A casa dos sonhos coloridos
Prólogo:
“Homens demoram a perceber que perderam o amor da mulher, por pior que a tenham tratado.“
"Quando você elimina o impossível, o que sobra por mais incrível que pareça só pode ser a verdade."
"O mundo está cheio de coisas óbvias, que ninguém, em momento algum, observa!." (Conan Doyle).
Arthur Ignatius Conan Doyle (Nasceu em 22 de Maio de 1859, em Edimburgo, Escócia - Faleceu em 7 de Julho de 1930, em Windlesham, Sussex, Inglaterra), mais conhecido como Sir Arthur Conan Doyle, foi um escritor britânico, mundialmente famoso por suas 60 histórias sobre o detetive Sherlock Holmes, que foram consideradas uma grande inovação no campo da literatura criminal.
Foi um escritor prolífico cujos trabalhos incluem histórias de ficção científica, novelas históricas, peças e romances, poesia e obras de não-ficção. Arthur Conan Doyle viveu e escreveu parte de suas obras em Southsea, um bairro elegante de Portsmouth.
Tão bem qualificado, caracterizado e personalizado foi seu personagem principal que, ainda hoje, passados tantos anos, leitores escrevem para o endereço do escritório de Sherlock Holmes (221-B Baker Street, Londres) porque acreditam que se trata de um ser real.
Nesta parte inicial de meu texto estou explicando e até fazendo uma pretensiosa analogia entre os meus escritos com os do famoso escritor, também espírita, Arthur Ignatius Conan Doyle.
Por uma razão óbvia tenho recebido "e-mails" de leitoras e leitores, alguns extremamente felizes e/ou enciumados, dizendo identificar-se com os personagens das minhas histórias ou até afirmando conhecê-los. Afirmo: todos os meus personagens são fictícios em que pesem as proféticas coincidências.
Ufana-me saber que consigo confudir os diletos leitores com meus arrazoados devaneios e deslumbramentos surrealistas. Até admito que leitores podem se identificar com os personagens; afinal de contas, a ficção se baseia na realidade e vice-versa.
Chega de tantas explicações nada ou pouco convincentes e vamos à leitura de mais um singular conto eminentemente surrealista.
Entre montanhas vetustas, alterosas, imponentes, foi construído um casarão cujo jardim em sua volta assemelhava-se a um conto de fadas. Nas proximidades, cerca de 600 metros, havia um bosque onde animais silvestres faziam não apenas sua morada, mas, sobretudo alegravam os habitantes da mansão com suas irrequietudes. Jade e Hulk, animais de estimação do autodidata Henrique, foram criados nesse sublime oásis.
A mansão foi desenhada por Henrique (ele chamava o desenho primoroso de croqui) e construída por um recém-formado engenheiro, Sr. Wilson Ferreira dos Santos, em 2003, que a concluiu em 2004.
O engenheiro, responsável pela obra, era muito conhecido em todo o Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Não ficou para a inauguração da casa, retornando para Santa Maria – RS, onde fixou domicílio, com o fim de se casar com a Srta. Lígia Thaisa (ele a chamava de Lita).
A casa foi vendida toda mobiliada para o Sr. Fernando Muniz de Almeida, exportador de café e derivados de frutas cítricas, que se mudou com esposa e três filhos para a casa apelidada pelo autodidata, antes do início de sua construção, pelo nome: "casa dos sonhos coloridos".
Em meados de 2005, devido a problemas financeiros, a família Muniz teve que se desfazer do imóvel, que foi posto a venda, de porteira fechada, pelo irrisório preço de R$ 1.600.000,00 (Um milhão e seiscentos mil reais). Claro que a casa foi rapidamente alienada pelo preço avaliado.
Em 2007, já recuperados da crise financeira que quase os retirara do páreo das exportações, os Muniz recompraram a casa com um ágio de 30% e realizaram uma grande e valorosa reforma.
O estilo arquitetônico da casa é eclético, e a decoração interna é arte inovação. A escada é de mármore italiano (Carrara) e o corrimão de ferro maciço confeccionado pelo Liceu de Artes e Ofícios de São Paulo sob a supervisão de especialistas brasileiros, ingleses e canadenses.
Originalmente não era tão luxuosa. Não havia o pequeno cômodo, no pavimento intermediário, o quarto de meditação onde se ouviam indeléveis cânticos góticos e celtas (new age). Não existiam os afrescos nem o jardim de inverno. Todos esses ornamentos, som ambiente e cômodos foram adicionados na reforma de 2007.
Vale salientar que o cômodo próprio às meditações não se assemelhava aos castelos sombrios que decorrem em um clima de terror, com toques fantasmagóricos e sobrenaturais. Pelo contrário, era um local aprazível, positivo, amistoso, favorável às emanações fluídicas e benfazejas. A luz tênue desse cômodo era azulada.
Essa construção foi uma inovação por ser uma das primeiras casas construída totalmente isolada. Em Brasília, Porto Alegre, Gramado, Santa Maria, a maioria das residências de campo era geminada.
Campina Grande – PB, cidade natal da família Muniz, fora escolhida para a construção do solar não apenas pela excelência do clima, havia um quê de amistoso na população simples e hospitaleira do planalto.
No terreno existiam 5 (cinco) casas mobiliadas, pequenas, cada uma com 106 m² de área coberta, para uso dos empregados casados. Havia outro sobrado, bem estruturado, de dois andares que servia de alojamento aos serviçais solteiros de ambos os sexos (ao todo 11).
A disciplina dos empregados e controle de todos os afazeres da casa era responsabilidade do Sr. Miguel Salvino de Freitas, 52 anos, mais antigo, exigente e com as qualificações que o recomendavam nos mínimos detalhes de segurança, respeito, lealdade e proficiência.
Cuidou-se, também, em manter funcionando duas salas de aula (cada sala comportava apenas quinze alunos), um laboratório de informática com seis computadores (um era o servidor de última geração), três impressoras multifuncionais e uma biblioteca onde as crianças recebiam aulas de três professores contratados.
Um dos professores, Sr. Orlando Tavares, era exclusivo para as práticas desportivas. Esse professor era ótimo porque ensinava ludicamente. As crianças aprendiam brincando e brincavam aprendendo.
A professora Cibele Cristianne Gonçalves, 28 anos, solteira, ex-docente de uma renomada escola campinense de idiomas, fora contratada para ministrar aulas de Português, Inglês e Espanhol de acordo com os cronogramas de ensino fornecidos pelo MEC.
No jardim, havia uma quadra de tênis, um parque infantil, duas piscinas (infantil e adulto), uma ciclovia (onde se permitia aos visitantes um passeio tranqüilo), uma horta e um pomar cultivados com hortaliças e árvores frutíferas diversas. Proximo ao pomar um heliporto moderno complementava a bela estrutura funcional e pragmática da casa dos sonhos coloridos.
Os Muniz viveram no casarão até abril de 2008 quando, devido a problemas derivados pela quebra da bolsa, tiveram que vendê-lo definitivamente. A venda de tão soberba casa, eleita pela sociedade campinense reduto da grã-finagem, não seria fácil. O preço era alto.
O autodidata Henrique com vistas a aperfeiçoar o estudo nos idiomas: Francês, Inglês e Espanhol estava fazendo o curso de doutorado na Universidade de Paris (Sorbonne) e recebeu uma carta (mensagem), via “e-mail”, de sua mais notável ex-aluna Ana Lúcia com quem se correspondia regularmente. Carinhosamente ele a chamava de "Analu".
Uma explicação: Sorbonne (em francês, La Sorbonne) era um apelido da antiga Universidade de Paris e hoje é usada para se referir às suas instituições sucessoras, que hoje são quatro universidades (Université Paris I - Panthéon-Sorbonne; Université Paris III - Nouvelle-Sorbonne e Université Paris IV - Paris-Sorbonne).
Localiza-se no centro de Paris, no quinto arrondissement (distrito), em frente ao Lycée Louis-Le-Grand (escola secundária) e ao Collège de France (universidade , próximo ao monumento Le Pantheón, às universidades Paris I, Paris II, Paris IV e Paris V, e ao Parque Luxemburgo (onde encontra-se o Senado), no chamado Quartier Latin (Bairro Latino), onde concentram-se várias escolas superiores, os museus e os turistas.
Eis o conteúdo da mensagem (missiva) que Ana Lúcia (Analu) escreveu:
“Amado amigo e mestre Henri,
Espero que esta carta mensagem seja lida a tempo de você impedir a venda da “casa dos sonhos coloridos” como carinhosamente nós a chamávamos durantes as aulas que me ministrava. A casa foi posta à venda porque os proprietários (Família Muniz) estão com dificuldades financeiras em virtude dos problemas causados pela quebra da bolsa de Nova Iorque.
Como você sabe a família Muniz sempre diversificava as aplicações, mas parece que a maior parte da fortuna deles estava aplicada na bolsa americana e esse erro causou a derrocada financeira não apenas deles, mas de um sem número de investidores brasileiros.
Você se lembra que, às vezes, brincando, dizia que gostaria de se casar comigo e morar na casa que ainda hoje guardo cópia do esboço (croqui) que fez em apenas duas semanas?
Adorei o traçado arquitetônico de linhas leves e ao mesmo tempo vigorosas como seus impetuosos arroubos de ternura quando me devassava as intimidades pudendas sob a escada do alojamento dos empregados. Às pressas, a volúpia nos consumia. Sinto saudades.
Eu não usava batom, não gosto de usar, mas deixava marcas vermelhas em seu rosto bem escanhoado e você marcava minhas coxas com seus beijos demorados, ardentes, molhados e vorazes.
Oh! Quanta saudade daqueles dias de excelsa plenitude satisfatória. Hoje estou casada com uma pessoa que não me enxerga nem quando eu penteio os cabelos de um modo diferente do convencional. Ele se especializou em identificar erros e por isso ficou cego para os acertos.
Vivemos uma relação de aparências. Toleramo-nos por conveniências sociais. Vivenciamos em fraterna harmonia por apego aos princípios familiares e religiosos. Isso é tão ruim que até já comecei a fumar escondido. Estou me reprimindo e me anulando. Bebo demasiado café e não durmo bem. Sou viciada em chocolates (doces) e massas, com isso corro o risco de engordar e não mais me gostar como dantes.
Claro que em uma relação interpessoal o silêncio pode dizer muita coisa, mas no meu caso quero concordar com seus ensinamentos quando em uma tarde, no pomar da mansão, segurando minhas mãos, beijando-me de leve os olhos em lágrimas você disse:
‘Princípios só servem para mesquinhar uma mulher. Minha doce aluna precisa resgatar a auto-estima, sentimentos reclusos, rebeldes, enfraquecidos ao longo do tempo. “Solte-se das amarras hipócritas dos pudores, das conveniências, e seja minha para todo o sempre’”.
Naquela época eu estava solteira, livre e desempedida, mas os recalques, mecanismo psicológico de defesa pelo qual desejos e sentimentos são reprimidos a tal ponto de não deixar uma pessoa enxergar o óbvio ou querer sentir o inusitado, paralisavam-me.
O sentimento de culpa, o excesso de princípios, todas essas frustrações eram por mim assomadas em meio às vertigens, perturbações e deleite que sua masculinidade bem-avinda, tal qual turbilhão, me provocavam. Ass. Sua eterna e saudosa Analu".
Henrique leu o “e-mail” e seus olhos semicerraram-se. Parecia sorrir ante as lembranças agradabilíssimas dos colóquios de outrora com a ex-aluna que aspergia hálito de rosas silvestres. Ela era, de fato, muito especial. Sem demora, melhor dizendo, urgentemente expediu um telegrama para o Sr. Fernando Muniz de Almeida.
Na ocasião explicou que conseguiria uma solução para o estado de falência das empresas da família. Acreditava que investidores franceses poderiam ter interesse na compra do imóvel. Contudo, não houve tempo para essa solução ser posta em prática. Algo fora do comum, ou que estava fora do previsto ou estabelecido acontecera de inopino.
Analu, a menina-mulher, ex-aluna do autodidata, separou-se do marido e arranjou um emprego público mediante concurso. O destino, todavia, reservou algo de extraordinário para a batalhadora mulher que durante muito tempo inspirava o autodidata nos devaneios poéticos.
Ela não queria, mas resolveu jogar e foi a única ganhadora na supersena. Ganhou uma bolada de R$ 26.537.489,79 (vinte e seis milhões, quinhentos e trinta e sete mil, quatrocentos e oitenta e nove reais e setenta e nove centavos).
Ato contínuo comprou a casa dos sonhos coloridos, salvando as demais empresas da família Muniz e aguardou ansiosamente o regresso de Henrique, já com o curso de doutorado concluído, para juntos fazerem uma nova decoração com os móveis mais modernos, mais leves, menos soturnos e do agrado de ambos.
Era mais do que certo: Os sentimentos reclusos, rebeldes, reprimidos; obstados por conveniências estéreis; massificados pelos usos e costumes; edificados pelas convenções sociais, familiares, religiosas, seriam libertados pela superação de suas vontades assumidas.
Ela sabia do que ele gostava e ele também sabia dos gostos dela. Finalmente, por obra, força e graça do destino todos os desejos e anseios de ambos se realizariam na bendita casa dos sonhos coloridos.