Jogo sujo

O ambiente do botequim de subúrbio não poderia ser pior.

Diziam – esta gente diz tudo – que ali se encontravam usuários de drogas permitidas, aquelas que você encontra nas farmácias, como xarope e analgésicos que misturados com álcool, dão um efeito funesto.

Numa mesa de fundo, onde garrafas eram recolhidas pelo garçom único, num mal enjambrado uniforme, que de limpo não tinha nada, como o lugar e os freqüentadores, estavam sentados uns homens mal-encarados que jogavam cartas. Parecia o famoso quadro de Cézanne; mas os tipos não possuíam a distinção dos dois fumantes. Eram marginais mesmo, que não tendo o que fazer, tomavam cerveja e batida de limão, com ovos de codorna, queijo e azeitonas. Vagabundos mesmo; um deles estava tentando introduzir o daime como mercadoria de consumo, fazendo frente ao caro ecstasy, em plena moda e mais perigoso para a saúde.

- Está blefando, Dino.

- Você acha? Paga para ver.

- Sabe qual é o castigo para quem quer passar a perna aqui?

- Sei e não sou otário de desrespeitar as regras, Janjão.

Este tipo, o Janjão, era o mais conhecido no local. Famoso traficante, em liberdade condicional, só andava de preto e gostava de apostar alto. O vinte e um que jogavam era um misto de pôquer com o famoso e tradicional black jack dos cassinos.

- Pago para ver – e depositou o dinheiro vivo na mesa.

O outro virou as cartas. Três cartas com o número sete e uma figura, uma dama. Na pedida, tinha dois setes e a dama. Deveria parar, mas quis mais. Ganhou um sete e explodiu, estava com vinte e um pontos e meio.

Perdeu sem reclamar.

Mais batida, mais cigarros, mais uma rodada.

- Dino, a Celeste ainda está na ativa ou ficou gamada por algum vagabundo?

- Não sei não. Ainda está interessado nela?

- Interessado na Celeste, homem? Ficou doido?

- Ué, tudo é possível. É uma bela morena!

- Bela pros negos dela! Comigo nem pensar.

- Então não entendi o motivo da pergunta, Janjão.

- Não entendeu porque é burro. Quero me aproveitar, e só.

- Celeste anda cobrando caro. Mas para você, o serviço é de graça.

- Quem te disse? Ela?

- Ela não me disse nada, mas tá na cara que não vai te pedir um centavo.

A conversa sobre mulher incentivou Dino a fazer uma rápida manobra com as cartas. Deu certo, ganhou a parada, um dinheirão.

Mas está até hoje sem receber. Levou um tiro de quarenta e cinco entre os dentes...