O menino que aprendeu demais

 

     Nascemos aprendendo. Meu primeiro aprendizado foi respirar sozinho, logo depois de um tapa firme no bumbum dado pela parteira, minha avó. Não demorei a aprender a chorar para mamar.

     Com sete anos, aprendi que apertar a correia na barriga diminuía a dor da fome e me ajudava a pegar no sono. Aos oito, aprendi que aprender pode ser cruel: na escola, algumas crianças me zombavam por causa do meu cabelo crespo e da minha pele escura. Nessa mesma idade, aprendi que as ruas, por mais frias e duras que fossem, ofereciam mais alívio do que a minha casa. Na rua, ao menos, havia pessoas que sentiam pena de mim e me davam moedas ou um pedaço de pão.

     Aos dez, aprendi que piedade tem limite. Já não parecia pequeno o suficiente para despertar compaixão, mas ainda era jovem demais para encontrar trabalho. Foi então que aprendi a furtar. Carteiras, bolsas, celulares — qualquer coisa que estivesse ao alcance das mãos rápidas de um menino invisível.

     Aos doze, aprendi a roubar com algo que chamavam de arma, embora fosse apenas um pedaço de plástico pintado. Assaltava saídas de banco, pequenas lojas, qualquer lugar onde o desespero me levasse. A dor da fome já não era tão intensa, mas outra dor chegou: a das drogas, das quais virei refém para esquecer a fome da alma.

     Aos quatorze, aprendi a correr. Correr muito. Fugir de sirenes, pular muros, me esgueirar por becos estreitos e me esconder como uma sombra que ninguém queria enxergar.

     Aos quinze, aprendi que basta um único erro para que tudo acabe. Entrei numa casa errada, surpreendido por um policial que não hesitou. Corri, mas os tiros vieram mais rápido. Três disparos pelas costas. No chão frio, aprendi que aprender a viver nunca tinha sido tão difícil quanto aprender a morrer.

     Deitado ali, à beira do último suspiro, compreendi que a vida ensina, mas seus ensinamentos não são os mesmos para todos. Aprendi que o caixão seria o único lugar onde eu não seria julgado pela minha cor, onde a fome e o abandono não mais me alcançariam.

     No fim, o maior aprendizado foi este: há realidades que nunca deveriam existir. E, talvez, enquanto alguém lê minha história, a vida esteja ensinando isso a mais uma criança invisível.