Um Reveillon para Esquecer

31 de dezembro. Praia, amigos, cervejada. Eu não tinha bebido nada ainda, me reservando para o champanha. Minhas perspectivas para a entrada do ano novo eram as melhores possíveis. Faltando uma hora mais ou menos para a meia noite, iríamos todos sair da casa da Adri e rumar para a beira da praia. Tudo isto regado a muita farra, muita diversão, muita risada. Lá, eu encontraria o Guto. Eram poucos na minha turma que sabiam quem era o Guto. Ele era meu colega de faculdade e a gente passara os dois últimos meses do ano, trocando olhares, sorrisinhos, algumas poucas palavras. Resumindo, eu tava muito a fim de entrar o ano novo pendurada no pescoço dele. E os sinais que ele emitira me pareceram ser recíprocos. Minha prima Vanda descobriu que ele passaria o Reveillon na mesma praia que eu. Bingo! Tudo se encaminhava para o sucesso total.

Comprei um vestidinho branco, a coisa mais fofa, para a ocasião. Era meio transparente, um pouco esvoaçante, sentia-me a mais linda da praia quando botei os pés na areia. Já tinha um monte de gente lá. Olhei ao redor, ansiosa, mas nem sinal do Guto. Fiquei um pouco apreensiva, mas tentei relaxar. Afinal, eram apenas 11 horas da noite. Ele podia deixar para vir mais próximo da meia noite.

Cinco minutos depois, cutuquei a Vanda e perguntei:

- Você tem certeza que era para esta praia mesmo que o Guto disse que vinha?

Vanda me olhou, despreocupada, e garantiu:

- Tenho.

De novo tentei relaxar. Comecei a falar besteira para disfarçar meu nervosismo enquanto o Guto não vinha. Felizmente ninguém ali sabia da minha paixão. Só eu e a Vanda. E a Vanda nem aí. Uma taça de plástico de champanha apareceu na minha mão como um passe de mágica. Dei alguns golinhos somente porque eu queria entrar no ano novo totalmente sóbria. Do Guto, nem sinal.

11 horas e 45 minutos. Eu lá, já com a segunda taça de plástico de champanha na minha mão. Já estava rindo de qualquer coisa, quando a Vanda me deu um cutucão nada discreto e disse:

- Olha para a tua direita…

Eu sabia. O Guto havia chegado. Preparei meu melhor olhar, aquele conquistador, e fui me virando devagarzinho, quase em câmera lenta. Eu fiquei toda a tarde ensaiando meu jogo de sedução. Joguei meu cabelo para trás e me deparei direto com os olhos do Guto.

Ele estava uma graça, apesar de um pouco estranho todo de branco. Meio pai de santo, mas tudo bem. Era o Guto. Ele estava lá. Viera para a praia. E estava me olhando! Lancei meu sorriso, também exaustivamente ensaiado. Só que ele não sorriu para mim. Desviou o olhar, constrangido. Então que me dei conta. Ao lado dele estava uma linda loira, que me encarava furiosamente. Custou dois segundos para cair a ficha e eu me dar conta que o canalha estava acompanhado da namorada. Mais tarde, dias depois, fui descobrir que a loira fatal era noiva dele.

Tentei manter a dignidade. Felizmente ninguém percebeu nada, a não ser eu, o Guto e a loira. Naquela multidão que já estava na beira da praia, ninguém foi testemunha da minha cara de bunda a 15 minutos de começar o novo ano. Para mim, por sinal, tudo já havia acabado. Minhas boas intenções haviam ido para o espaço – junto com o Guto. Tive vontade de ir para casa. Procurei a Vanda com os olhos para desabafar, mas ela estava aos beijos com um cara que eu nunca tinha visto.

Acordei dia primeiro de janeiro com uma enorme enxaqueca. A Vanda estava do meu lado, com uma cara de poucos amigos. Então ela foi me contando... Primeiro eu tive que ser retirada do mar por um amigo meu. Diz a Vanda que comecei a saltar ondas logo depois da meia noite e quando viram eu já estava quase me afogando. Pior que estava tudo registrado na câmera digital dela. Depois, resolvi ser agradável com todos os homens que estavam ao meu redor, inclusive desconhecidos. Fui retirada da areia quando fui ameaçada de linchamento por parte das mulheres que os acompanhavam. E para finalizar, vomitei todo o caminho de volta para casa e fui carregada no colo pelo novo affair da Vanda. Por pouco não entrei em coma alcoólico e tudo isto nas primeiras horas da manhã. Fiquei imaginando se o Guto teria testemunhado tudo aquilo: eu me afogando, quase sendo linchada e vomitando pelas ruas da praia. Fiz tudo o que meus pais recomendaram que eu não fizesse e ainda por cima a Vanda estava ameaçando de contar tudo para eles.

Passei um vexame do tamanho do Brasil por causa de um homem. Um homem que nem meu namorado era. Simplesmente, um flerte. Se eu queria grandes emoções, já tinha implodido a cota do ano inteiro. Agora me restavam apenas 364 dias para superar a vergonha, levantar a cabeça e matar o Guto.

Patrícia da Fonseca
Enviado por Patrícia da Fonseca em 01/01/2006
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