Os fedaputas

Estava chegando a minha casa por volta das vinte e duas horas, a rua estava, como sempre, bem movimentada e eu muito apressada.

Enquanto procurava pela chave em minha bolsa observava com certa atenção a três crianças bem carentes que moram, praticamente, na rua. Eram dois meninos e uma menina, ela parecia ainda não ter completado os quatro anos de idade, os meninos aparentavam ter de seis a sete anos aproximadamente. Eles arrastavam a menina pela rua, enquanto ela chorava e falava:- Fedaputa, me solta! E quanto mais eles a arrastavam, mais ela reclamava. Não pude conter-me e comovida, tentei um diálogo com eles e disse:- Faz isso com ela não, ela é tão linda! Nesse mesmo instante eles a soltaram, mas ela insistiu chorando alto e gritando:- Fedaputa, fedaputa!

Foi ai que me aproximei e disse a ela:- Fala assim não, você é tão bonita! Ela gritava comigo e dizia:- Mas você é feia, você é feia! E eu disse:- Eu sei que sou feia, mas e daí? Você é linda, muito bonita mesmo!

Ainda com seu rostinho coberto por lágrimas ela sorriu meio sem jeito e perguntou:- Eu sou? E continuei falando:- Claro que é. Você é muito bonita mesmo! Ela respirou fundo. Fez um olhar de menina dengosa e disse:- É eu sou bonita! Os meninos continuavam ali parados olhando o desfecho da história e vendo-a sorrir, sorriram dócilmente. Ela saiu meio faceira falando baixinho:- Eu sou bonita! Eu sou bonita! E eles foram embora com ela já bem mais calmos. Senti meu coração um pouco mais leve, mas deu um nó na garganta e muita vontade de levá-la pra casa. Já havia esquecido a tal pressa e fiquei a olhar a rua. Lembrei de uma menina que há alguns anos passados estava sentada na porta de um bar com suas duas irmãs, já se aproximava da meia noite e era natal.

Seus olhos perdiam-se no céu olhando os fogos, pois eles eram de graça e também era apenas o que elas tinham de natal. Hoje a mais velha delas trabalha numa casa de prostituição já faz algum tempo. Á ceia de natal que levei pra elas naquela noite, não foi o bastante, eu poderia ter feito mais e não fiz. Neste momento estou pensando em fazer alguma coisa pela menina linda de hoje, mas ainda não sei o que farei. De uma coisa tenho certeza, não posso esperar muito. Elas crescem depressa demais e sempre haverá uma vaga nessas casas e pessoas dispostas a pagar barato por serviços tão difíceis.

“E pensar que sou obrigada a votar nesses fedaputas.”

Lili ribeiro