Adote um Coração

Vende-se um coração. Mais propriamente, o meu. Dei um basta. Cansei de oferece-lo, com a maior das boas intenções, para várias pessoas que julguei merecerem um coração tão doce, tão gentil, tão racional.

Juro que ele está em boas condições. Nunca deu nenhum susto em mim, a não ser em casos de finais de campeonato, filmes emotivos e, principalmente, em casos de amor. Falando nisto – em casos de amor – meu coração muito já sofreu. Já bateu muito rápido ao avistar seu grande amor dobrando a esquina. E já quase sucumbiu quando outros amores foram embora. Mas eu continuo jurando: meu coração é forte. Pois ele resistiu a todos estes percalços. Continua aqui, dentro do meu peito, batendo forte.

Só que eu cansei. Deixo bem claro isto. Eu cansei, ele, o coração, não. Até já estou constrangida. Não tenho mais condições de encarar meu coração. Já fiz sofrê-lo tanto que não posso mais guarda-lo dentro do meu peito. Por isto, decidi vende-lo.

Vender… isto me pareceu agora tão definitivo! Será que vou poder ficar longe dele, suportar saber que ele bate em outro peito e que, talvez, até seja mais feliz? Então, vou trocar o anúncio. Agora vou aluga-lo. Assim, depois de algum tempo, ele retorna para mim.

Pior de tudo é se meu coração não quiser mais voltar. Vai ser duro saber que ele bateu mais feliz no peito de outro alguém. E o que vou fazer? Chorar não vou. Até porque vou estar sem coração algum. Sem emoção alguma, sem mais razões para rir ou me debulhar em lágrimas. Pensando bem, acho que não é boa idéia nem alugar e nem vender meu coração.

Mas se alguém aí do outro lado souber de uma pessoa legal que queira adotar a dona de um coração sofrido, por favor, me avise. É que eu já não lembro mais o que é um palpitar alegre, aquele tum-tum-tum que faz o olho brilhar. Eu vejo tantos olhos brilhantes quando ando na rua e parece que é só os meus que vivem nas sombras.

Vou ficar com o meu coração para mim, está decidido. E torcer para que ele comece a bater mais feliz nos finais de campeonato, nos filmes emotivos e, principalmente, nos meus casos de amor

Patrícia da Fonseca
Enviado por Patrícia da Fonseca em 29/12/2005
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