VOVÓ CHEGOU PARA VISITAR


        Minha avó foi pessoa marcante em minha vida.. Dela guardo as mais doces lembranças. Sempre ativa, deixava-nos à vontade quando de suas visitas à nossa casa. Envolvia-se em nossas  brincadeiras como criança que não pensa na vida.  Com ela, não era dificil encontrar caminhos. Pelo contrario, ensinava que o "querer é poder", bastava ter coragem, perseverança nos nossos propósitos que os nossos sonhos se transformariam em realidade.
      Sua lembrança é muito doce para mim. Gosto de alimenta-la. Ela me faz bem. Quando me sinto triste e fraca diante das vicissitudes da vida lembro-me dela. É uma  saudade doída e gostosa que me levanta o ânimo nas horas tristes.
     Fui a filha mais velha num lar de três irmãos. Minha mãe trabalhava para fora. A mim eram delegadas algumas responsabilidades da casa. principalmente deixar a cozinha limpa e os irmãos menores com os deveres de casa feitos e uniforme passado para o próximo dia de escola. Era a hora em que eu deixava de ser criança e me tomava ares de importância, chegando até a dar ordens aos  meus  irmãos ; que não eram lá muito obedecidas, mas aliviavam a tensão e a responsabilidde, que me cabiam na ausência de minha mãe.
     Quando vovó chegava, era uma  festa!  Para mim e para meus  irmãos pois tinhamos a certeza de que por tras daquela senhora simpática, de doces olhos castanhos, viria a alegria, o   vibrar da vida.
     Chegariamos , em nossa  inocencia, a comover-nos com sua visita.
     Minha irma  Dóris e eu acabaríamos, na certa, com o docinho de leite maravilhoso que só ela sabia fazer, aproveitando o resto do leite do dia anterior. Zeca, o mais novo, dormecia ouvindo suas histórias fantasiosas que aguçavam nossa curiosidade de criança e nos davam verdadeiras mensagens de vida, fazendo-nos refletir sobre o Bem e o Mal, como antagônicos  existentes em nossa vida cotidiana, mas o gostoso mesmo, era eu poder sentir-me criança naquele momento, pois vovó tomava para si todas as responsabilidades da casa. aliviando meus afazeres naquele momento precioso de alegria e felicidade.
     Vovó era uma pessoa criativa. Não tinha grande cultura, mas era sábia ao enxergar a vida . Muitas pessoas, infelizmente, passam pela vida sem enxerga-la. Apenas passam. Com aquela  velhinha sorridente e alegre que tão bem com os outros, não era assim. Ela prezava a vida, ela amava a vida, e, ela, mais do que ninguém, sabia emocionar-se com a beleza do existir.
     Sua visita estendia-se por cerca  de três dias para satisfação nossa. Quinta-feira não era lá muito bom para nos porque vovó nos fazia limpar a casa. E todos eram obrigados a se envolver com aquela tarefa, que no fim do dia nos deixava um pouco exaustos, mas, que ao final,  era compensado com uma gostosa sobremesa após o jantar. Por ocasião da faxina da casa, aproveitava para nos ensinar a valorizar a nossa casa limpinha e, sobretudo , a amar o nosso lar, que sem dúvida, era o nosso mundo.
     Nos anos 70 vovó adoeceu, suas visitas foram ficando cada vez mais escassas. Sentíamos a falta dela, mas já não éramos mais crianças, e as historinhas infantis eram substituidas aos poucos ,por romances e leituras de  ação, porém não  esquecíamos  os seus  ensinamentos. A adolescência chegava para nos, afastando  vovó cada vez mais de seus netos. Nós a visitávamos pouco, pois o tempo já se apressava para seus netos queridos, que já experimentavam uma nova fase em suas vidas.
     De vez em quando, levávamos um docinho para ela para mostrar o quanto lhe queríamos bem e o quanto sentíamos a falta de suas visitas. Lembro-me de, certa vez,  ao chegara a sua casa. encontrá-la triste e abatida,  quando lhe rolou uma lágrima daqueles olhos, agora apagados pela tristeza . Pedi-lhe a bênção como  de costume, senti-me bastante triste. Ela, sem duvida, já sofria com o peso dos anos, e a tristeza em seu semblante era notório, contudo sabia disfarcar esta tristeza com as músicas suaves que gostava de ouvir. Era um jeito que encontrara para aliviar suas dores. Mesmo assim ela não esmorecia. Caminhava  lentamente; até com  certa dificuldade, mas caminhava.
      As poucas horas que desfrutávamos da companhia dela .  E ela, rodeada de netos, aproveitava para falar.  Falava principalmente da adolescência, do mundo que naquele instante se descortinava para nós. Vovó era sábia em sua colocações , a solidariedade deveria ser  o principio básico de nossa filosofia e o amor ao próximo tamanho do amor a Deus. Era um encanto de pessoa. Com ela conversávamos verdadeiramente.
     Hoje, transcorrido dois nos de sua morte, sentimos   , por vezes, solitários. Solitários de sua presença de suas histórias. De toda experiência de vida que nos passou. Para ela o ser humano era feito para encontro. Quem sabe, um dia, em outra dimensão ainda encontraremos vovó?



Vilma Tavares
Enviado por Vilma Tavares em 21/03/2008
Reeditado em 28/03/2008
Código do texto: T910867