O MARQUÊS

O MARQUÊS

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HOJE, APÓS

retornar a escola, esses elementos ainda são capazes de me surpreender porque sem eles, recordemos: escola, estudo, aluno e professor, bem provavel que não se chegasse a cogitar algum dia em ser escritor, sem deixar nunca de mencionar o leitor, este que continuou mesmo quando a escola fazia parte apenas das lembranças. Passar a ter interesse pela língua portuguesa e suas origens é quase tão natural, quanto ter interesse pelos sinais de pontuação, gramáticas e dicionários porque sem essas coisas não se faz nem uma parágrafo decente. Só que falar do aqui e agora sem retratar o como foi difícil chegar até esse ponto não teria a mesma graça. Até hoje as orações subordinadas continuam me atormentando, extamente como faz com os alunos, como fazia e ainda é capaz de fazer em qualquer questão mais elaborada de concurso, nem posso dizer que a coitada da língua espanta algum leitor em potencial, porque como seria possível ler e escrever sem o bom estudo da língua? Só que como cativar esse estudo com uma leitura capenga? Não acontece, as notas não aparecem e as dificuldades são muito maiores. Quando se tem adultos em volta atentos a isso, talvez seja menos pior, se não vai na marra, desde que se esteja disposto a gastar a vista, em algumas tentativas de fazer da leitura da gramática algo como ler um jornal diário, difícil, algumas horas mais difícil ainda, vai piorando e melhorando e quando se vê fica claro que não há condições de se ficar afiado como se gostaria, mas já é melhor que apanhar tanto. Mal tinha começado a alfabetização e lá estava o dicionário e as primeiras lições para fazer em casa e já fazendo confusão com os sinais nas palavras, leituras daquelas que aconteciam na sala, que nada, leituras menos ainda, livros pela casa só se fosse uma piada. Até tinha alguns livros para crianças, mas para não ocupar espaço devidamente guardados numas prateleiras entre dois armários num dos quartos, porque aquele apartamento não era feito para ter livros assim na parte nobre da casa e se não fosse uma área isolada nem ali. A falta de intimidade com a língua faria parte do dia a dia, todos os dias. Até ficar maior, descobrir alguns livros como o Marcelo Marmelo Martelo, outro sobre um menino e uma lagartixa na parede, outro sobre uma montanha, que dava nome ao livro e alguns outros. Nada que significaria estudos sobre palavras, sinais de pontuação ou sobre a origem da língua, nem para ajudar com as notas, fosse de português ou de outra matéria qualquer. Até o final da infância podemos colocar as culpas em fulano, beltrano, até em ciclano, na escola, só que logo que a infância acaba; acaba junto o repertório de a quem culpar e se não tomamos jeito e entender que temos nossa parcela na história, vamos passar a vida contando histórias e mais histórias. A escola pode virar um tormento ou um convite a ser largada, se não acontecer de se acordar a tempo sobre o que ela representa. Nenhuma dessas análises de pensamentos elaborados cabe ao aluno, lá atrás nessa mistura de realidade com alguma ficção só se vê o quanto é difícil aprender a gramática que ainda está na sua fase inicial e elaborar um texto seguindo regras que já estavam sendo desrespeitadas ali em sala de aula. As notas só poderiam ser baixas. O que salvou a língua e as demais matérias naqueles tempos foi tudo estar no mesmo idioma e a dificuldade em assimilar qualquer dos elementos dos outros dois disponíveis, como continua ocorrendo até os dias de hoje com a língua inglesa. Ocorre que, num dia em que o sol deveria estar brilhando mais chegou e perguntou do nada primeiro a professora de História sobre a origem do português falado no Brasil, sem que a mesma desse uma resposta satisfatória, dali há dois dias tentou a sorte com a professora de língua portuguesa, explicando que a avó falava diferente com um sotaque como a mãe dela falava. A professora reproduziu o mesmo sotaque. A turma interia riu, ele e ela inclusive, nesse dia ficou por isso mesmo, antes tivesse encerrado por ali. Nas semanas, meses seguintes voltaria a questionar. A escola sem uma biblioteca, em casa sem ter aonde consultar, sem bibliotecas nas imediações, tirando uma de livros infantis aonde nada foi localizado, com o tempo pensaram que as dúvidas seriam esquecidas ou trocadas por outras. Infelizmente para todos, estavam diante de um teimoso de marca maior. A professora de língua portuguesa levou uma enciclopédia, livro grande com capa forrada de couro, logo ali ele se arrependeu, em vão, a aula toda foi dedicada a explicar que ninguém sabe dizer exatamente porque o português falado no Brasil é o único falado da forma que é. A própria professora tinha tido a oportunidade de visitar Cabo Verde, Angola e Moçambique e como havia feito amizade com professores nesses três países, todos gostaram da curiosidade daquele aluno e se dipuseram a pesquisar sobre as origens e influências da língua portuguesa naqueles lugares e gravaram breves mensagens identificando seus nomes e seus países, para que todos tivessem a oportunidade de ouvir como nesses três países o português era diferente do falado por aqui. Achavam que ali o assunto estaria encerrado. Nem perto disso. Ainda que estivesse ali na enciclopédia alguma informação sobre o tal marquês, nada havia que solucionasse as próximas perguntas, sobre sinais de pontuação, língua geral e mais outras dúvidas. A professora deu ao aluno um caderno para ele ir anotando suas dúvidas, só que as notas desastrosas das primeiras provas bimestrais fizeram o caderno ser deixado num canto qualquer do armário, passou o tempo, passou raspando naquele e nos demais anos. A curiosidade se transformou em alguma coisa quase parecida com raiva. E o caderno lá esquecido durante mais de trinta anos.

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COM O PASSAR

de tantos anos só o esquecimento mesmo salvou o caderno de ir para alguma lixeira. Só o acompanhou durante a vida adulta porque estava na mesma caixa com livros e revistas que iam sendo transportados a cada mudança que fazia, sem ver um espanador e tão bem embalado que ficou a salvo de insetos e até da poeira, em resumo: conservado por puro acaso. O dia em que recomeçou a ter interesse em estudar sobre a história do Marquês de Pombal e da língua portuguesa, das gramáticas, dicionários e livros em geral foi no dia em que havia resolvido dar uma arrumação em papéis e o caderno esquecido estava lá, por essas coincidências que ninguém explica, o telefone e a professora permaneceram nos mesmos lugares mesmo após todos aqueles anos, agora com as mudanças na tecnologia, retomaram os assuntos quase do lugar aonde haviam parado. Havia um grande material para ser estudado, sem que ele tivesse ciência, indiretamente aqueles questionamentos haviam sido trabalhados para serem utilizados em várias das reuniões sobre os dois acordos ortográficos que haviam sido realizados. Como o seu contato não existia mais na escola, a professora não pode mais fazer contato algum, mesmo tendo passado muitos anos, ela ainda mantinha seus contatos, além de novas linhas de pesquisa junto as maiores bibliotecas da capital e a própria academia brasileira de letras e seus equivalentes nos países africanos. Ao terem conhecimento de que o menino agora era também escritor, o acesso aos documentos antes meramente pensados, estavam ali a disposição. Com a ajuda daqueles senhores aposentados, elaborou um extenso trabalho abordando a importância da língua como um dos elementos que permitiu a unificação do país e a sua importância nos demais países colonizados pelos portugueses e os demais lugares que não haviam sido ainda mencionados foram também incorporados aquele estudo, dali há pouco surgiu a questão de classificar a língua como bem cultural imaterial, fazendo parte do estudo ainda as semelhanças e diferenças entre significados, sinais de pontuação, origens de palavras, gramática e incorporação de palavras estrangeiras, alguns dos seus trabalhos literários foram estudados, publicados e distribuídos em conjunto com os estudos em bibliotecas desses países, incluindo as de Portugal, aonde a convite do governo português ele passou mais um semetre em Lisboa fazendo mais estudos a respeito do próprio marquês com um material que até então não tivera acesso aonde o governo português deixava exposta as razões da língua geral que estava sendo adotada representar um perigo real de ruptura da unidade da então colônia, que acabaria por se desmembrar em pelo menos três diferentes regiões, que poderiam resultar em guerras e alianças com os países vizinhos, o que reconfiguraria o mapa e a língua falada em todo o território brasileiro, como a conhecemos hoje. O dilema maior de esclarecer porque o marquês fica a margem e fora dos holofotes nos livros didáticos tanto do Brasil, quanto nos de Portugal foi o único dos questionamentos daquele caderno que ficou sem resposta. Em Portugal sugeriram que ele terminasse com alguma intriga palaciana, porque poderia ser, como era comum, que a vaidade do marquês tenha sido maior do que a do príncipe regente e que a D. Maria poderia até ser não muito boa da cabeça, mas não era nem um pouco boba.

Essa é uma ficção, a semelhança entre pessoas e lugares caso ocorra, será mera coincidência!!!!

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Renato Lannes Chagas
Enviado por Renato Lannes Chagas em 27/12/2024
Código do texto: T8227889
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