Reunião de Familia

(16/07/04)

Não existe coisa mais esquisita que uma reunião de família!

Não aquela onde estão apenas seus parentes mais próximos, como pais e irmãos, mas aquelas para as quais comparecem parentes de todas as partes do planeta ou, em alguns casos, de todas as partes do Universo, reunidos para um casamento, aniversário ou afins.

Uma conjunção de figuras estranhas, de hábitos alimentares pitorescos e de comportamento bizarro. Exagero meu? Então vamos aos exemplos.

Tem aquele tio de memória curta, que durante a festa esquece e lhe conta a mesma piada infinitas vezes. Normalmente uma piada cuja graça só ele percebe. Mas repare: escutar a mesma piada inúmeras vezes não é privilégio seu. Ele percorre a festa, indo de grupo em grupo, parando a cada rodinha de conversa, nela se infiltrando e disparando sua infâmia, da qual ele, invariavelmente esfalfa-se de rir, mas obtém no máximo um sorriso de solidariedade dos demais. Isto sim é hilário.

Tem aquele outro tio que vem e lhe pergunta como está a vida, mas o que ele quer, na verdade, é um pretexto para contar vantagens sobre os próprios filhos. Não importa o que você diga. De exame de fezes a um passeio na Lua, qualquer coisa que você tenha realizado o filho de tal pessoa terá realizado a mesma façanha de forma mais intensa, espetacular ou em maior número de vezes. Nem Frederick Cook e Robert Peary, desbravadores do polo norte, seriam páreo para o tal filho, um tipo gordo, barbudo e desanimado que está sentado ali numa mesinha ali no fundo com uma cara de coitado.

Tem aquela mulher de um parente seu que é sempre cheia de atenções com você: traz uma bebida, pega um salgadinho, o tempo todo orbitando o espaço onde você se encontra. E quando não tem ninguém olhando ela vem, agarra o seu bíceps e lhe diz em surdina “Nossa, como você está gostoso...”. Socorro, alguém, qualquer um... Tio, vem me contar uma piada...

Tem o tal parente, marido daquela moça...

Tem aquele seu sobrinho esganado, que por ter um sanduíche em uma das mãos e um refrigerante na outra, quando o garçom passa com a bandeja de salgadinhos tenta apanhar alguns com a boca, para não perder a oportunidade. E ali está ele, como um cavalo no cocho, a cabeça enfiada em uma bandeja segura por um garçom que estampa nos lábios um sorriso pra lá de amarelo e nos olhos um pedido desesperado de “me ajuda!”.

Tem aquele que tem compulsão em falar palavrões. Eu contei: em três minutos de conversa foram proferidos sessenta e oito palavrões. Deve haver algum tipo de recorde para isso.

Tem aquele outro ali. O que que ele é seu mesmo? Apesar de você não fazer a menor idéia, nota que ele está tão tristinho ali no canto que você resolve puxar papo. “E ai, como está a vida?” e ele lhe conta com requintes de crueldade todas as malezas por ele vividas. Da mulher que o trocou pelo anão do circo, da pedra no rim do tamanho de uma bola de basquete, do emprego ruim e do salário mixaria, do bairro onde mora, da filha que se casou com aquele seu parente... E, invariavelmente, termina cada uma de suas narrativas com a frase “Você é que se deu bem!”. E você ali, doido para que apareça um garçom e lhe sirva, por engano, uma dose de cicuta.

Mas tudo isso é tolerável, faz parte dos relacionamentos familiares. Porém existe algo que realmente me tira do sério. Fato para o qual não existe uma explicação lógica nem racional:

Mesmo que você fosse o cara mais bonito e charmoso da festa, bem sucedido profissionalmente, tivesse um casamento maravilhoso, com uma mulher deslumbrante e com filhos lindos, morando no melhor bairro da cidade, com o melhor carro que o dinheiro pode comprar, correr 40 Km por semana, nadar e fazer musculação todos os dias, fazer dieta e ter perdido mais de dez quilos, porque sempre tem alguém cuja única coisa que tem pra lhe dizer é “Nossa, como você está gordo!”.