UM SONHO, UMA VIDA!

UM SONHO, UMA VIDA!

Lucinha nasceu em frente à uma maternidade pública da capital alagoana! Sua mãe, Idalina, houvera percorrido algumas outras maternidades sem, no entanto, lograr êxito em seu atendimento, até que ao chegar à esta última, às portas do hospital, a menina nasceu!

Uma bondosa enfermeira que estava saindo de seu plantão, condoída com a situação da jovem parturiente, se dispôs a ajudá-la ali mesmo, na calçada daquele nosocômio.

Idalina, uma Jovem de dezessete anos, havia ficado grávida de seu namorado, um rapaz de dezenove anos chamado João. Quando ela completou seis meses de gestação, João foi assassinado numa briga de galeras. Ele era envolvido com drogas e praticava pequenos furtos.

Apesar de saber que o namorado andava com uma turma da pesada, Idalina gostava dele e se entregou àquele amor, sem medir conseqüências e sem pensar em mais nada a não ser no prazer de estar com ele, terminando por engravidar! E agora, sem o pai da criança, como iria criá-la?

Lucinha já nasceu órfã de pai. Dizem alguns que foi melhor assim, pois, o pai não prestava mesmo!

Era o dia cinco de outubro de mil novecentos e oitenta e oito. Ela veio ao mundo justo no mesmo dia em que era oficializada a Nova constituição da república Federativa do Brasil, que definia os direitos fundamentais da população brasileira!

A menina foi morar em um barraco de dois cômodos em uma favela da orla lagunar de Maceió. Lá viviam sua bisavó Cícera, sua mãe Idalina, e seus dois meio-irmãos, Pedrinho e Cicinho, que eram frutos de outros dois namoros de Idalina.

Desde muito nova Lucinha cuidava de seus irmãos e de sua bisavó, que já estava bem debilitada. Todos dependiam e sobreviviam da minguada pensão que dona Cícera recebia, e à cada dia ficava mais difícil manter a família com aqueles parcos recursos. Era uma vida muito dura. Ah que vida de cão!

Muitas vezes Lucinha pedira à sua mãe para matriculá-la na escola do bairro, pois, desejava se formar professora, ter um bom emprego e tirar todos daquela miséria, porém, Idalina sempre arranjava uma desculpa. Quem iria cuidar das crianças e da velha, enquanto ela caía na gandaia?

Alguns anos mais se passaram e dona Cícera partiu para o além, levando consigo a minguada pensão. Idalina resolveu se amigar com Petrúcio, um homem bem mais velho. Ele vivia de catar e vender papéis, jornais velhos, latinhas e todo tipo de quinquilharias. O dinheiro mal dava para a “bóia”!

Três anos depois a situação era insustentável! Idalina havia dado à luz mais três crianças! As brigas com Petrúcio eram diárias. No começo era meu amor pra cá, meu amor prá lá, chegue minha neguinha. Depois eram bofetões pra lá, bolachões prá cá, toma cachorra, ameaças de morte, visitas à delegacia de polícia, etc.

Lucinha, já com treze anos, era uma menina triste. Não conseguira se matricular na escola. Estava fora da faixa etária para o curso normal e teria que esperar completar quatorze anos para começar o supletivo.

Em cinco de outubro de dois mil e dois Lucinha completou seus quatorze anos. Ela não cabia em si, pois, agora poderia se matricular no supletivo, se formar e tirar a família da miséria em que viviam! Este era seu maior e único sonho!

As aulas só começavam em março. Depois de uma longa espera, finalmente havia chegado o grande dia! Isto é, a grande noite da primeira aula, pois, o curso era noturno.

No trajeto para a escola ela teria que passar por terrenos baldios e escuros, mas, tudo valia a pena para a realização de um grande sonho!

Lucinha tomou um banho, daqueles de cuia. Colocou a sua melhor e única roupa de sair. Comeu um pedaço de pão duro e bebeu meia xícara de café ralo. Estava pronta! Iria finalmente ter sua primeira aula! Que alegria, que felicidade!

A menina estava radiante! Saiu do barraco, aquele mesmo onde fora criada naquela favela, a olhar para os lados, toda orgulhosa esperando que as pessoas a vissem e partilhassem com ela daquela alegria. Caminhava como se estivesse flutuando, estava nas nuvens! Tomou o caminho da escola, não via mais nada à sua frente. Só seu sonho e seu futuro!

Já havia escurecido, e ao passar por um terreno baldio, Lucinha não percebeu que três rapazes se aproximaram dela, e quando deu por si, eles já a abordavam. Estavam drogados. Um deles encostou-lhe uma faca no pescoço e falou para que ela não gritasse nem reagisse, senão, a mataria. Lucinha estava em choque! Não conseguia se mexer nem articular qualquer palavra. O malfeitor a derrubou no chão, ali mesmo, no meio do nada. Tirou-lhe a veste enquanto pronunciava palavras de baixo calão. Usou-a, seviciou-a, e em seguida, deixou que os outros dois fizessem o mesmo!

A Garota havia desmaiado desde o primeiro momento da sevícia. Os bandidos discutiam o que fazer com ela,pois, temiam serem reconhecidos depois. Resolveram matá-la! Deram-lhe sete facadas no peito! Ela nem sequer esboçou reação. Apenas gemeu. Tudo estava terminado!

Inerte ali no chão o corpo daquela criança, daquele anjo que um dia sonhou em freqüentar uma escola, melhorar de vida, viver dignamente!

Mais tarde, Idalina, sua mãe, sentindo que a filha se demorava a voltar, saiu à sua procura percorrendo o caminho que ela deveria ter feito, e então, um pouco afastado da estradinha de terra batida, no escuro daqueles terrenos baldios, encontrou seu corpinho despido e mutilado, sem vida, sem sonhos, sem esperanças!

A família ficou revoltada! Toda a comunidade se alvoroçou! Vieram polícia, jornal e até televisão! Por um tempo Lucinha foi notícia, até que outros casos aconteceram e foram deixando no esquecimento o daquela menina sonhadora que só queria uma coisa na vida: uma oportunidade para crescer e mostrar o seu valor ajudando aos seus próximos!