JUSTIÇA?
Era um domingo como outro qualquer na vida de Pedro. Sua mãe havia saido cedo para a igreja, levando o garoto e seus dois irmãos mais velhos. Após realizada a tarefa religiosa, como sempre uma visita ao supermercado para umas compras complementares para o almoço em família. Tudo estava correndo bem, Os garotos se dividiam entre as prateleiras de brinquedos e as de doces na esperança que por um milagre do céu(quem sabe adquiridos pela ida a igreja) a mãe diferente dos outros dias lhes presenteasse com algum daqueles itens desejados.
Já estavam na fila para pagar as compras, e assim eliminar de vez a chance de ganhar algo bom naquela manhã. Ouviu-se um burburinho e Pedro viu uma mulher vestida com roupas pretas e um boné na cabeça gesticulando nervosamente. O garoto nos seus 8 anos já sabia ler muito bem, e viu escrito no uniforme da mulher: FISCAL: COMO POSSO TE AJUDAR? O barulho aumentava e a mulher empurrava um jovem maltrapilho com raiva para fora do estabelecimento. O jovem gritava que só queria comprar uma comida. A mulher abafava a voz e não lhe permitia se defender dos sopapos e investida. Pedro a tudo observava e pensou em como a mulher poderia “ajudar” aquele rapaz daquela forma.
No caminho a mãe de Pedro comentava com os filhos sobre a injustiça que aquela mulher estava fazendo com o rapaz, sem lhe dar a oportunidade de se defender. Usando a autoridade para maltratar e tirá-lo dali. Pedro a tudo observava. Em casa durante o almoço quando o pai de Pedro se sentou para comer, o assunto veio à tona novamente. Que injustiça, ninguém pode ser maltratado assim sem direito a conversar e ser ouvido. Pedro a tudo observava.
O dia inteiro Pedro pensou em tudo aquilo até a hora de dormir, teria aula no dia seguinte.
Acordar cedo era uma dificuldade, dois filhos estudavam de manhã e um à tarde. O marido saia depois dos meninos para o trabalho, então a mãe que levantava cedo, chamava aos dois e ficava vendo os outros dois dormindo calmamente enquanto sua rotina já se iniciara. Pedro ia para a escola em um ônibus que a prefeitura disponibiliza para os alunos. Na escola ainda tinha fila para entrar, o diretor era muito rígido e era filho de um oficial do exército. Parecia que ele queria que a escola tivesse a mesma educação que ele teve. Na sala, Dona Gigi recebeu os alunos para a primeira aula. Pedro ouviu algo estranho na sala, a professora estava falando muito alto com uma garotinha e não a deixava conversar para se defender. Nosso pequeno observava tudo. E de sobressalto se interpôs entre Dona Gigi e a pequena oprimida. Entre gestos e palavras, a tentativa de defender a garota resultou em uma visita à sala do diretor que tentava “explicar” a importância de obedecer os mais velhos. Naquele mesmo dia somente com a mãe poderia ir embora da escola. Enquanto o diretor e a professora falavam, mãe e filho escutavam calados, a mãe teria que ir três dias conversar com a diretoria no final da aula como punição pelo mal comportamento do garoto. Pedro observava tudo. A mãe concordou com o diretor e a mestra, e no caminho de casa o assunto foi este. No almoço em casa e na hora do jantar o assunto foi a injustiça do garoto com a pobre e indefesa D. Gigi. Pedro a tudo observava.
Aquela noite como na anterior, o rapaz pensava em tudo que havia acontecido.
No dia seguinte, a fila, o olhar de todos para Pedro e uma D. Gigi imponente, até que o diretor chega na sala e todos estremecem e paralisam. D.Gigi é chamada à porta e o homem começa a lhe proferir ofensas por algo que havia feito de errado. Na frente de todos os alunos. Pedro a tudo observava. No final da aula, a mãe envergonhada estava à espera do filho. O diretor e a professora juntos a observar o constrangimento materno pareciam esboçar um sorriso meio de lado. Pedro a tudo observava.
Naquele momento ao ver o olhar carente da matriarca, pulou à frente dos adultos e fitando-lhes os olhos perguntou:
Por que a justiça de vocês adultos muda tanto? Por que a justiça de vocês fica sempre do lado mais forte e mais poderoso?
Me respondam vocês como ser justo de verdade neste mundo dos adultos?