qual é seu nome?
- Nome? Sei la! Me puseram uma marca em cima das costas. Nunca pude ler se sabe ler, leia ai!
- Bem, ta meio apagado, não sei se...
- É, foram as ultimas chuvas, primeiro perdi o plasticozinho protetor, depois comecei a desbotar, ah, essa ‘vidinha burra....’
- Olha, parece que ta escrito ELMO.
- ELMO?! Ma che ridicolo! Que coisa meus amigos de rua me chamam de cacchea.
- Kátia?
- Não, pisador! Pronuncie CAT-TCHIA!
- ah, sim. Mas que nome esquisito.
- Também acho.
- E quer dizer alguma coisa esse nome?
- Claro! Como é que um nome não quer dizer algo?? O meu quer dizer CArteira de Cigarros CHEia de Aspirações.
- É mesmo? E quais são suas aspirações, CACCHEA?
CACCHEA fica pensativa, ate mesmo muda a expressão de seu rosto(que esta exatamente onde tem a figura de um elmo desenhada no maço) . Torna-se triste.
- Ah, amigo eu desejava tanto ter dito outro destino, lá na fábrica de celulose. Veja só, apenas por azar fui classificada para outro setor e acabei virando ‘issaqui’! Ah... se tivesse sido diferente..pense bem, eu poderia estar fazendo parte de um livro. Eu poderia estar naquele livro tão lindo, cheio de flores. As pessoas iriam pegar-me na mão, iriam ler os sinais gravados em minha pele e iam sentir-s tão bem. No entanto...
ROSI não tava interessado no papo, mas quando CACCHEA falou em flores, ah! Ai era a terra dele!
-Cê disse ‘livro de flores’? Que livro é esse, CACCHEA?
Essa perguntinha faz CACCHEA voltar das recordações (o que não foi vivenciado, pode ser recordado?). fica furiosa, vendo que ROSI não conhece o tal livro.
- Que que é??! Ce não conhece ALAMEDA??
- ALAMEDA? Não, não conheço.Fala de flores, esse livro?
- Se fala de flores??! ‘Ma che robe! Te sei próprio u´gnoco!”
- Ta, ta! Mas me fale de ALAMEDA Fale!!
- Falar de ALAMEDA?!! Que nada! ALAMEDA não é pra ser falada, é pra ser lida!!! Leia, seu parvo!! E não quero mais papo ‘cuma’ pessoa que não conhece ALAMEDA! Fora!
- Mas...
- “Niente! Via via!”
ROSI vai caminhando pela ruazinha, Procura desviar/não pisar nos restos de coisas. Pensativo, imagina o que não diriam a ele uma tampinha de garrafa de cerveja ou um plástico qualquer. Que aspirações não deveriam ter.
- Bem, bem, terei que procurar essa ALAMEDA, Terei que lê-la...
Desvia de uma latinha de cerveja e segue para a rua da biblioteca publica.
Quando terminha a leitura, vai para a praça de LIX-LUX. Senta e murmura-se:
- Ora, ora. Eu, um Lix-Luxiano, grande entendido/apreciador/cultivador/protetor de flores, desconhecia essas flores de papel, vejam só. Bem, como diz CACCHEA?
“Se casca em terra, mágari, se ampara cal´cosa. Alora, avanti!”
ALAMEDA: livro de Astrid Cabral
Do dialeto italiano falado em Garibaldi-
Má che robe: mas que coisa
Te sei próprio u´gnoco: tu é mesmo um tolo
Niente! Via via!: Nada! fora, fora.
Se casca em terra, mágari, se ampara cal´cosa. Alora, avanti: cai-se no chão, porem aprende-se algo. Então, pra frente.