FALA O DIABO - XI
Você se lembra da última vez. Ela caminhava apressada. Estático, você a observava indo embora. Queria chorar, mas não conseguiu. As lágrimas se secaram em algum momento de sua vida. Queria chamar o nome dela, mas, de súbito, sua voz apagou-se. E você se sentia impotente.
A memória te açoita como um violento carcereiro. A dor, que no início infligia as mais duras penas a cada pulsada de seu peito agoniado, torna-se uma companheira onipresente, quase uma amiga. Você não consegue mais imaginar como seria ficar sem ela.
Angustiado, oprimido, dilacerado, você decide partir. Decide caminhar sem saber ao certo aonde ir, sem destino preciso, sem estrada certa. A única meta de sua jornada, a única preocupação, o único dever, é encontrá-la.
Você caminha. Anda por um deserto tão grande, tão sombrio... Anda e anda à sua procura, mas sabe que ela não está ali. Sabe que a perdeu e que continuará andando, andando sempre, sempre sozinho, sempre sentindo. E sabe que ela continuará a resplandecer em tudo.
No entanto, você se perde. Perde-se nos desfiladeiros da névoa, nas florestas noturnas, por tempos reservados ao esquecimento, nos labirintos da desilusão. Por tanto procurá-la, você não percebe que o curso do sol cessa, que o canto do galo já não existe, que se finda o evoluir da sombra e que tudo o que a hora algum dia anunciou agora está mudo, surdo e cego. Repentinamente, seus sentidos e pensamentos naufragam em uma eterna inconsciência. Abre-se um abismo sem fundo. A busca perde o seu sentido e acaba.
Entretanto, o fim da jornada não representa o fim de tudo. Um desejo eterno te impulsiona para o alto. Finalmente, você passa a viver nas alturas de que se afasta a vida, assim como a eternidade. Pensa nela uma última vez. E chora. Lágrimas mais e mais. Sim, você a ama! Mas torna-se uma estrela, e o pecado deste minuto livra o antigo da memória.