Uma estrela morena

O mundo já era esse mundão todo que se vê por aí, repleto de gente, bicho, coisa, planta e tudo mais que se cria, se inventa e se descobre. Parecia – sempre pareceu assim – tudo certinho, tudo conforme. Mas só parecia... porque, no fundo, faltava alguma coisa. O que, ninguém sabia precisar. Aliás, a maior parte do povo mal se dava conta de que realmente faltava algo, mas vivia e existia como se um pedacinho lhe faltasse...

Ora, foi numa destas tantas noites deste mundão que alguém se deu conta: faltava uma estrela no céu. Claro, justamente naquele montão de milhão de estrelas no céu estava faltando uma. No meio daquele não-acabar-mais de pontinhos luminosos faltava um brilho, um só brilho, coisa que só se podia perceber de noite e, mesmo assim, com tempo muito bom.

Mas faltava uma estrelinha – podia-se ver o vaziozinho num ponto qualquer daquele enorme luzeiro. E todas as gentes sabiam disso e buscavam jeitos de preencher o buraquinho na alma do céu. Tentaram de tudo! A terra emprestou enormes diamantes. Os mares ofereceram pérolas cintilantes. Os campos cederam vaga-lumes. A Aurora mandou orvalhos. As nuvens enviaram raios. Não faltaram nem as lâmpadas, as velas e os lampiões inventados pelos homens.

Nada adiantava. O vaziozinho continuava lá, opaco de tristeza.

Aí, o Senhor Criador se encheu de dó pelas gentes e pelo mundão que, a cada dia, entristecia um pouco. Primeiro, constatou que não dava pra fazer uma nova estrela – o material deu ali, na conta, faltando a última por fazer. Depois, mostrou pra toda a gente que ali, no mundão, havia tudo necessário pra se fazer uma estrela. E foi mostrando e foi fazendo: um pouco do negro da noite, um pouco do bronze do sol; umas gotas de perfumes das flores, uns pingos de sabores e cheiros das matas; o rosado da inocência e o púrpura da sedução; alguns sorrisos encantados e muitos trejeitos graciosos; uma pitada – só uma pitada – de melancolia e grandes doses de radiante alegria; por fim, a aura da mais feminina divindade e o brilho da mais pura lágrima.

E foi assim que o Senhor Criador presenteou este mundão com a estrelinha que faltava.

Muito tempo passou depois disso. E as gentes e os bichos e as coisas e as plantas e tudo mais que se cria e se inventa e se descobre, foi passando com o tempo. Mas a estrelinha continua lá, preenchendo o vaziozinho que tinha na alma do céu. E é tamanho o passar de tudo que nem todas as gentes se dão conta disso. Alguns, sim, alguns percebem e até se encantam de amor pela estrelinha, que, com o brilho de seus olhos, faz a noite ficar morena.

Histórias deste mundão.

Contos.

Luís Bustamante
Enviado por Luís Bustamante em 04/07/2008
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