O Último Dia

(Texto extraído do livro "Ao Cair A Noite")

Imaginemos que amanhã, nesse mesmo horário, o mundo e tudo que ele contém deixará de existir. Apenas 24 horas de vida para nós, nossos pais e nossos filhos. O que fazer?

As possibilidades são tantas que poderíamos até passar as próximas 24 horas pensando no que fazer. Uma grande parte da população procuraria conforto em alguma religião. Outros fugiriam para longe, como se a distância pudesse amenizar os efeitos do fim global.

Mas, e senão fizéssemos nada disso? E se vivêssemos nossas vidas como sempre temos vivido?

“O Último Dia”, conta como algumas pessoas resolveram encararam o fim e o que de bom puderam tirar ou fazer antes dele chegar. E também, o que de pior ainda estaria por vir...

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O Último Dia

O mundo todo ficou sabendo que não houve alteração na rota do maior cometa de que se tem notícias. “O choque, infelizmente, será inevitável!”, foi a conclusão descarregada como flexa no coração de todos. E os jornalistas que noticiavam o fato inacreditável, não paravam de repetir que o impacto ocorrerá em exatas 24 horas.

Um deles, sem se preocupar que estava sendo ouvido no mundo todo, levantou-se, respirou profundamente e falou:

— Sinto muito ser o portador de tão más notícias. Aproveitem bem esse tempo tão preciso que nos resta... tempo esse, até então, dispensável... — e saiu sem se despedir.

A tristeza foi global, apesar de todos já esperarem o pior. A impressa vinha há mais de dois meses esclarecendo e preparando as pessoas. O pânico foi apenas fato isolado que ocorreu em alguns locais. A maioria deixou que o destino seguisse seu rumo... e seguiu.

* * *

David Field recebera tão impossível notícia em sua casa de campo. Preparava-se para levantar quando o telefone tocou. Era seu filho, ligando para se despedir do pai, pois já estava de saída para as montanhas, fato comum devido à situação.

— Não posso conceber tal afirmação... não entra em minha cabeça que isso seja possível! Você deve estar enganado, meu filho...

Foi então que Field, aconselhado por seu filho, usa o controle remoto para ligar a TV. Tudo tornou-se escuro e sua cabeça começou a doer. Field, após alguns minutos observando as notícias “inconcebíveis”, pede para falar com seus netos e com sua nora. Despede-se por fim de seu filho, com as palavras travando na garganta seca... os olhos vermelhos e brilhantes.

Resolve levantar-se. Como de praxe, realiza seu tão inseparável ritual: vestir primeiro a meia no pé esquerdo, depois no direto. Calçar o sapato direito, depois o esquerdo.

Após um longo café da manhã, Field vai até seu escritório. Resolve rever as correspondências que estão em cima de sua mesa. Contas, cartas de fãs e uma carta, rara, de seu editor. Decide, então, lê-la novamente. Dizia que seu último livro superou a expectativa de vendagem e que já estava entre os dez mais vendidos. “O mundo todo lê David Field”, fala, reproduzindo palavra por palavra da carta, lentamente. Fecha os olhos, exita por alguns segundos e, por

fim, amassa e joga a carta no lixo.

Acessa a Internet e envia por E-Mail para todos que conhece, incluindo jornais, revistas e editoras, os originais de seu próximo livro. “Seria um

sucesso, tenho certeza!”, exclama para si mesmo, enquanto o computador envia os arquivos. Finaliza com um “pena que ninguém lerá... jamais!”. Desliga o computador pela última vez. E sai do escritório.

Um sorriso parece surgir por trás do rosto abatido de Field, ao ver seu novo e melhor amigo, Oddie, um cãozinho que acabara de ganhar de uma fã. Pega-o no colo e sai da casa, não trancando as portas.

Dirige-se ao seu lugar preferido, palco de várias inspirações, trabalhos maravilhosos: uma linda colina, coberta pela grama mais verde e homogênea da região.

Sentou-se à sombra da solitária árvore, que plantara quando seu pai ainda era vivo. Soltou Oddie, que correu por direções aleatórias, seguindo seus extintos.

Recostou-se e olhou para a imensidão do horizonte; para as nuvens raras; para o azul hipnotizante do céu; para a vida vegetal que cobria a todo o terreno; para os pássaros; para os insetos...

Respirou fundo, balançou a cabeça lentamente, permitindo-se um discreto sorriso. “Não importa se a folha, verde, seque e caia... o que realmente importa é que pude apreciar a beleza de cada momento.”, fala em voz alta, de certo modo alegre, enquanto uma lágrima, antes solitária, era agora acompanhada por outra, e mais outra, deslizando por sua face, marcada pelo tempo.

* * *

A pequena Susy distraía-se brincando com seus amiguinhos de pelúcia, enquanto sua avó, Sra. Wésia Pryor a olhava de longe, há mais de vinte minutos. Chorava só, escondida da neta.

Wésia sempre fora uma mulher forte e determinada a vencer. Perdera o marido há muito tempo. Chamavam-no de Bravo Jonh porque já conseguira vencer, com as mãos vazias, um descontrolado urso. Cidade pequena, logo o fato espantoso espalhou-se como praga. O tempo ia passando, ao invés de um urso apenas, Bravo Jonh já havia enfrentado, de uma vez só, oito ursos ferozes, como dizia os moradores empolgados.

Mesmo com o tamanho preconceito da época, Wésia assumira o lugar de seu marido na empresa que ambos haviam fundado. Dirigia, com extrema habilidade, a “Soft&Soft Ltd.”, cuja principal área de atuação era a produção de softwares infantis e pedagógicos. A “professora Pryor”, como era conhecida na empresa, idealizava os programas para ajudar crianças com deficiência na aprendizagem, principalmente as altistas.

— Susy, meu bem? Vem aqui na vovó que ela vai te contar uma história.

Foi necessário chamá-la três vezes, até que Susy aceitasse largar seus brinquedos. Mesmo assim, foi de encontro à avó, arrastando o pesado Leo, um leão de pelúcia.

— Querida, sente aqui no colo da vovó. Eu gostaria de contar uma história para você.

Susy imediatamente desiste de arrastar o Puff e corre para o colo de Wésia. O sorriso lhe é transparente, pois todas as noites ao deitar, ouve atenta as mais fantásticas histórias que sua avó conta, a maioria, inventada na hora.

— Está história é diferente das outras — fala, enquanto passa as mãos cansadas nos lindos cabelos loiros de Susy, que herdou de sua mãe, falecida há três anos. Como Wésia não teve outros filhos, Susy é a única família que conhece...

— Conta como uma menininha foi corajosa e ajudou sua avó nas dificuldades que surgiram. — continua, mantendo sempre o tom da voz suave, o que, naquele momento, era por demais difícil

A pequena Susy ficava calada, ouvindo atentamente tudo o que sua avó dizia.

— Essa menina queria ir para o céu, por isso ajudava sua avó nas tarefas de casa e sempre rezava antes das refeições e na hora de dormir.

— Eu também faço isso, vovó! — Exclama, com um sorriso brilhante e puro.

— Vovó sabe que você faz isso. Você quer ir para o céu?

— Claro que quero! Quem não quer? — mostra convicção, pois, devido à suas aulas de catequese, era pecado não desejar ir para o céu.

— E minha filhinha sabe o que é o céu?

— Sei vovó, é o lugar mais lindo que existe. Lá não há pessoas más, ninguém sente fome ou frio. É no céu que mamãe e o vovô estão, não é vovó?

— Sim, isso mesmo. Eles estão lá, esperando por nós.

— Eu queria ver a mamãe de novo e conhecer o vovó. Ele é tão bonito naquela foto que você tem guardada na gaveta. Vovó, quando vamos para o céu?

Wésia lembra por um instante da foto que Susy mencionara. Foi tirada às margens do rio que atravessava a fazenda que possuíam antes de mudarem para a cidade. Estavam em lua de mel. Segundo dia de casados. Ela pensa no amor que tinha por ele, na intensidade desse sentimento. Sabe que não diminuiu em nada, depois de todos esses anos.

— Quando vamos para o céu? — volta à realidade, olhando para sua neta, que sorri e sacode a cabeça, concordando. — Bem, era sobre isso que eu queria falar com você. Vai acontecer uma coisa amanhã... — fala pausadamente, no jeito típico de dizer coisas importantes para crianças pequenas.

— O que vai acontecer amanhã, vovó? — intrigada, Susy tenta levantar-se, mas Wésia a convence a ficar deitada em seu colo.

— Vai cair um cometa, uma pedra bem grande de gelo, aqui na Terra. Ele vai vir bem rápido, do céu.

— E por que, vovô, esse cometa vai cair aqui?

— Bem, minha filha, Deus quis assim.

— E o que vai acontecer com a gente? — Susy, não suportando mais ficar deitada, senta-se, pois está muito interessada no assunto.

Wésia olha para sua neta, buscando palavras.

— A gente vai morrer? — adianta-se, forçando sua avó a responder.

— Sim, nós vamos morrer. — responde melancolicamente, não podendo mais contornar o assunto.

— Mas por que Deus quer que a gente morra?

Outra vez Wésia passa a mão nos cabelos de Susy. Não se cansa de olhá-la e vê que criança linda ela está se tornando, dia-à-dia.

— Não sei, minha neta. Talvez porque Deus quer que nós encontramos sua mãe e seu avô novamente, no céu.

— Quer dizer que quando a gente morrer nós vamos encontrar com a mamãe e com o vovô? — pergunta, já formando-se em seu rosto um suave sorriso, que aumenta a cada momento.

— Sim, quando a gente morrer nos encontraremos eles.

Susy abraça sua avó calorosamente. Não consegue conter sua alegria.

— Então, Susy, vamos ser fortes para que possamos logo ver mamãe e vovô, viu? — Wésia quer mesmo é dar um ponto final nesse assunto, pois ele é doloroso demais para ela.

— Eu sou forte vovó, você vai ver! Não terei medo! — a pequena Susy mostra toda sua segurança. Segurança está que fortalece sua avó. — Mas vovó? — continua — Ainda vai demorar muito?

Wésia não consegue conter as lágrimas ao ouvir a pergunta de Susy, pergunta está que seria repetida várias vezes, no decorrer do dia. Abraça mais forte ainda sua neta. Fecha os olhos, pois tudo mais parece rodar. Respira profundamente e fala, não contendo os soluços:

— Não, meu amor, não vai demorar!

* * *

O gosto amargo não o deixava dormir mais, anexado à intensa sede. Não pode negar que bebera em exagero à noite passada.

Depois de tentar disfarçar o gosto da boca e de saciar, mesmo que momentaneamente, a sede, vai até a varanda olhar o dia, pois não sente-se à vontade em “ler” o relógio. O sol já está alto, o mais alto que consegue chegar. “meio-dia”, deduz, deixando as cortinas entreabertas e uma leve brisa marítima invade suavemente sua casa.

Acha o cúmulo ter ele mesmo que preparar sua refeição. Nenhum dos seis empregados ficou. Todos foram para suas famílias passar o “dia” com os entes queridos.

Após saborear uma comida meio sem cor e sem tempero, abre seu melhor uísque e começa a rotina dos últimos meses, desde que fora colocado longe dos cenários políticos do país. Simplesmente, admitiu que aquela fortuna em sua conta corrente era oriunda da “sorte divina”. “Deus me ajudou e, no fim, fui recompensado: ganhei dinheiro.”, disse com a cara mais lavado do mundo. Seu olhar de impunidade revoltou toda a nação. O pior era que ele queria que todos acreditasse que ganhou sozinho, duzentas vezes na loteria. As probabilidades de isso acontecer são as mesmas, ou menos, de que sua casa seja atingida duas vezes por meteoritos, com intervalo de vinte e quatro horas.

A bebida tornou-se sua nova e única companheira, já que a mulher e os filhos o abandonaram, humilhados publicamente pela imprensa.

Fixa o olhar em algum ponto qualquer da sala, enquanto o líqüido da garrafa vai diminuindo até secar-se por completo. Quando nota o fato, abre outra e mais outra garrafa.

Seus sentidos estão alterados e a mente, confusa. Começa a ter lembranças aleatórias. O primeiro dia de aula, Veronika, seu verdadeiro amor, o primeiro milhão, a eleição, como o dinheiro era fácil ser ganho, o governo que continua do mesmo jeito: corrupto.

Lembra-se de suas aulas de catecismo, em que a catequista dizia, lendo a bíblica: Os bons herdarão o Reino dos Céus...

“E eu?”

Tenta-se levantar-se, caindo novamente.

“O que eu fiz?”

Vai se arrastando em direção do quarto.

“Quantos não morreram por minha culpa?”

A casa é grande e luxuosa. Sabe que custou mais ou menos “oito hospitais públicos”. Desviara, com a ajuda de alguns “amigos” poderosos, metade da verba para a construção dos mesmos.

“Por que tem que ser assim?”

Chega à porta do quarto e, com a ajuda de uma mesa, ergue-se até a maçaneta, girando-a, fazendo com que a porta abra-se. Deixa-se cair e continua arrastando-se em direção da cama.

Quando consegue deitar-se, nota que em seu relógio de pulso já passa das 15h.

“O tempo é implacável!”

Olha para as luzes do teto. Respira fundo e termina de tomar sua bebida, que arrastara desde a sala.

“Todos fazem o que fiz!”

Por fim, estende a mão e, de dentro da gaveta ao lado da cama, pega uma arma que ganhara de um juiz qualquer, há muito.

“Quantas vezes ficamos juntos, aqui na cama?”

É verdade. Em várias situações, todas auxiliadas pela bebida, encontrava-se no fim do poço. Sua vida ficava à suas mãos. Mas na hora “H”, sempre desistia.

“Dessa vez não há esperanças!”

Engatilha a arma, sempre carregada e pronta para a ação. Descansa-a no peito e respira fundo. Espera.

“Sinto muito!”

“Sinto muito!”

“Sinto...”

* * *

— A Terra é azul!

Jonh fala em voz alta, mas os outros três tripulantes não dão atenção. Estão muito ocupados nos videofones.

Liz está com seu marido e filho na tela. Choram muito.

“Eu queria estar ai...”, Liz fala sem parar.

— Nós queríamos que estivesse aqui conosco, meu amor! – responde Michael, seu marido, enquanto abraça o pequeno Júnior.

A vida de casada de Liz não fora das melhores. Não até entrar no serviço espacial, era só dificuldades. O dinheiro era curto e o pouco que tinham, Michael gastava com jogos, farras e mulheres. Liz sabia disso, mas fingia que não via. Até que tornou-se visível demais, pois Michael não dormia mais em casa.

Um certo dia, ao voltar para casa embriagado, Michael resolve cortar caminho e ir por um atalho. Não conseguia dirigir mesmo e o jeito foi ir andando mais de quatro quilômetros. Quando já faltava cerca de oitocentos metros para chegar em casa, Michael foi surpreendido por três assaltantes. Em segundos, estava estirado no chão, com dois tiros alojados no tórax. Mas ainda tinha a carteira entre as mãos.

A Chuva aumentava cada vez mais. A consciência voltou novamente, mas dessa vez, era como se tudo fosse um sonho. “É o fim...”, pensava Michael. Abriu a carteira e pegou uma foto que nunca mais dera importância. Nela, dois sorrisos o cumprimentavam. Um, com a inocência de uma criança. O outro, com o amor e a dedicação de uma mulher. “Não sou nada...”, tenta falar. A fraqueza toma conta. A fotografia cai lentamente e é levada pela água da chuva. Seus olhos se fecham. Escuridão e perda da noção total do tempo. Seus olhos se abrem. Um vulto se aproxima. “Quem é?”, pensa. Começa a ouvir umas palavras e tenta entendê-las... “Michael... o que acont... você está bem?”. Era ela.

Liz não sabia, mas seu coração falava para ela sair e procurá-lo. Não resistiu mais e saiu a esmo, pelas ruas alagadas do bairro. Num determinado momento, vê uma pessoa caída. Não se aproxima muito, com receio. Quando nota a velha calça azul, não mais tem dúvidas. Corre em sua direção e tenta acordá-lo. Nota o sangue. Se desespera. “Telefone!”. Liga para o hospital. Nove minutos depois, os paramédicos tomavam conta da situação. Estava a salvo.

Depois disso, a vida dos dois mudou completamente. Ele parou de beber e sempre estava em casa, após o trabalho. Ela realizou o sonho de sua vida: astronauta. “Vou olhar por vocês lá de cima!”. Disse para Michael quando soube que passara nos testes.

— Estarei rezando por vocês!” — disse ela, tentando enxugar as lágrimas.

— Chora não, mamãe! — fala o pequeno Júnior, já preocupado pelas lágrimas dos dois.

— Eu gostaria de está ai... eu daria TUDO para estar ai... — num murmúrio sem fim.

— Você está aqui, meu amor... você sempre esteve aqui... — fala Michael e pela última vez vê o rosto de Liz... seu tempo acabou... o vídeo se enche de ruídos. Era a vez de outro astronauta usar o videofone.

Marcos está com a mãe. Não falam nada, apenas se olham. “Tanto para dizer”, pensa enquanto olha para o rosto da mãe, marcado pelo tempo. Tenta lembrar da beleza que era seu sorriso. Do brilho de seus olhos. Da energia que emanava de sua bela voz de contralto. Virtudes que desapareceram há dois anos, assim que seu pai morreu. De lá para cá, não conseguia mais manter diálogos com ela. Apenas brigas ocasionais. Sempre que se encontravam, um acabava por magoar o outro, mesmo que inconscientemente.

— Mãe... — fala com a voz trêmula. Os olhos dela se enchem de lágrimas.

— Mãe... — repete, de forma mais forte. — me perdoa mãe!??

Ela não responde. Ele começa a chorar.

— Me perdoa, mãe? — o silêncio ainda continua.

— Me perdoa, mãe! — fala, em soluços — se eu já não conseguia viver com essa dor, ainda mais morrer sabendo que a senhora ainda guarda mágoas de mim.

A velha senhora passa as mãos sobre os cabelos grisalhos e tenta enxugar as lágrimas.

— Me perdoa, mãe... — tenta mais uma vez. Espera em vão. A baixa a cabeça.

Marcos estende a mão para desligar o videofone. Quando ia desligar, ouve uma voz que não ouvia há mais de dois anos. Era uma voz cansada, mas, para ele, era a mais linda voz de contralto do mundo.

— Me perdoa você, meu filhinho... — ela passa a mão no monitor como se estivesse acariciando o rosto dele.

Marcos não consegue falar mais nada. Sua voz sumiu. Apenas os soluços altíssimos continuam. Ele fica olhando a mãe passar delicadamente a mão no vídeo. Ele estende a mão, indo de encontro a dela, virtualmente.

— Eu te amo, mãe!

— Eu sempre te amei, meu filhinho...

E a ligação é finalizada.

— Ainda bem que eu não tenho ninguém... — Fala Jonh, vendo o desespero dos outros. Volta-se para a escotilha.

“Jamais tive ninguém mesmo!”.

Jonh nunca dera tanta importância àquela visão. Estivera tão ocupado os últimos anos. “A Terra é azul!”, não consegue parar de repetir Gagarin, seu ídolo desde criança.

“Todo mundo deveria ter o direito de ver como é linda nossa Terra, pelo menos uma vez na vida...”

O tempo está quase no fim. Como tudo que tem um começo, tem um fim. O da humanidade chegou. A maioria apostou que seria causada pelo próprio homem. Mas, mesmo com tantos esforços para isso, não foi “dessa vez”. A natureza ganhou. O universo quer de novo todos os

átomos que se condensaram há bilhões de anos. Do pó ao pó.

Pela escotilha já se pode ver os dois astros. O juízo final vindo através da impensável velocidade de uma bola de gelo estelar. O outro, a residência e o jazigo de mais de 9 bilhões de pessoas, com seus medos, suas falhas e suas esperanças.

“Contagem regressiva: 10 segundos”

O computador de bordo informa: dez segundos para o impacto final.

“7 segundos”

“4 segundos”

— Ah! Meu filho, pequeno Júnior... você só tem quatro anos...

“2 segundos”

— Fica com Deus mãe... fique em paz!

Silêncio (o som não se propaga no vácuo).

Luz... apenas luz... e o fim. Rápido e inconcebível.

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