Uma linda história
Andera... Uma linda floresta.
Aqui existem resquícios de um passado longínquo. Passado que vai bem longe...
Há muito não vinha para esses lados. Tudo aqui me lembra os anos que já se foram; e que com certeza, jamais tornarão ao voltar.
Nesta floresta aconteceu o que muitos achavam impossível de acontecer. Um COLIBRI apaixonar-se por uma PEDRA. É muito estranho, na verdade, mas é acontecido.
Um colibri cheio de vida em si. Com movimentos diversos; para trás, para frente, para os lados, para cima, para baixo... com muito apetite pela vida, sugava o néctar das flores aqui, ali, acolá... um colibri sedento.
Uma pedra fria, imóvel... enterrada ao chão, hoje muito duro, mas que num certo dia foi de terra fofa e macia... uma pedra acomodada, descansada, estacionada no local onde parou; sim, porque nem sempre esteve ali... rolou do alto da montanha ali em frente e, neste local se alojou.
Uma pedra parada... como na espera, aceitando o imposto. Uma pedra sem vida... talvez por ter rolado desde lá de cima, tenha batido fortemente com um de seus órgãos vitais. Provavelmente, assim se explica a fresta que tem bem em cima e também o minar inesgotável de sua pequenina fonte.
Como era seu costume, o colibri voava daqui para ali e de lá para cá procurando néctar nas flores; mas algo saíra errado desta vez. Algumas flores estavam fechadas; e as que estavam abertas, sem néctar. Mas, como sempre lutador, o colibri insistia em sua busca. Até que exausto pousou para descansar um pouco... estava meio morto.
Ela, como sempre, ali estava. Impassível, alheia a tudo o que acontecia... imóvel e fria. Desta vez, servindo de abrigo ao colibri exausto, e com seu filete inextinguível umedeceu as patinhas do pequenino emplumado, fazendo subir-lhe um friozinho até o alto de seu corpo quase desfalecido...
Esforçando-se bastante o pequenino alado para conseguir levar sua língua até a fenda da rocha para sugar, daquela quase ínfima fonte, o necessário para manter-se vivo... era um líquido fresco e doce... muito diferente do já experimentado até então... alimentou-se o pequeno colibri do mais puro néctar.
Entretanto, em sua inocência animal não percebeu que além de ter sua vida devolvida, proporcionou à pedra momentos de prazer nunca antes vividos... agora, ela entendeu a beleza que é ter a vida para dar-se à vida.
Foi amor à primeira vista! Ambos estavam, praticamente, sem vida em si mesmos... ele pelo cansaço de lutar pela vida e ela pelo cansaço de aceitar o descaso de sua vida. Ela dá-lhe vida, revitalizando suas forças através de sua fonte inesgotável; ele concede a oportunidade para que ela sinta-se útil e desejada... amada e pretendida... uma busca pela vida.
Assim passaram-se os anos. A cada manhã, e à tarde também, ele vinha vê-la... vinha sorver e proporcionar momentos de alegria e prazer.
Porém, num dia terrível, ao som da floresta misturaram-se outros sons... eram ruídos estranhos e vozes diferentes... eram ruídos de máquinas e rufar de motores mesclados às vozes que ordenavam a derrubada. A mudança que se fez...
A pedra não pode ser guinchada e nem retirada pelas máquinas... era muito grande; contudo, precisava dar lugar à estrada que serpentearia por ali em breve... um veredicto veemente: Vamos explodir a pedra! Furaram-na... e enquanto pelos orifícios emanava um apelo lacrimoso como a dizer: “Deixem-me aqui! Não me tirem daqui! Por favor...”, aqueles buracos eram tapados com dinamites, como falsos curativos...
Foi disparada a espoleta, justo na hora em que surgiu o colibri, que sem saber o que acontecia aproximou-se para sua visita diária... cheio de amor e desejoso de prazer... foi um tremendo estrondo.
Da pedra, restaram apenas destroços... pequenos pedaços de rocha que foram lançados no riacho próximo... do colibri, porém, nada se sabe... jamais se saberá com certeza... se morreu com a explosão, ou se morreu de paixão... não se sabe.
Há quem diga que apenas sumiu... o certo é que por aqui, nunca mais voou o colibri.
Andera! Que linda aquela floresta! Lembra-me dos anos de minha paixão.
08/07/98