O Menino que Pescava Estrelas
Estava o menino, na plena escuridão da noite, no alto do barranco que parecia pender pra baixo, como que se quisesse puxar as arvores, as pedras, as flores e os bichos, pra queda que havia sob ele.
E lá estava o menino, como toda noite ele estava.
Sentado na pedra, com sua vara de pescar, sem isca, sem nada.
Com um saco de pano, amarrado na boca, vazio, sem nada.
Mas com aquele sorriso feliz, de quem fez arte sem ser descoberto, isso era tudo.
Tudo de que o Coronel precisava, pra aguçar sua curiosidade, e pra procurar um motivo pra trancar o menino no quarto todas as noites.
Ele podia usar da desculpa de que o moleque o desobedecera
Ou melhor ainda, de que ele estava louco.
Mas ali, toda noite, enquanto via o menino lançar a vara, e examinar a ponta do anzol, inúmeras vezes, não se conteve.
- Que é que você faz aí menino? – perguntou um dia, sem deixar que o garoto o visse!
- Isso é coisa que eu não diria pra qualquer um, mas sua voz me é conhecida e posso dizer, – vozinha atrevida aquela – estou a pescar estrelas!
Bom, era disso que o Coronel precisava.
De uma desculpa pra trancar o moleque com sua loucura
Mas essa loucura seria extravagante demais, pescar estrelas era coisa de gente doida de pedra.
E o Coronel decidiu deixar o menino em paz
Voltou pra casa grande, e deitou na sua cama.
E o menino, lá no alto do morro, ainda ria baixinho.
Conversando com as estrelas que tinha dentro do saco, que lhe iluminavam a face com sua cor dourada e forte, e riam com ele, dos humanos que ainda achavam que pescar estrelas era tolice.
Era a mais sensata das coisas, isso sim.
Quando se pesca uma estrela, nasce outra em seu lugar.
O céu nunca se apaga, e a criança nunca se apega.
Hora ou outra a estrela pescada já não acende mais
Aí se pesca outra
Assim, sem isca, sem nada.
Com vara, mais nada.
A linha com o anzol na ponta, o anzol, sem nada na ponta.
Só os olhos de criança, mais nada.