O Alvorecer - 2º alvorecer

2º alvorecer

A morte, digna, verduga e curiosa, tratou de me chamar ainda quando as estrelas piscavam no céu. Ordenou-me que terminasse a história daquela senhora insatisfeita e assustada. Eu, iniciando exatamente do ponto em que havia interrompido, prossegui:

“O menino-ladrão, drogado e assustado, não tinha o menor controle sobre suas palavras e atitudes. Queria apenas roubar aquele carro, e talvez, se encontrasse alguma garota andando pela rua, aí então, lhe daria uma carona”.

_Nun-tenta-reagi!Cai-fora!Cai-fora! Ordenou o menino-ladrão, já desesperado.

A senhora, impressionada por tanta crueldade, não pensou duas vezes, pulou do carro como nunca havia saído antes, mas ainda assim teve reflexo para acionar o alarme. Esses veículos modernos possuem um sistema de segurança eficientíssimo, e mal o menino-ladrão passara pelo portão eletrônico, cortou-se o combustível. Ele, apavorado e inconformado, saiu em disparada. A senhora, ainda tremendo toda, gaguejou algumas palavras:

_Me ni no... me ni no... me nino, volte aqui!

O menino-ladrão, ofegante e preocupado, recebeu, indeciso e consternado, aquela voz que suplicava por sua presença. Parou de correr, e então, correu em direção contrária, ou seja, atendeu ao clamor da senhora, que acabara de assaltar.

_Qui-foi?Tá-machucada?Tô-puto-da-vida-ca-senhora, tá-sabeno?

_Meu filho, não me abandone. Ajuda-me a entrar em casa, e ajudar-te-ei a encontrares um caminho.

_Sei-não!Cê-nun-mi-ingana, tá-sabeno? Taca u braçu nas minha costa. Tô ferrado!

A senhora, ajudada pelo menino-ladrão, se conduziu a seus aposentos...

Não posso mais continuar essa maravilhosa história, pois sinto que o amanhecer está próximo, e o meu fim se aproxima.

_Conduzir-te para as escadarias da morte é o meu dever, e sei que já ganhaste um dia aos que te cabiam, entretanto, devo confessar-te que esta senhora me confunde a mente, e assim, dotada de todo poder sobre a vida, conceder-te-ei mais este dia, para amanhã continuares a partir do ponto que interrompeste. Por ora, devo dirigir-me para outras paradas, onde me aguardam alguns moribundos.