NADA É PARA SEMPRE...
Uma conversa curta, mas pródiga em conteúdo. Ela tinha consciência de que não poderia furtar-se a esse assunto, um tanto quanto desagradável, mas necessário, visto que havia sido adiado há muito tempo. E, quanto mais rápido se desenrolasse, seria melhor para ambos, naquele momento. Nancy não gostava dessa história, cada vez mais em moda, de “discutir a relação”. Preferia seus elevados instintos de mulher para saber que algo não ia bem, naquele relacionamento. Discutir os prós e contras do casamento, era um sinal de que ele estaria se desmoronando e, até certo ponto, caberia o questionamento do – “Vale a pena”?
Sempre foi uma mulher muito prática e objetiva. O que tivesse que ser, seria, sem contestamentos, sem lágrimas ou cobranças. Sentaram-se, um diante do outro. Engraçado, pela primeira vez, sentiam-se como estranhos...
Apesar dos bons momentos vividos juntos, as noitadas regadas a morango com chantilly, vinho tinto e fondue de carne, nas noites mais frias de inverno, ela sabia que as teclas daquele piano estavam, de fato, desafinadas! Ao menos, já não tocava mais a velha canção de amor dos dois. Ela ficou esperando que Mauro começasse o diálogo, que foi marcado por ele, naquela mesma tarde, pelo telefone, antes de chegar em casa, depois do trabalho. E, através do telefone, ela havia captado certa ansiedade em sua voz, um desconcerto, tentando encontrar as palavras corretas, para explicar o porquê daquela pequena e íntima reunião. Mas ela sabia...
Com a coragem que sempre lhe foi peculiar – que nunca foi mulher de chorar o leite derramado – foi logo dizendo: - Então, pode começar a falar, pois já tenho uma boa idéia do motivo da nossa “discussão da relação”. E ele:
- Ah! É mesmo? Então, vou poupar-me do peso da culpa e não direi nada, já que você sabe! Nancy notou uma leve ironia nas palavras daquele homem que, até ontem, havia amado, tido dois filhos – agora adultos e casados - Pediu desculpas, para encorajá-lo a continuar, pois sabia que ele sempre foi um fraco, sem coragem de assumir seus próprios passos. E, afinal, depois de gaguejar por um tempo, falou, demonstrando visível sentimento de culpa, coitado! Talvez uma culpa velada, disfarçada pelo nervosismo da hora.
Eu estou saindo de casa, amanhã mesmo! Apaixonei-me por uma menina bem mais jovem do que nós - Nós foi ótimo, já que ele era 13 anos mais velho do que ela. Começou a rir, desatinada e irritantemente e aí foi que ele não entendeu nada. Era um riso quase que nervoso, mas na verdade, era de puro alívio! Ele se assustou com aquela reação inesperada de Nancy!
Ela já tinha total controle da situação, sabia o que estava acontecendo, desde que Mauro começou a chegar de madrugada, inventado as antigas desculpas esfarrapadas de reunião na Empresa - muito originais – que lhe dava a nítida sensação que aquele casamento estava naufragado. Afinal, vinte anos é muito tempo para se viver a dois, sem o encanto de antes. E, na verdade, ela atribuía uma boa parcela de culpa –se é que há culpados em um fim de relacionamento – a ela própria, que não estava dando a mínima para os rumos daquele casamento, não mais! Era fria!? Insensível!? Não atinava o que poderia ser, além de um grande e total desinteresse de sua parte. Foi bom, enquanto durou! Viveram momentos muito felizes. Porém, agora havia acabado. Finito... The End!!
Nancy, com esforço, conteve o riso que ficou encravado no canto de sua boca, para não parecer cínica, pois precisava terminar logo aquela conversa. Tinha pressa em encerrar aquele capítulo da história de sua vida... Precisava tomar providências quanto à nova etapa que se descortinava a sua frente, já que Mauro havia decidido, para seu próprio bem, viver com aquela menina que foi sua Secretária, não sabia atender corretamente ao telefone e, por total incompetência profissional, havia sido despedida pelo Diretor da Empresa. E era sabido que ele a estava mantendo em um apartamento alugado,
Porém, isso não interessava em absoluto à Nancy. Foi até o quarto, sem nada dizer, abriu a valise de viagem, jogou todas as suas roupas e sapatos dentro, sem nenhuma organização e carinho, voltou á sala e disse: - Então, vá! Ele não entendeu nada! Olhou-a, tanto surpreso quanto decepcionado, pela aceitação, sem questionar, sem acusações e nem lágrimas de sua esposa. Aquilo doeu muito! Ele estava preparado para consolá-la, mas foi frustrado na intenção.
Entregou-lhe a mala nas mãos, olhou-o demoradamente, mas sem mágoas ou arrependimentos, sem saudade dos bons tempos, sem cobranças e disse:
- Saia hoje mesmo, não deixe para amanhã. Fechamos aqui essa página do Livro muito bem escrito de nossas vidas. Nossos filhos estão crescidos, casados e felizes, e é o momento de vivermos a nossa felicidade agora, cada um para seu lado. Desejo-lhe toda a felicidade que você almeja, todas as ilusões e fantasias, pois as nossas, as vivemos e muito bem! Foi tudo maravilhoso, mas acabou!
Ele, sem discutir, saiu pela porta da frente, acenando com a mão e dizendo que voltaria depois para buscar o restante de seus pertences. Poderia ter sido um quadro triste, mas não foi! O passado não se discute quando o presente está batendo a nossa porta! Ela não sentiu solidão. Não teve medo, nem ressentimentos. Um certo vazio!? Talvez, se ela desse chance, ele viria!
E, antes que esse fantasma da auto-piedade lhe atingisse, foi até o Bar, no canto da sala, serviu-se de uma taça de vinho, colocou uma música gostosa para tocar, pegou o telefone, discou o mesmo número de seis meses atrás e disse:
- Fernando, tudo acabado, estou só. Pode vir para cá, meu amor. O Mauro foi embora, para sempre e será feliz a sua maneira...E nós também!
Espero por você, com uma taça de vinho, aquele que gostamos tanto!