O MENDIGO RICO
Em janeiro de 1996 me preparava para a primeira viagem para os Estados Unidos e estava muito ansioso para conhecer New York de perto, ir à Broadway ao Metropolitan, enfim, concretizar um sonho pessoal.
Como viajante de primeira viagem ao exterior, tive que providenciar o passaporte, o visto americano e, inclusive, dinheiro para os gastos . No dia anterior à viagem, foi uma correria só. Eu e meu amigo Jairo, passamos no Banco do Brasil onde compramos os chamados cheques de viagem, fomos à empresa pela qual viajaríamos para apanhar o “vaucher” e a programação.
Andando pela Avenida Paulista, sem notar, deixei cair o envelope com os cheques de viagem. Na época, eu morava em Itapetininga e só me dei conta da perda quando cheguei a minha casa.
Minha filha me disse que uma pessoa estava tentando uma ligação à cobrar e várias vezes, em vez de atender, ela colocara o telefone no gancho. Pensei que poderia ser algo importante para mim e determinei que se houvesse nova ligação, deveria me passar o telefone.
Já havia telefonado ao banco e tudo estava acertado para o cancelamento dos cheques de viagem e um portador iria levar os dólares antes do embarque, no Aeroporto.
Em dado momento, o telefone tocou e eu mesmo atendi. Era a ligação a cobrar com aquela música característica. A pessoa do outro lado demonstrava ser muito simples. Era um homem que com a voz meio acanhada perguntou se eu era o Sr. Carlos. Eu respondi que sim, então ele disse: __ Achei os seus cheques de viagem na calçada da Avenida Paulista, perto do Cine Gazeta. O envelope está comigo e queria saber como faço para entregá-lo.
Perguntei onde ele se encontrava, se era funcionário de algum escritório e que me fornecesse o endereço que eu mandaria algum parente da capital a fim de buscar.
O homem me respondeu meio sem jeito:
__ Eu moro na rua, durmo embaixo do viaduto que dá acesso para a Avenida Rebouças, mas eu posso esperar alguém aqui perto da banca de jornal em frente ao edifício da Gazeta. __Estou com uma camiseta meio suja e com calça jeans velha.
Em meio à desconfiança pensei que poderia ser chamariz para um assalto já que não admitia que uma pessoa com aquele perfil fosse preocupar-se em devolver cheques de viagem.
Liguei para o meu filho e pedi que ele fosse até o local indicado para apanhar o envelope e dei as características do rapaz, inclusive, pedi que meu padrasto fosse junto, mas que analisassem as circunstâncias com certo cuidado.
Autorizei que dessem ao indigente uma boa gratificação que depois eu ressarciria. Pouco tempo depois meu filho me ligou dando a notícia de que o rapaz pacientemente estava aguardando a chegada dele e entregou intactos os cheques de viagem e, inclusive, resistiu um pouco, antes de aceitar o dinheiro oferecido como gratificação.
Meu filho observou que o indivíduo ficou alegre como se tivesse ganhado um presente de muito valor e saiu apressadamente, talvez para alimentar-se já que não aparentava ser pessoa dada a qualquer vício.
Abortei em tempo o cancelamento dos cheques de viagem e viajei tranquilamente, graças à determinação e insistência daquele homem que só se deu por satisfeito quando devolveu os cheques de viagem que achou.
Ainda que tenha dado uma gratificação, eu acho que fiz pouco, ou melhor, quase nada, pois aquele indivíduo precisava era de uma mão amiga, de alguém que pudesse ajudá-lo a sair daquela situação.
Depois disso, passei várias vezes pelo local, mas nunca encontrei tal pessoa, porém, em minhas orações peço a Deus que a preserve te que ela possa vencer a discriminação, o preconceito e os problemas que a levaram a ser um indigente. Tal ato demonstrou que aquele sujeito é muito rico internamente e que nem tudo está perdido.
Talvez ele seja muito mais consciente do que eu em relação ao mandamento: Ama ao teu próximo como a ti mesmo.
Pelo que aprendi não se deve julgar um livro pela capa.