MARIA'S

MARIA'S, Conto

Introdução

Esse texto, diferente da maior parte dos textos que escrevo, é outro desses que já "nasceu" pronto; já deve ser a segunda vez que uso essa mesma frase, depois do septuagésimo livro, nas minhas conversas comigo mesmo e com Deus ontem ao caminhar entre turnos no gramado na escola, falei com Ele do desejo de produzir textos com mais volume, embora não tivesse como dispensar as crônicas, porque seria como dispensar o pão de cada dia, já que todos os dias acaba acontecendo alguma coisa, que pode vir a ser um texto com bem mais facilidade que uma história inteira. Essa noite foi dessas que não jantei, e fui direto pra cama, acordei agora pouco e mais uma vez pensei na biblioteca perdida do Machado de Assis, e em quantos livros ela teria e sua real influência na atividade de escritor desse autor, ou no quanto, e até que ponto ela o influenciou, em meio a esses pensamentos, veio surgindo outro pensamento acima dos anteriores e tomando o lugar deles: que todos temos nossas próprias histórias, independente daquilo que lemos ou que temos de acervo e uma coisa, como sempre, não é melhor nem pior do que outra, estava em vias de contar a história de uma outra família, com um outro tipo de material, mas tudo que é externo e dependente de terceiros está sujeito a começar e terminar somente na ideia, pelo fato de depender de outro ou outros. Essa história, tal qual o Homenagem aos Ausentes, chegou agora a pouco e diferente das histórias baseadas em livros, ou no amor por eles, nasce do amor pelas imagens; imagens da família, que tem nela, na Maria, a sua origem, por ser a parte mais antiga, visualmente falando, da árvore genealógica pelo lado da minha mãe. Essa história está baseada nas evidências de um crime, já prescrito, desses que nem o Juizado Especial Criminal iria querer julgar, porque é muito de família, creio eu, quando minha vó Dalva faleceu foi uma cratera que se abriu, e cada um a sua maneira, quis guardar alguma coisa, um queria a batedeira, outros quiseram outras coisas, já eu queria exatamente o que é a minha base para tudo o que vai sair na enxurrada aqui. Eu quis todas as fotografias que consegui colocar as mãos, e só cometi o erro de não guardar todas. E me explico duas vezes. As que entreguei, achei que cabiam mais a quem foram entregues do que a mim, e as que mantenho comigo, as mantenho justo por ser o que me permite estar mais próximo, tanto da Maria, quanto da Dalva, mas não as vejo sempre. Sinto saudades da minha vó Dalva todos os dias, também da vovó Maria. E dessa imagem dela, da minha vó Maria, na sua fase mais linda, com a filha entre ela e o marido, meu avô Bento, era das imagens que minha vó tinha mais ciúmes, não os teria como ver por motivos que são um tanto quanto óbvios. O mais engraçado, quando se pensa em escrever o que ainda não se escreveu, é pensar no que já se escreveu antes. Posso criticar o quanto quiser o homem branco europeu, e suas mazelas pelo mundo, para logo em seguida, surgir essa mesma fotografia dela, como para me lembrar que, como brasileiro, alguma parte vai estar ligada, quer queira quer não, a esse sangue europeu de qualquer forma. A última coisa a ser destacada nessa introdução, é que todas as fotografias que servirão de base para essa história, por serem antigas, são todas elas pretro e branco. Com base nas imagens pode-se dizer que: Maria tinha um olhar sereno, Dalva tinha uma expressão bem mais vigorosa, digamos assim, Gilka tem o olhar mais para o de Maria e Julia tem o olhar bem mais expressivo, já para Dalva.

Esse conto é dedicado a Maria & Dalva in memoriam e a Gilka e Julia, todas ligadas a Maria, inclusive a própria.

Meu nome é Maria, por enquanto basta tão somente essa informação, nasci em Portugal as margens do Porto, numa família de poucas posses, tive uma infância pobre, tinha outras duas irmãs que também eram Marias, meus pais e boa parte dos portugueses amamos Maria, aquela que todos chamamos de mãe. Mãe de Nosso Senhor. Ainda brincamos que ela só poderia se chamar era Maria mesmo Ma e Ma Maria Mãe não poderia haver combinação mais fácil de se fazer. Todos os anos íamos as festas dedicadas a ela na paróquia local, só que logo após a última de nós três completar seu terceiro aniversário, meu pai faleceu, infelizmente ainda não sabia eu que essa sina estaria no caminho de cada uma de nós. A minha mãe já havia perdido tanto o vigor da mocidade, quanto boa parte da sua beleza, que suas irmãs diziam, ela havia transferido a cada uma de nós, eu era muito nova ainda para entender essas piadinhas de família. E a ela coube, na falta de outros pretendentes, ficar mesmo viúva e tentar da melhor forma possível garantir nosso sustento, as coisas pareciam que seriam razoáveis logo no início: passamos de três para duas refeições, nos dias especiais, sem que ainda entedessemos bem, íamos a casa de parentes, a mesa era mais farta que a nossa, como éramos crianças, sempre diziam que era dia de festa pelo aniversário de alguém, mas até isso durou pouco tempo. Eu era só Maria, a mais velha, a primeira, nossa mãe era Maria Alva, minha irmã era Maria Eduarda, nosso pai era Manoel e minha irmã caçula era Maria Antônia. Com tantas Marias só a mim chamavam assim, as outras para evitar repetições vãs, chamavam pelos nomes que vinham logo após, até nós; quando nos referíamos a nossa mãe pelo nome, a chamávamos de Alva. Meu pai nos deixou numa fria manhã de inverno, era um desses lindos dias de sol, sem nuvens no céu que faz as crianças pensarem que está calor, até colocarem os pés pra fora de casa e voltarem correndo e com o berreiro aberto, e então os mais velhos, rimos todos, e dizemos, a maior parte em pensamento, que mais um foi apresentado ao inverno. E como é frio por lá no inverno, alguns ainda ficam querendo fazer o trocadilho, ao que as mais velhas ficam fazendo logo o sinal da cruz e mandam as crianças é ficarem quietas. Sem ele em casa, logo sua falta foi notada, fosse pelas goteiras, fosse por alguma coisa que se estragava e ninguém sabia o que fazer, era triste de ver o quanto nossa mãe tentava não suspirar pela casa, porque mesmo sem ela falar nada, todas sabíamos, o quanto ele estava fazendo falta. A necessidade, porém, traz com ela, geralmente, a fome, a doença ou outra coisa qualquer, e assim como um dia vem após o outro, nós precisamos seguir com nossas vidas, nossa mãe tentou fazer o seu melhor e o que não sabíamos, era que seu estado de saúde já era debilitado, desde antes da partida do pai, ela fez de tudo para não nos deixar perceber, porque ela mesma temia não conseguir terminar de criar suas filhas. Quando já era quase moça feita, a perdemos também. Foi num dia com tanta chuva, que precisamos adiar o sepultamento para o dia seguinte, e ainda fazer o velório na casa de uma de nossas tias, achamos que nossa casa iria abaixo, tantas eram as águas que entravam nela. Foi o momento mais difícil que passamos lá, época de incertezas, coloquei a responsabilidade de terminar a criação das minhas irmãs sobre meus ombros, apesar dos problemas, resolvemos ficar em nossa casa, alguns parentes conseguiram dar jeito em quase todas as goterias, só que as coisas começaram a ficar ainda mais difíceis, a comida começava a faltar, alguns parentes começaram a ir para o Brasil em busca de algum trabalho, e na esperança de melhorar as condições de vida, acabei com muita tristeza por esse caminho também, lembro como foi difícil abandonar nossa casa, mais difícil ainda foi deixar minhas irmãs no cais, colocar o que foi possível naquele baú e dizer adeus, sem nem saber se algum dia iria conseguir revê-las novamente...

ATENÇÃO A SEMELHANÇA ENTRE PESSOAS E LUGARES, CASO OCORRA, SERÁ MERA COINCIDÊNCIA.

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2025 o ano do livro!!!

Renato Lannes Chagas
Enviado por Renato Lannes Chagas em 01/01/2025
Reeditado em 03/01/2025
Código do texto: T8231267
Classificação de conteúdo: seguro
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