FOTO GOOGLE
FELIZ NATAL SENHOR ALBERTO
Era dia vinte e quatro de Dezembro, chovia intensamente e o vento forte virava chapéus, encharcando os transeuntes.
O homem, desprotegido, singrava na sua rota contra a intempérie, indiferente à água que lhe ensopava a roupa, escorrendo desde o cabelo. Deu mais uns passos até que desistiu e se abrigou junto à montra de uma loja, coberta por um toldo. Outras pessoas também ali se aglomeravam, tentando proteger-se da inclemência do tempo.
Tendo em conta o dia e a hora, todos tinham pressa para chegar a casa e preparar-se para a Ceia de Natal.
Como se estava a molhar na mesma pois o espaço era exíguo para tanta gente, ele continuou a caminhar apressado, cada vez mais ensopado, até que se enfiou no que lhe pareceu ser um vão de escada. Depois olhou melhor e percebeu que estava à entrada de uma das muitas pensões manhosas da zona, conhecida por ser uma área de prostituição.
Uma mulher de meia-idade, morena e de feições ainda agradáveis, estava por perto, deu-lhe o seu melhor sorriso e chegando-se para junto dele, convidou-o a subir, alegando que deveria tirar as roupas molhadas para não se constipar. Ele refletiu breves segundos e apesar de suspeitar do intuito da outra, acabou por concordar com os seus argumentos.
Ela deu-lhe o braço e conduziu-o até ao balcão recuado onde perante um sujeito baixo e gordinho, sem regatear, pagou o quarto por toda a noite.
Subiram, o aposento ficava no primeiro andar, era bastante degradado e modesto, um armário, uma cadeira, a enxerga e uma mesa a servir de toucador completavam o mobiliário. Numa pequena divisão contígua, limitado à sua expressão mais simples, estava aquilo que pomposamente chamariam de banheiro.
Sentou-se na cama, ela aproximou-se e começou a despi-lo. Estava mesmo todo molhado. Espirrou.
- Vá, dispa-se rápido, ainda se constipa.
Ajudou-o a tirar as últimas peças de roupa e depois de lhe esfregar energicamente a parte superior do corpo com uma toalha que vira dependurada num canto, pois ele tiritava, meteu-o debaixo dos lençóis, cuja limpeza já vira melhores dias.
Depois de o ver bem tapado, tirou o casaco comprido e começou a despir o resto da roupa. Ele parou-a.
- Não se dispa toda.
Ela olhou-o, perplexa.
- Então, o que está a pensar? Eu não alinho em coisas esquisitas, está bem?
- Não é nada disso, eu apenas quero sentir o calor de um corpo junto ao meu. Tenho muito frio. E também quero conversar. Venha para aqui, para perto de mim.
Ela olhou-o de novo. Não compreendia os modos dele. Sempre se habituara à brusquidão dos clientes, a servir de alívio para os seus impulsos sexuais. Porém, ele era diferente, de trato delicado com ela... Como perceber isso?
Parcialmente vestida, enfiou-se debaixo da roupa e o frio levou-a a chegar-se para junto dele. Sentiu o seu corpo magro tiritando. Teve pena do ser humano que tremia ao seu lado, certamente sem eira nem beira, e chegou-se mais. Abraçou-o, tocando com a mão nas suas mãos geladas e ficaram assim, em conchinha.
Ele depressa adormeceu. Afinal, nem chegaram a conversar. Dormindo ao seu lado, sentiu que deveria ser mais um infeliz que naquela véspera de Natal tempestuosa, fora apanhado desprevenido.
Ela não tinha sono. Pensou em muitas coisas do seu passado, algumas delas de que não se orgulhava. Depois sacudiu essas tristes lembranças. Passado algum tempo, sentiu uma estranha paz dentro de si e aconchegou-se mais a ele. Ouviu o seu sono pesado, ressonava um pouco. Mas não era como tantos outros que depois de satisfazer a carne adormeciam como porcos. Ele parecera-lhe diferente, educado e no fundo um ser frágil, tocando o seu coração de mulher.
Sentiu os raios a iluminar tudo, seguindo os trovões que abanavam o quarto. Noutra altura, ter-se-ia levantado e ido espreitar os raios rasgando os céus, mas desta vez não lhe apeteceu. Sentia-se bem ali, abraçada aquele desconhecido. Cingiu-lhe a cintura, encostou a cabeça ao seu ombro e acabou por adormecer.
Passaram-se poucas horas, a luz diurna teimou em espreitar por entre os cortinados, acordando-a.
Agora de costas para ele, sentiu-lhe o braço à volta do corpo. Pegou no relógio de pulso que pousara no criado mudo e viu que já passava das oito horas.
Ele mexeu-se na cama, ela voltou-se e olharam-se. Depois o homem desviou-lhe uma madeixa de cabelo do rosto e sorriu-lhe. Ela deu-lhe um beijo na face e disse:
- Como te chamas?
- O meu nome é Alberto.
- Eu chamo-me Nadia. Feliz Natal , querido!
A todas(os) as(os) amigas(os) Recantistas desejo, de coração, que tenham um Natal repleto de amor, sempre rodeadas(os) de carinho e ternura, junto da família e amigos.
Que a felicidade vos toque com intensidade.
Abraço afeituoso para todos vós.