4 x 4

Durante grande parte de minha juventude estive envolvido com o futebol de várzea. Boa parte deste tempo como jogador, chegando a disputar a segunda divisão de futebol amador pelo extinto Clube Atlético Jatay, em 1993. Mas o episódio que pretendo narrar aqui aconteceu a exatamente 10 anos antes desta data, em 1983, quando em uma de nossas viagens que fazíamos para jogar bola fora de São José dos Campos.

Nesta oportunidade viajamos até minha cidade natal, Delfim Moreira , a fim de realizar um jogo que eu havia combinado com um amigo de infância duas semanas antes.

Considerando que nessas ocasiões os times de cidades pequenas, buscavam reforços em outras cidades quando recebiam times de fora, foi quando sugeri ao nosso então técnico que também fizéssemos algo parecido.

Naquela época, a equipe do “7 de setembro” tinha se sagrado campeão varzeano em SJCampos, e seus jogadores estavam por assim dizer, “de bobeira”.

Após conseguirmos a confirmação de seis de seus melhores jogadores, montamos a equipe que iria disputar aquela “peleja”.

Pois bem, apesar dos poucos recursos, alugamos um ônibus e partimos otimistas para Delfim Moreira, tendo como motorista nosso amigo Galvão.

Acontece que também é de costume o time local fornecer almoço, churrasco ou até mesmo um lanche para os visitantes e isso também tinha sido prometido pelo seu responsável técnico que tinha por apelido Botão.

Após 3 horas de viagem chegamos ao nosso destino por volta das 12:00 h. e ficamos na praça da cidade, “matando o tempo”, uma vez que a partida preliminar estava marcada para 14:00 h.

Nesta preliminar jogavam os piores jogadores, era o chamado Segundão, Aspirantes ou Cascudo (quem conhece a várzea sabe disso).

Ninguém se preocupou em se alimentar direito, uma vez que a promessa de um bom lanche (carne ou lingüiça no pão mais refrigerante) estava garantida.

Como era comum naquelas ocasiões, uma hora antes do confronto a beirada do campo (não havia arquibancadas), estava tomada de Delfinenses.

Em resumo desta partida, até para não atrasar o que realmente interessa, lembro-me que o resultado foi 6 a 1 para a nossa equipe, fazendo com que nossos adversários ficassem um poucos receosos com o que poderia acontecer no jogo principal.

Não deu outra, viramos o primeiro tempo com 2 a 0 e aos 40 minutos do segundo tempo vencíamos por 4 a 1. Foi aí que começo a sacanagem.

Vale lembrar que quem apitava o jogo era o “nosso amigo” Botão que, inconformado com o resultado, resolveu a partir daí, fabricá-lo. Arrumou um pênalti aos 45 minutos alterando o placar para 4 a 2.

Não contente, deu seguimento na partida e aos 52 minutos seu time fez 4 a 3.

A essa altura do campeonato, digo, da batalha, nossos jogadores já davam sinal de cansaço, entre eles eu e nosso artilheiro Serginho, que havíamos jogado meio tempo no Cascudo.

Era natural que só tivéssemos pensamento para o prometido lanche. Estávamos “varados” de fome. Com o “estâmago pregado na cacunda”, com dizíamos por lá.

E a partida continuava... Foi então que mais uma vez, já quase aos 60 minutos, mais um pênalti foi assinalado para o time local.

Foi sem protestos (apesar da injustiça), que finalmente vimos o “Juiz” conversar com o nosso goleiro Mário, a cobrança ser efetuada e a partida empatada em 4 a 4.

Pois bem, no entender do “Sr. Botão”, não havia mais motivos para continuar aquele combate, mesmo porque já havia sinais de escurecer e na beirada do campo só haviam alguns fanáticos “gatos pingados”.

Mais que depressa nos dirigimos ao vestiário, trocamos de roupa (uma vez que não havia tempo nem espírito para banhos) e seguimos para o clube com um único objetivo: Encher a pança e embarcar de volta a SJCampos.

Já a caminho, nosso técnico quis saber o que o “Juiz” havia conversado com o nosso goleiro na hora da última cobrança de pênalti.

O Mário que a essa altura já havia ingerido uns 4 pães com linqüiça e uma garrafa de “tubaína”, respondeu: - O FDP disse que se eu defendesse o pênalti, não haveria lanche para ninguém e eu falei a ele que, por acaso, a bola batesse em mim ele poderia (e ele o faria com certeza), repetir a cobrança quantas vezes fossem necessárias.

Voltamos a jogar em Santa Rita do Sapucaí, Marmelópolis, Brasópolis, Virgínia, Jesuânia e em muitas outras cidades do sul de minas, mas em Delfim Moreira nunca mais.

Só voltei a passeio em visitas a familiares e amigos (inclusive o Botão).