O País do Espantalho
ELIZABETH ENTROU NO CLOSET DA mãe sem acender nenhuma lâmpada. Não queria que os meninos vissem a luz acesa pela fresta da porta e descobrissem que ela estava escondida ali. Não se importou muito com a escuridão: valia tudo para não ser encontrada e ganhar de uma vez por todas aquela partida de esconde-esconde.
A menina não era acostumada a entrar naquele grandioso armário – até porque a mãe odiava que qualquer um mexesse em suas roupas ou mudasse sua meticulosa arrumação –, mas aquela era uma ocasião especial. O sol estava se pondo e os ventos frios e implacáveis do Kansas pressagiavam uma tempestade, o que significava que a brincadeira não duraria por muito mais tempo, tanto por estar escurecendo quanto pelos estrondos dos trovões estarem cada vez mais altos. A menina, então, decidiu instalar-se no único local onde os meninos nunca a achariam. Poderiam passar o resto da vida procurando, e ainda assim nunca pensariam em fuçar por aquelas bandas.
Estava sozinha, sentindo uma brisa gélida vinda de não sabia onde. Tentando se proteger do frio, a menina avançou armário adentro, indo parar perto das prateleiras de sapatos que a mãe arrumava meticulosamente: botas em cima, sapatos ao meio e tênis embaixo. Elizabeth se viu cercada de uma infinidade de calçados – alguns nunca usados, ela presumiu.
De todos, um chamou a atenção da menina. Era um pouco diferente dos outros, e sem dúvida o mais bonito dali: um par de sapatos prateados, colocados bem ao centro da prateleira, como se fossem peças muito caras e importantes expostas em um museu. Os sapatinhos – inhos, pois eram os menores de todos – brilhavam, como se deles emanasse algum tipo de luz própria.
Já despreocupada com o frio ou com os meninos, Elizabeth pegou o par de sapatinhos, maravilhada. Nunca vira nada como aquilo em toda sua breve vida: os calçados eram completamente lisos e escovados, sem nenhum tipo de arranhão, e, ao tocá-lo, Elizabeth percebeu que eram feitos de metal! Não apenas pintados com tinta prateada, mas realmente de prata! Nenhuma das melhores sapatarias do mundo tinha alguma coisa parecida com aquilo, era um modelo único!
Depois da admiração veio o impulso de colocá-los nos pés e ver se eram confortáveis. Não iria haver problema, foi o que ela pensou, ao constatar que os sapatos eram pequenos demais para entrarem nos pezões da mãe. Então, sem cerimônias para ao menos limpar os pés, Elizabeth colocou-os.
Couberam-lhe perfeitamente bem, como se houvessem sido criados especialmente para aquele par de pés pequenos e sujos. A menina bateu os calcanhares, rindo ao ouvir o barulho que os sapatos faziam. Pareciam dois pratos de uma bateria chocando-se. Bateu mais duas vezes, rindo a cada vez que o fazia, chegando mesmo a gargalhar, como se aquilo fosse uma piada um tanto quanto engraçada e descontraída.
Pensou ter rido alto demais, e, quando lembrou que ainda estava escondida, colocou as duas mãos na boca, censurando-se. A essa altura, no entanto, já era tarde demais.
Viu, pelas frestas da porta, que alguém acendera a luz do quarto da mãe.
- Vocês ouviram? – ela pode escutar um dos meninos dizer. – Acho que ouvi alguma coisa.
Estavam andando a passos lentos e leves, certificando-se de fazer o mínimo de barulho possível para tentarem surpreender a menina.
Elizabeth, pensando já ter perdido a brincadeira, sussurrou para si mesmo, baixo demais para qualquer outra pessoa ouvir.
- Só queria ir para algum lugar onde eles não pudessem me encontrar.
Ao término da frase, a menina sentiu que a brisa tornara-se mais potente. Além de vir dos lados, agora também vinha de cima e de baixo, fazendo seu vestido esvoaçar em todas as direções. O burburinho dos meninos do lado de fora perdera força ante ao sopro do vento, cada vez mais forte e frio.
O armário tremeu todo, como se estivesse voando para algum lugar distante. Os sapatos meticulosamente arrumados no armário caíram para todos os lados, bem como as toalhas, os vestidos e todo o resto de roupas penduradas nos cabides de metal.
Quando Elizabeth conseguiu se equilibrar, segurar a maçaneta e abri-la, espantou-se ao perceber que não estava mais no quarto da mãe, e sim em um lugar completamente desconhecido.
AS COLINAS VERDES ESTENDIAM-SE ATÉ onde a vista não podia alcançar, e o céu, muito azul e repleto de nuvens de algodão doce, era completamente diferente do escuro crepúsculo do Kansas. Elizabeth coçou a cabeça, a princípio assustada, depois maravilhada. Nunca vira nada tão belo como aquilo!
Ao seu redor, inúmeras flores de todas as cores nasciam e disputavam lugar no grande tapete de grama que cobria praticamente todo o lugar. Ela pode ver, mais ao longe, um tipo de estrada que cortava todo o lugar, estendendo-se até além das colinas. A estrada era feita de tijolos estranhamente amarelados: não um amarelo reluzente, mas um amarelo palha e apagado.
A menina deu um passo, sem ousar tirar os sapatos dos pés. Não sabia o porquê, mas sabia, em seu íntimo, que os tais sapatinhos tinham sua parcela de culpa por aquela estranha viagem.
- Pelas palhas do Espantalho, ela tem os sapatos de prata! – exclamou uma voz esganiçada, assim que Elizabeth pisou nos tijolos amarelos da grandiosa estrada.
- Quem disse isso? – ela perguntou, rodando sobre o próprio eixo e tentando encontrar a origem da voz.
Olhou para baixo, encontrando-a logo: vinha de uma mulher pequena, com não mais de um metro e vinte. O rosto, contorcido em espantada surpresa, era velho e enrugado, com a pele caindo sobre os olhinhos pequenos e fechados. Os cabelos eram presos em um coque bem feito e a mulherzinha trajava um vestido de flanela respingado de gordura.
- Pode me dizer aonde estou? – perguntou Elizabeth, tentando ser o mais polida possível.
- Então as histórias que Boq contava são reais! – exclamou a velhinha, ajoelhando-se e enfiando o rosto no chão em uma reverência exagerada. – Salve, Santa Dorothy. Por sua santidade, perdoe minha surpresa, senhora, mas nunca acreditei que algum dia houvesse existido nem tampouco que iria voltar!
- Mas do que está falando? – perguntou Elizabeth, confusa. – Deve estar me confundindo! Dorothy é o nome da minha mãe!
- Mas... – a anãzinha pegou-se de boca aberta. – Os sapatos, os cabelos castanhos, o vestido. Como não pode ser Santa Dorothy?
- Esses sapatos são da minha mãe, senhora! Estavam dentro do armário dela, e eu estava escondida dos meninos lá. Eu os calcei, então falei que queria estar em algum lugar onde os meninos não pudessem me encontrar, e aqui estou!
- Mas a senhora está com os sapatos de prata da Bruxa do Leste! – disse a outra, pouco ouvindo o discurso confuso de Elizabeth.
- Esses sapatos não são de nenhuma bruxa, minha senhora! – exclamou Elizabeth, profundamente ofendida. – São de minha mãe e de mais ninguém!
- Se a senhora é mesmo a filha de Santa Dorothy, então deveria saber sobre a história dela em Oz! Como pode não conhecer a história de sua própria mãe?
- Ela... nunca me contou sobre nada. Então quer dizer que esse lugar se chama Oz?
- Exatamente. O Grande Reino de Oz, governado pelo sábio e bondoso Espantalho.
- Um lugar governado por um Espantalho? – ela perguntou, intrigada. – Como isso aconteceu?
- Pela juba do Leão, a senhora realmente não sabe de nada sobre Oz! – disse a anãzinha, coçando a cabeça impecavelmente penteada. – Venha, vamos até minha casa, não fica muito longe. Vou lhe preparar algumas torradas e lhe contar sobre tudo que a senhora precisa saber!
- A SENHORA ESTÁ DIZENDO QUE minha mãe ajudou um Leão, um Homem de Lata e um Espantalho, fez um Mágico voltar para sua casa e derreteu uma Bruxa jogando água nela? E nunca me contou sobre isso?
- Ora, se ela contou ou não isso não me diz respeito... – disse a anã, bebericando em sua xícara de chá. Elizabeth percebeu que a xícara tinha olhos, nariz e boca, mas não comentou a respeito. – Eu sei o que as pessoas e os livros me contaram.
- Minha mãe tem livros falando sobre ela?
- Claro que tem! Ela é parte da história de Oz, minha senhora! Depois de Santa Dorothy, tudo mudou!
- Para melhor, não é mesmo?
A anã olhou para os lados, receosa de que pudesse estar sendo ouvida.
- Não posso dizer que para melhor, minha senhora. – ela sussurrou, aproximando o rosto do de Elizabeth. – Vê essa xícara? Pois então: na época do Mágico, elas eram livres e tinham um país só para elas. O País das Porcelanas, assim era chamado. Mas o Espantalho, com toda sua inteligência, disse que Porcelanas eram burras demais e nunca conseguiriam administrar um país por conta própria. Ele mandou invadir o país e escravizou todas as Porcelanas, colocando-as nas prateleiras das lojas e fazendo as pessoas serem obrigadas a comprá-las. Quem não tiver essas porcelanas não tem onde beber seu chá!
- Mas que coisa horrível! – a garota exclamou, largando a xícara sobre a mesa. – E quanto ao resto das coisas?
- Oh, minha querida, as coisas mudaram muito, muito mesmo! Quando era pequena, ouvia histórias do meu avô, o grande Boq, que estava aqui quando Dorothy apareceu (e eu pensando que as histórias que ele contava eram lorotas para dormir!). Ele dizia que a Estrada que corta Oz era toda feita de tijolos amarelinhos e brilhantes como ouro reluzente, e que a Cidade de Palha era toda verde, feita completamente de Esmeraldas! As pessoas tinham até mesmo que usar óculos escuros, tamanha a claridade da cidade. Se não usassem, elas ficavam cegas com tanta luz!
- E por que as coisas mudaram tanto?
- Ah, minha senhora, depois que o Espantalho virou o governante, as coisas foram de mal a pior. No começo, achávamos que ele era uma boa escolha, afinal, tinha um cérebro privilegiado, com idéias magníficas que sempre eram boas. Mas toda a inteligência subiu-lhe a cabeça. E como foi triste! Ele despediu todos os seus acessores, dizendo que eles não eram inteligentes o suficiente para ajudarem-no a governar; mandou destruir toda a Cidade de Esmeralda e reconstruiu todos os prédios com palha, dizendo que era muito mais vantajosa, bonita e barata. Para falar a verdade, todos acham que ele fez essa escolha por simples vaidade: todos sabem que palha não é muito forte ou bonita. Além disso, ele mandou quebrar toda a estrada de tijolos amarelo-reluzente para trocá-los por tijolos amarelo-palha!
- Isso não pode continuar assim! – ela exclamou, batendo com um dos pés no chão. – Vou falar com esse tal Espantalho e tirar satisfações com ele! Veja se pode, quebrar toda uma linda estrada e uma linda cidade, além de escravizar um povo tão frágil e bonito!
- Como a senhora pretende falar com ele? – a anã perguntou. – O Espantalho se diz tão inteligente que se recusa a falar com qualquer um. Ele acha que ninguém é digno de ouvir suas inteligentíssimas palavras.
- Me diga como faço para chegar nessa Cidade de Palha, e deixe que faço o resto!
- Essa é a parte fácil, minha senhora. Tudo que tem de fazer é seguir pela Estrada de Tijolos amarelo-palha!
ELIZABETH PASSOU A MAIOR PARTE do percurso andando vagarosamente, vendo todas as maravilhas de Oz. Assobiava algumas músicas e vez ou outra chutava algumas pedrinhas que se soltavam da estrada mal feita. Alguns anões observavam-na, enfiando suas cabeças pelas janelas e gritando, surpresas, que a menina tinha sapatinhos de prata, os mesmos de Santa Dorothy! E conjeturavam: alguns diziam que a Elizabeth era reencarnação da Santa, outros que era uma ladra que roubara os sapatos de prata e agora se fazia de boazinha, e outros ainda diziam que a menina era oportunista, e que os sapatinhos eram falsos, de algum material vagabundo e pintado com tinta prateada.
- Mas os sapatinhos de Santa Dorothy não se perderam no deserto quando ela subiu aos céus? – perguntavam os menos esclarecidos, num tom duvidoso.
- Ora, você deveria conhecer a lenda por completo, seu tolo! Alguns estudiosos teimam em dizer que os sapatinhos foram encontrados pelo próprio Oz, e que ele encontrou a Santa na tal terra de Kansas e os devolveu pessoalmente!
- E como essa menina está calçando eles?
- A senhora Fahr, neta de Boq, disse que teve uma longa conversa com a menina. Ela disse que a garota é filha de Santa Dorothy!
- Aquela mulher está senil, você não deveria acreditar em tudo que ela diz.
- Bom, foi o que ela disse...
E Elizabeth continuava seu caminho, pouco se importando com caras e bocas, fofocas e burburinhos.
- Fahr disse que a menina vai até a Cidade de Palha!
- Fazer o quê?
- Conversar com o Espantalho, veja só!
- E como ela pretende conversar com uma pessoa que não fala?
Essa pergunta nem mesmo Elizabeth saberia responder.
COM PASSOS LENTOS, PARADAS OCASIONAIS em busca de alguma comida ou conversa com os anões mais curiosos e menos desconfiados, Elizabeth demorou um dia e meio para chegar até a Cidade de Palha – passando a noite em uma pequena pensão, na qual a dona fora bondosa o suficiente para não cobrar a estadia e lhe oferecer um bom jantar.
A visão da Cidade não era nem um pouco acolhedora. Os portões eram todos feitos de palha trançada. Parecia resistente a tempestades ou ventanias, mas não tinham nenhum tipo de beleza particular.
A menina sacolejou o portão – uma vez que bater não produzia som algum. Em poucos momentos, um homem veio atendê-la. Abriu apenas uma fresta do portão, mas foi o suficiente para Elizabeth ver que ele se vestia como os espantalhos das plantações do Kansas.
- Quem está perturbando a ordem da Cidade de Palha? – ele perguntou, olhando diretamente para os olhos de Elizabeth. – Quem é a senhora?
- Sou Elizabeth do Kansas, e vim aqui falar com o Espantalho! – ela disse, com firmeza e determinação.
- Ora, e o que a faz crer que pode ao menos entrar aqui? – o guardião retorquiu.
- Sou filha de Santa Dorothy – ela respondeu. Sabia que aquele argumento seria forte o suficiente.
- Então os boatos eram verdadeiros? – ele perguntou, em tom jocoso. – É você a louca que se intitula filha da Santa?
- Não sou louca, e esse título é meu por direito! – ela disse. – Olhe para os meus pés. Todos falam nesses benditos sapatinhos, não é possível que você não os reconheça.
O homem obedeceu-a. Elizabeth percebeu que ele apenas olharia de soslaio e logo depois enveredaria em alguma outra pergunta mal-criada. No entanto, ao pôr os olhos nos sapatinhos, o olhar do homem congelou-se. Os olhos se arregalaram aos poucos e depois a boca os acompanhou.
- São os sagrados sapatos de prata? – ele perguntou, abismado.
- É o que dizem! Se não quer acreditar, toque-os e veja que não estão pintados!
- Não! – ele bradou, os olhos cada vez mais arregalados. – Seria blasfêmia tocar em tais artefatos sagrados! Você saberia disso, se fosse uma pessoa normal! – o homem desapareceu por um momento entre as palhas trançadas, para logo em seguida abrir o portão para a menina passar. – Vamos, entre, entre! O Espantalho tem que ver isso!
A garota entrou, receosa. Pensou, a princípio, que o homem não havia acreditado nela e abrira aquela porta com o único propósito de prendê-la para fazer sabe-se lá o quê com ela. Entretanto, ao perceber o rosto realmente assombrado e os olhos do homem encarando sucessivamente os sapatinhos brilhantes, ela acreditou que ele não estava articulando nenhum plano maléfico.
- Vamos, rápido, rápido! – ele dizia, apertando o passo. Parecia não querer que Elizabeth visse o povo das ruas, mas isso não foi o suficiente para impedi-la. As poucas pessoas que andavam por ali pareciam ridiculamente tristes. Tristes por suas caras cabisbaixas e andar vagaroso, e ridículas porque, por mais tristes que fossem, todas usavam maquiagem e roupas de espantalho.
- O que está acontecendo aqui? – ela perguntou, vendo homens, mulheres, crianças e velhos como palhaços, andando pelas ruas.
- Ordens do Espantalho. Vamos, você poderá conversar sobre tudo com ele! – acrescentou, ao ver que o rosto de Elizabeth se contorcia em desaprovação.
Estavam andando a apenas alguns segundos, quando um homem, vestindo um sobretudo por sobre a roupa de espantalho, passou por Elizabeth. O estranho, sem pedir licença ou permissões, abriu o sobretudo, revelando inúmeras latas de comida em conserva penduradas por toda extensão de pano disponível.
- Quer comprar? – ele perguntou, com um sorriso débil no rosto.
- Não estamos interessados! – exclamou o guardião, afugentando o homem com seus olhos sagazes.
- O que foi isso? – a menina perguntou, mal o homem se afastava. Sabia que havia pessoas que abordavam outras nas ruas, mas nunca para vender comidas enlatadas!
- É o tráfico de comida em conserva, senhora. – ele disse. – O Espantalho proibiu o uso de fogo em nossa cidade e as pessoas não tem outra opção a não ser comidas cruas ou em conserva. E é claro que comidas em conserva, por piores que possam parecer, são mais gostosas e caem melhor do que comidas cruas!
- Mas isso é um horror!
- Horror maior seria ter a cidade toda incendiada por causa de uma fogueira, senhora. Vamos, não estamos muito longe.
NÃO HOUVE MAIS NENHUM OUTRO tipo de empecilho ou abordagem durante o curto percurso até o prédio onde ficava o gabinete do Espantalho. Elizabeth aproveitou esse meio tempo para vislumbrar com mais calma todas as particularidades da cidade.
Tinha de dar o devido crédito ao Espantalho. Por mais sem graça que aquele amarelo-palha fosse, a cidade era bonita ao seu modo. Os prédios gigantescos, todos feitos com palha trançada com perfeição, eram bonitos de se ver. As torres cresciam até se afinarem, como lápis gigantes fincados de pé.
- Quer dizer que esse tal de Espantalho não fala com ninguém? – ela perguntou, admirando a arquitetura palhírica das casas. – Ele é assim mesmo tão inteligente?
- O povo é exagerado, menina. – ele disse. – O Espantalho não fala com pessoas como eu, um reles mortal. Só há duas pessoas no mundo de Oz com quem ele fala.
- Quem são?
- O Homem de Lata e o Leão!
- As pessoas que minha mãe ajudaram!
- Elas mesmas! Santa Dorothy encontrou-as e logo lhes deu propósito de vida. Acho que o Espantalho ficaria felicíssimo em se encontrar com a filha da Santa. – parou em frente a uma grande porta. – Bem, aqui estamos.
- O que tenho que fazer para falar com ele?
O homem olhou para o relógio em seu pulso, depois coçou o queixo e respondeu:
- Ele está com o Leão e o Homem de Lata. Estão aqui há quase uma semana, resolvendo problemas governamentais e também matando as saudades. Espere por mim aqui, vou anunciá-la.
O guarda entrou sem fazer barulho, fechando a porta atrás de si. Elizabeth ficou esperando, batendo os sapatinhos no chão repetida e ritmadamente, enquanto uma multidão de espantalhos fantasiados a olhava desconfiados, enquanto andavam pela cidade amarelo-palha.
Finalmente, uma voz ecoou e a mandou entrar.
- SENHORA ELIZABETH DO KANSAS, SUPOSTA filha de Santa Dorothy do Kansas, detentora do par de sapatinhos de prata supostamente usados por Santa Dorothy do Kansas em sua breve passagem por Oz.
O guarda bateu três vezes seguidas no chão com sua lança, anunciando Elizabeth. Depois, sem perder a postura – braço livre posto nas costas, peito estufado e corpo ereto – retirou-se, deixando a menina sozinha, olhando para as três figuras envelhecidas que a encaravam com dúvida, assombro e curiosidade.
O primeiro de todos era o Espantalho. Elizabeth, imóvel, encarou-o: ele usava um chapéu de palha redondo, que lhe fazia sombra aos olhos e às orelhas; a roupa que lhe caía pelos ombros era esfarrapada, e alguns tufos de palha saíam-lhe pela camisa. Tinha os olhos pintados em um saco de batatas cheio de palha, que piscavam pouco e encaravam muito.
Ao lado direito do Espantalho encontrava-se o Homem de Lata: se Elizabeth visse-o e não soubesse seu nome, pensaria que aquilo fosse bronze, e não lata. O Homem estava quase que completamente enferrujado, e mantinha uma lata de óleo sempre em mãos. Passava óleo nas juntas a cada instante, como se sua vida dependesse daquilo. Tinha um cordão no pescoço, onde um tipo de relógio em formato de coração estava pendurado. O ponteiro não se movia, marcando sempre doze horas.
Ao lado esquerdo do Espantalho encontrava-se o Leão. Um Leão que não metia medo, pensou Elizabeth ao vê-lo. Tinha a juba acinzentada, com mais cabelos brancos do que coloridos, e os dentes amarelados e apagados pouco apareciam. O olhar tampouco era temível ou assustador. O rabo mexia-se involuntariamente, de lá pra cá e de cá pra lá numa dança silenciosa.
Antes que Elizabeth falasse, olhou ao redor. A sala, assim como todo resto, era toda feita de palha: paredes de palha, tapetes de palha, armários de palha, até mesmo um lustre de palha! Outra coisa que a menina pôde perceber era que em um canto ao fundo da sala encontravam-se uma quantidade incontável de caixas de fósforos, todas fechadas e empilhadas como numa pirâmide.
- Oi – foi a primeira coisa que a menina disse, olhando das caixas de fósforos para as três figuras quietas e caladas. – Então o senhor é o Espantalho? – ela perguntou, apontando para a figura do centro. – O inteligentíssimo Espantalho?
- É ele mesmo! – disse o Leão, revelando uma voz imponente e envelhecida pelo tempo. – Eu sou o Leão, e o Homem à direita do Espantalho chama-se Homem de Lata. E você? Quem é e o que faz aqui?
- Me chamo Elizabeth, e vim parar aqui por puro desejo do destino. Venho do Kansas, e aqui estou para reclamar a vocês o que é de direito dos anões! E das xícaras de porcelana! E da população da Cidade de Palha! Enfim, de toda Oz!
- E porque a senhora vem reclamar direitos a um povo que mal conhece? – perguntou o Homem de Lata, as articulações de sua boca rangendo à medida em que falava.
- Minha mãe e meu pai sempre me ensinaram que injustiça nenhuma deve passar despercebida, e o que está fazendo com esse povo, senhor Espantalho, é uma injustiça!
O Espantalho mantinha-se impassível com seus próprios pensamentos, olhando de Elizabeth para os amigos. Não parecia notar que a palavra havia sido dirigida a ele.
- Ele não fala. – disse o Leão. – Desde que Oz deu um cérebro a ele, tudo o que faz é ficar bolando planos e mais planos e colocando-os em prática. Ele faz mímicas, se isso ajuda.
O Espantalho confirmou com um aceno animado de cabeça, pronto para fazer quantas mímicas fossem necessárias.
- Não, não quero mímicas! – a garota exclamou, revoltada. – Você não percebe que está sendo estúpido ficando calado dessa forma? As pessoas aqui estão infelizes, seu paspalhão, mas sua grandessíssima inteligência parece não perceber isso! Mamãe já me falou isso uma vez: o que você tem é uma coisa chamada egocentrismo. Está se preocupando tanto com você mesmo, com suas idéias brilhantes e com seu cérebro avantajado que não percebe que todos estão sofrendo!
A garota parou, pensando ter falado tudo o que achava do Espantalho sem nem ao menos medir as palavras. A princípio, sentiu uma ponta de remorso, que se esvaiu aos poucos, ao ver que ele não respondia.
- A menina está certa, Espantalho. – disse o Homem de Lata, olhando para Elizabeth. Disse a ela. – Sabe, menina, eu sofri muito e entendo muito sobre sofrimento. Assim que ganhei um coração, me apaixonei perdidamente por uma mulher, mas ela não quis saber de mim. Foram tempos negros, tão negros que meu coração se quebrou e nunca mais voltou a funcionar. Então, por vingança, proibi todos os Pisca-Piscas de se apaixonarem! Quem se apaixonasse teria como recompensa a morte!
“Mas meu povo, diferente do povo de Oz, não agüentou minhas imposições de boca calada, oh não! Eles lutaram, e sem nem pensar duas vezes me escorraçaram das terras e elegeram um novo governante. Agora estou aqui, na Cidade de Palha, pensando em alguma maneira dos Pisca-Piscas me aceitarem novamente”.
- Você já pensou em deixar que eles se apaixonem novamente? – ela perguntou, aproximando-se dele a passos lentos. – Afinal, o mundo não precisa acabar por causa de um coração partido, não é mesmo?
- Não, eu... – o Homem de Lata parou por um instante, olhando para o alto e coçando as articulações enferrujadas. Antes que falasse, injetou um pouco de óleo na boca. – Eu nunca pensei sobre isso.
- Pois então pense! – Elizabeth foi até o Homem de Lata, e, sem pedir permissão, pegou o relógio-coração e olhou-o.
- O que está fazendo? – perguntou o Homem de Lata, olhando para baixo.
- Acho que seu problema não é muito difícil de resolver. – ela disse. – Veja, um coração quebrado pode ser facilmente reparado. É só dar tempo para que ele se reestruture. – ela puxou um pininho escondido do relógio, girando-o. – E para dar tempo ao relógio, nada mais simples do que dar-lhe corda!
O relógio voltou a contar os segundos, rodando lentamente enquanto tiquetaqueava em seu ritmo ininterrupto.
- Obrigado, senhora! – ele exclamou, arregalando os olhos. – Você é mesmo filha da Santa!
- E o meu problema, será que é facilmente resolvido? – perguntou o Leão, aproximando-se. – Estou aqui há tanto tempo quanto o Homem de Lata e não vejo solução para ele!
“Desde que passei a morar e governar a floresta, todos tinham medo de mim, o Corajoso Leão! E tinham que temer mesmo, eu dizia, rugindo alto e impedindo qualquer um de falar. Fui tão burro e egoísta que sequer percebi que os Animais não estavam nem um pouco satisfeitos com toda aquela minha coragem. Eles, então, armaram um plano e me destronaram em pouco tempo. Um simples macaco veio pelas minhas costas e roubou minha coroa, veja só! E pior: quando rugi mandando-o voltar, um cachorro veio pelas minhas costas e roubou minha capa! Então rugi mais alto, enfurecido, mandando todos sumirem das minhas vistas e não me perturbarem. Mas qual foi minha surpresa quando, ao me virar, vi que todos me encaravam, unidos e determinados. Todos rugiram ao mesmo tempo, e o som foi aterrador, fazendo vibrar o chão e tremer as folhas das árvores. Eles me mandaram embora, e nem toda minha coragem foi capaz de enfrentar todos aqueles Animais insatisfeitos.
- O seu problema não é difícil de resolver! – Elizabeth exclamou. – Segundo mamãe, você teve uma coisa chamada prepotência. Não sei bem como isso acontece, mas sei o que significa: você se achou tão bom e tão poderoso que não se importou com os outros. Não pensou no que eles pensavam, pisou neles e se achou o dono do mundo!
- E o que eu posso fazer para voltar sem que eles fiquem com raiva de mim?
- Seja humilde! Vá até lá, peça perdão e fale que foi um estúpido. Reconhecer seus erros e tão ruim quando perceber que os cometeu, mas o sentimento é menos duradouro, passa logo. Se você for humilde, todos vão perceber que errou e vão lhe dar outra chance!
- Fácil assim?
- Fácil assim! – ela respondeu, animada.
O Leão andou vagarosamente, juntando-se a ela e ao Homem de Lata.
- E então, Espantalho? Vai ou não falar com a menina? – ele perguntou.
Os olhos do Espantalho estavam diferentes. Não estavam mais encarando Elizabeth, mas pareciam perdidos em algum lugar distante, enquanto os ouvidos perdiam-se nas palavras de Elizabeth.
- Espantalho? – perguntou o Homem de Lata, olhando-o como se quisesse dizer: “Fará essa desfeita mesmo depois da menina ter resolvido nossos problemas?”.
- Ora, vocês são burros demais! – explodiu o Espantalho, quebrando finalmente o silêncio. – Minha mente privilegiada pode ver o que a limitada de vocês não pode! Não vêem que essa menina está tentando enganar vocês? Com toda essa pureza e inocência, dando soluções simples para problemas tão complexos, como se conhecesse Oz como nós! Ela está se saindo muito bem, já que conseguiu convencer vocês com tanta facilidade!
- Sabe qual é o seu problema, senhor Espantalho?! – disse Elizabeth, encarando-o. – O senhor é racional demais! Frio demais! Não percebe que nem tudo são idéias mirabolantes e soluções complexas, não é mesmo? Mamãe também diz isso: ela diz que às vezes as pessoas têm que ser menos racionais e olhar para as coisas com outros olhos. Com os olhos do coração, e não com os da cabeça. Se as pessoas fossem assim, o mundo seria um lugar muito melhor!
- Ainda ousa me contradizer! – ele exclamou. – Saiba, menina, que minhas idéias são maravilhosas!
- Maravilhosa idéia transformar uma cidade de Esmeraldas em uma de Palha e fazer as pessoas andarem fantasiadas de espantalhos! – ela exclamou. – O senhor é vaidoso, isso sim! Tanta inteligência fez com que o senhor esquecesse que nem tudo se resume a contas matemáticas e citações de livros!
- Qual o problema com a palha? – ele perguntou. – Sou feito de palha e não tenho nenhum problema!
- Nossa, como é cabeça-dura! – ela estava perdendo a paciência, mas continuou argumentando. – A Palha é frágil, assim como sua cabeça. Tão frágil que as pessoas não podem comer nada cozido, tendo que sobreviver com enlatados contrabandeados. – a garota correu até a pilha de caixa de fósforos. – Se eu riscar um mero fósforo, tudo vai aos ares e nada irá restar. E por que você deixou tudo assim tão frágil? Só para ter uma Cidade só sua, seu egoísta! A Cidade tem que ser de todos, e o senhor deveria tornar a vida de todos melhor, não piorar as coisas!
- Não risque esse fósforo, menina! – ele disse. – Não sabe como tenho medo de fogo! Não faça isso, por Dorothy!
- Se estamos falando da mesma Dorothy, ela não gostaria nem um pouco de ver as coisas como estão! Mamãe odeia injustiças, e se você a conhece tão bem quanto todos dizem, deve saber disso tanto quanto eu.
- Mas... – a voz do Espantalho não passava de um sussurro agora. – Me pareciam ótimas idéias, e vinham sempre com mais intensidade. E eu perguntava para mim mesmo: por que não? Afinal, eu ganhei um cérebro, bolas, então devo usá-lo!
- Se o senhor fosse realmente inteligente, saberia que nem todas as idéias são boas! – ela disse. – O seu cérebro, senhor Espantalho, é incrível, mas não é o único com boas idéias. Ele, muito ao contrário, tem idéias um tanto quanto absurdas! Escravizar os habitantes do País de Porcelana, por exemplo!, ou então trocar todos os tijolos reluzentes por uma Estrada pálida e sem graça! Oz é um lugar maravilhoso e pode ser ainda melhor se o senhor ouvisse as idéias dos outros. Contrate novamente os acessores que o senhor demitiu, mande-os ouvir o que o povo tem a dizer e ponha as sugestões boas em prática! Esqueça as idéias ruins, tanto as suas quanto as dos outros.
- Mas assim o meu cérebro vai ser... igual a todos os outros. – ele disse, pensativo.
- Claro que não! Vai ser só seu! A única diferença é que o seu novo cérebro vai ser mais aberto para as opiniões dos outros cérebros. Entendeu?
- É claro que entendi! – ele disse, ríspido. – Se eu ouvir as boas idéias e colocá-las em prática, então as coisas vão ser bem melhores para o povo. Não é isso?
- Exatamente! – ela bateu palmas, sorrindo. – O senhor promete que irá fazer tudo para o bem do povo?
- Prometo!
- E o senhor, Homem de Lata, vai deixas as pessoas se apaixonarem?
- Claro que vou!
- E o senhor, Leão, vai pedir desculpa para os Animais da floresta?
- Aposte minha juba que sim!
A garota parou para um momento. Olhou para cima, pensativa. Por fim, disse:
- Então acho que não tenho mais o que fazer aqui! Os senhores já perceberam que não estavam completamente certos, então agora posso voltar para casa sem nenhum peso na consciência.
- Posso fazer uma pergunta, menina? – perguntou o Espantalho.
- Já fez, mas deixo que faça uma outra. – ela disse, sorrindo.
- Por que fez isso? Digo, a senhora não mora em Oz. Se bem me lembro, disse que é a primeira vez que está aqui, certo?
- Exatamente.
- Então por quê?
- Sabe, mamãe sempre me disse que devemos honrar nossos compromissos. Quando cheguei à Oz, a primeira coisa que pensei era em como havia parado aqui, mas assim que encontrei uma anã e ela me contou tudo o que estava acontecendo, decidi que devia vir falar com o senhor Espantalho. Não sei se os senhores são assim, mas eu não consigo ver alguma coisa errada e ficar calada! Esqueci completamente que tinha que voltar para casa antes que dessem pela minha falta e resolvi vir até aqui!
- É determinada como sua mãe! – disse o Espantalho. – Determinada e amiga! Como se chama mesmo, menina?
- Elizabeth, senhor.
- Então, aqui, Elizabeth, em frente aos honrosos Homem de Lata e Leão, eu lhe declaro Santa Elizabeth, filha de Santa Dorothy!
Os três homens se ajoelharam, fazendo uma longa mesura.
- Não é para tanto! – ela disse. – Eu só vim conversar e agora virei Santa!
- Uma merecida Santa! – disse o Leão.
- Vamos deixar de conversa mole, seus tolos! – disse o Homem de Lata. – Se bem conheço Dorothy, ela deve estar preocupadíssima com o desaparecimento da filha. – ele puxou o relógio de seu pescoço, consultando-o. – Acho que já passa da hora de você voltar para casa, não é?
- É mesmo! – ela disse, assustada. – Esqueci completamente da minha casa! Mas como posso voltar para lá?
- Ora, da mesma forma que veio! – disse o Leão.
Então os três, em coro, entoaram:
Bate os calcanhares três vezes e fale para onde quer ir
Os sapatos de prata de seu pé irão cair
E então, de uma vez por todas, você irá partir!
Os três riram.
- Como ainda conseguimos lembrar disso? – disse o Leão.
- Meu cérebro guarda muitas informações, mas não consigo explicar como vocês conseguem! – disse o Espantalho.
- Esses versos foram criados por um poeta de Oz, assim que a história de Dorothy foi contada para o povo. – explicou o Homem de Lata.
- Então é só eu fazer o que o poema diz? – ela perguntou.
- Exatamente!
Ela tentou. Bateu os calcanhares três vezes, ouvindo novamente o barulho de dois pratos chocando-se. Sentiu os pés vibrarem.
- Eu quero ir para onde está a minha mãe! – ela exclamou.
Logo estava levitando, enquanto os sapatos desprendiam-se de seus pés. Foi levada pela força de uma brisa, carregada pelo vento. Saiu pela janela, dando adeus e sorrindo.
- Mande lembranças do Homem de Lata! – disse o Homem de Lata.
- E do Espantalho! – disse o Espantalho.
- E do Leão! – disse o Leão.
- Deixem comigo! – ela disse, desaparecendo entre as nuvens de algodão doce. – Mandem lembranças para Fahr, neta do anão Boq!
- Mandaremos! – disseram, em uníssono.
- IGUALZINHA À MÃE... – COMENTOU O Espantalho, depois que perdeu Elizabeth de vista.
Abaixou-se, pegando os sapatinhos de prata entre os dedos.
- Vamos, temos que colocar isso em algum lugar onde as pessoas possam ver. Quem sabe assim todos acreditem que Santa Dorothy e Santa Elizabeth não são nenhum tipo de lenda criada por nós.
Juntos, comentando sobre as semelhanças entre mãe e filha, além dos novos planos de seus governos, os três saíram lentamente, atravessando as portas de palha trançada.
- OLHA, ELA TÁ ACORDANDO! – ELIZABETH pode ouvir um dos meninos dizer.
- Filha, você está bem? – perguntou Dorothy. – Encontramos você dentro do closet! O que aconteceu?
- Os seus sapatinhos estão com eles, mamãe. – disse Elizabeth. – E eles mandaram lembranças.
- Eles quem?
- O Espantalho, o Homem de Lata e o Leão!
- Ixi, ela tá delirando! – disse um dos meninos. – Deve ter batido a cabeça com força demais...
Deixe os meninos pensarem o que bem entenderem, pensou Elizabeth, abrindo os olhos e encarando os da mãe.
Um sorriso abriu-se no rosto de Dorothy. Aquele sorriso que Elizabeth conhecia, que dizia “tudo está bem”. Um sorriso que mostrava que Dorothy havia entendido perfeitamente o que a filha havia dito.