ANTÔNIO DELFINA
Conheci meu pai usando um revólver calibre 38 atacado na cintura e uma cartucheira com no mínimo vinte balas. Órfão de pai aos seis anos, casou-se muito cedo com Antônia, filha mais nova de seu padrasto Mariano Grande. Conhecido também por Antônio Vermelho, devido à cor a vermelhada de sua pele, seu Antônio não se importava com este apelido, mas não gostava quando o chamavam de Antônio de Delfina.
As razões que o faziam andar armado, não eram tanto para arrotar valentia, mas para impor respeito. Pai de onze filhas mulheres, parava muito pouco em casa, pois sua principal atividade era mangalheiro. Viajava tocando tropa para o Maranhão, Pará e Goiás, vendendo alho, cebola e outros mangalhos, e, apesar de sua constante ausência por trinta, sessenta ou mais dias durante cada viagem, ninguém jamais encostou o dedo em nenhuma de suas filhas ou disse alguma pilhéria com alguma delas, que, para os padrões da região eram consideradas bonitas.
Sério e trabalhador, costuma dizer que homem nenhum pegava em sua perna, significando que não fazia falcatruas nem contava mentiras. Muito rigoroso na criação dos filhos mais velhos, relaxou um pouco em sua meia idade, principalmente, depois que lhe nascera Bertim, o terceiro filho homem da rebanhada de quatorze filhos.. Numa de suas ficadas com a família, resolvera reformar o cercado de sua casa no Rodeador. Seguido pelos dois filhos homens que ainda moravam sob seu teto, caminhavam a passos largos da Fazenda São Paulo até o povoado. Precisavam vencer, aproximadamente, três quilômetros até alcançarem o local onde deveriam trabalhar o dia todo. Durante a caminhada, o Velho conversava repassando suas experiências de viagem e negócios que fazia, e, por fim, concluiu uma história, dizendo: “Homem nenhum pega em minha perna”. Nisso, o filho mais moço dá um pulo e gruda nas pernas do pai. Em outros tempos, talvez essa atitude custasse ao filho umas duas ou três cipoadas, mas neste caso, o velho apenas olhou o cançula pegando em sua perna. Sem nenhum ar de repreensão exclamou: “Sê besta moleque”. E continuaram a caminhar em direção ao trabalho.
Sua vida foi cheia de aventuras, glórias e inglórias, mas de nada reclamava. Certa vez, limpando um roçado de mandioca, Bertim, com apenas dez anos, parou para dar de mamar à enxada
Enquanto descansava, viu as roupas de seu pai pegando fogo, pois ele tinha o hábito de trabalhar apenas de ceroulas.
- Pai, a roupa do Senhor tá pegando fogo!
Os dois correram apressados e jogaram areia, conseguindo conter as chamas, mas parte do dinheiro que estava no bolso, queimou.
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Adalberto Antônio de Lima